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Por que esconder nossas emoções?

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Karen Beattie - publicado em 21/07/16

Pouco depois que meu marido e eu nos casamos, sentamos em um restaurante perto de um casal de meia-idade. Eles eram de boa aparência, parecia que estavam bebendo vinho e mal disseram duas palavras um para o outro

“Quando éramos crianças, costumávamos pensar que quando crescêssemos não seríamos mais vulneráveis. Mas crescer é aceitar a vulnerabilidade. Estar vivo é ser vulnerável” – Madeleine L’Engle

Eles pareciam entediados, solitários e, para ser honesao: miseráveis. “Eu espero que nós nunca acabemos assim”, sussurrei para David, que me cutucou e riu. Mas a cena me fez refletir – e se nós acabarmos assim depois de 10 anos juntos?

Com certeza, nos encontraríamos no sofá do escritório de um terapeuta, tentando descobrir como se comunicar melhor. Nos primeiros 10 anos do nosso casamento tivemos alegrias, mas também tivemos sofrimento e uma longa lista de desafios, incluindo perda de emprego, uma luta de sete anos para adotar uma criança e uma luta contra o câncer. No meio dessas crises – que foram cheias de grandes e assustadoras emoções – nós acabamos nos afastando, e estávamos começando a se ressentir um com o outro.

Depois de uma particularmente grande luta, durante uma viagem de visita à casa da minha família no Natal, nós dois sabíamos que era hora de buscar ajuda. Nós não queríamos fazer parte da estatística de 42% dos casamentos que terminam em divórcio. Fizemos um compromisso quando nos casamos, e nós íamos fazer tudo que estivesse ao nosso alcance para mantê-lo.

“Estamos com medo que alguém diga ‘isso é ridículo’ ou ‘isso não conta’”, diz Stephanie Whitman, uma terapeuta de casamento e família em Chicago. “Isso coloca você em uma posição muito vulnerável quando está falando sobre suas emoções”.

Em última análise, a falta de vulnerabilidade não apenas danifica nossas relações, pode danificar nossas almas. O autor Parker Palmer escreve em seu livro A Hidden Wholeness: The Journey Toward an Undivided Life: “Com medo de que nossa luz interior seja extinta ou a nossa escuridão interior exposta, escondemos nossas verdadeiras identidades um do outro. No processo, ficamos separados de nossas próprias almas”. Quando recusamos reconhecer nossos sentimentos aos nossos parceiros, e até a nós mesmos, não estamos vivendo plenamente. Se não corrermos o risco de ser vulneráveis, nunca saberemos a alegria de um relacionamento profundo e íntimo.

Divergência

Durante as primeiras semanas e meses de um relacionamento, parece impossível que você e seu parceiro nunca irão se sentir desconectados e se afastarão. Você não pode sequer imaginar um dia que não compartilhará todos os detalhes excitantes e mundanos da vida. Mas, então, a vida real acontece.

Eu aprendi rapidamente que David e eu estávamos longe de ser o único casal passando por isso. Casamentos bem sucedidos na aparência muitas vezes não são muito mais do que duas pessoas de sucesso fazendo de forma independente as suas próprias coisas. Elas não são mais “engajados emocionalmente”, e elas não são parceiros de vida, ou mesmo amigos.

Então, eu não fiquei surpresa ao descobrir em uma pesquisa recente de terapeutas que os problemas de comunicação são a causa número 1 do divórcio. Quando os casais descartam estes problemas, em vez de lidar com eles, podem se afastar tanto que criam um “muro” entre eles – um termo usado pelo psicólogo e terapeuta John Gottman, que descreve quando dois cônjuges se recusam a se comunicar. Felizmente David e eu percebemos o problema antes de chegar a um ponto sem volta, mas muitos casais não percebem.

Janiel Ruiz, uma terapeuta de Chicago que ajuda os clientes a usar técnicas de corpo/mente de psicoterapia e espiritualidade, explicou-me que esta é, muitas vezes, a queda do casamento. Quando os casais param de compartilhar suas emoções, eles começam a se sentir distantes e ansiosos para preencher seu espaço emocional com outras coisas: talvez um vício, um caso extraconjugal ou trabalhar demais. “Nós temos essas relações superficiais, onde do lado de fora parecemos satisfeitos, mas no interior não estamos emocionalmente satisfeitos porque não estamos conectados”, acrescenta ela.

Há muitas razões pelas quais os casais param de se comunicar, mas o medo de ser emocionalmente vulnerável é um dos maiores. Quando nos permitimos ser vulneráveis, isso significa que estamos arriscando nos machucar. Quando se fala de um sentimento profundo e seu parceiro não o reconhece, ou o ignora, ou o rejeita, dói. Assim, você evita se abrir emocionalmente, porque o medo da rejeição é muito doloroso. E se os seus sentimentos não foram reconhecidos ou validados quando criança, torna ainda mais assustador se abrir. Parafraseando o psicólogo inglês Donald Winnicott, o que mais nós mais tememos é o que já nos aconteceu.

Olhar para a minha fé pessoal me ajudou a entender melhor esse conceito. Tenho ficado impressionada pela forma como Maria disse “sim” ao convite de Deus, e ao fazê-lo, tornou-se a mãe de Cristo. Então, muitas vezes, eu me fecho para Deus e outras pessoas porque estou com medo – mas o exemplo de Maria me ensinou que ser aberto e vulnerável na minha vida e no casamento está abrindo a porta para algo divino acontecer.

“A coisa mais adulta que podemos fazer um para o outro é ouvir e deixar a outra pessoa saber que você entende o que ela está dizendo. Você não tem que concordar o tempo todo. Mas você tem que deixá-la saber que você é capaz de ouvir e entender o que ela está dizendo”. 

Na terapia, David e eu percebemos que ao longo de todas as lutas em nosso casamento, nós tínhamos parado de dizer um ao outro como nos sentíamos e paramos de ouvir como o outro se sentia. As emoções eram muito grandes. Os sentimentos eram demasiado assustadores. Então, esses sentimentos foram enterrados profundamente dentro de nós, onde foram fermentados em ressentimento e raiva. Quando aprendemos a realmente reconhecer esses sentimentos, e comunicá-los ao outro, começamos a ouvir um ao outro e nosso casamento começou a se curar.

Mudar a direção… lentamente

Então, como vamos evitar o “desvio” em nossos relacionamentos e viver plenamente? Como podemos superar a grande barreira emocional que nos faz sentir solitários e isolados? “Podemos começar apenas falando sobre como foi o seu dia”, diz Ruiz.

David e eu sempre tínhamos o hábito de perguntar, “como foi seu dia?”, na mesa de jantar. Mas muitas vezes parava aí mesmo. “Essa pergunta simples é uma tentativa de conexão, mas a fim de realmente se conectar, é preciso ir mais fundo do que apenas aquela simples pergunta. É importante não apenas falar sobre os acontecimentos do dia, mas também como eles fizeram você se sentir”, diz Ruiz.

Eu posso reconhecer quando David teve um dia ruim. Ele responde à pergunta com um suspiro, e balança a cabeça. Agora, eu vejo isso como um sinal e procuro saber mais sobre como ele se sente sobre o que aconteceu.

Também é importante dizer ao seu parceiro o que você sentiu quando eles compartilharam algo sobre o seu dia. Algo como: “Eu estou realmente orgulhoso de como você lidou com essa situação no trabalho”. Ou “Estou grata por você ter passado um tempo com nossa filha hoje, você é um grande pai para ela”.

“Você está compartilhando sobre o seu dia, mas você também está preenchendo toda essa lacuna”, diz Ruiz. “O casal começa a ter um movimento emocional onde eles não apenas estão comunicando o que aconteceu e o que está acontecendo, mas também se conectando através da partilha e dizendo ‘é assim que me sinto sobre você’”.

Aprender a falar tudo de novo

Quando você está em um relacionamento com um ente querido, não conseguir o que quer dessa pessoa é devastador. Tão devastador que muitas vezes não consegue explicar por que você está magoado com ela. Torna-se um círculo vicioso. Logo você cria um ressentimento e para de conversar com ela. Em vez de realmente falar sobre o sentimento, você começa a culpar a outra pessoa.

Pare de culpar a outra pessoa, aconselha Whitman, e comece a olhar para si mesmo. O que é que você está sentindo? Quando você ouve a emoção da outra pessoa – como você vai responder a isso?

E certifique-se de falar um com o outro como sujeito. Quando você inicia uma conversa com “você”, pode ser um sinal de que você está culpando a outra pessoa e não assumindo a responsabilidade por seus sentimentos.

Quando as pessoas deixam e apontar o dedo para o outro, o cônjuge fica automaticamente feliz, diz Whitman. 

Nos dias de hoje, quando jantamos sozinhos, sem a nossa filha, nós temos muito para falar. E quando estamos em silêncio, o silêncio não é de tédio, ou ressentimento, ou separação. É o silêncio de duas pessoas que sofreram e que lutaram por seu casamento e estão sentadas agradecidas por ter um ao outro.

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