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O celibato sacerdotal e os “viri probati”

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Vanderlei de Lima - publicado em 19/03/17

A base bíblica do celibato está em duas principais passagens

Uma notícia que parece colocar o celibato clerical em xeque tem levado algumas pessoas à perplexidade. Ela trata da possibilidade da ordenação sacerdotal de homens casados, mas com ampla experiência na vida eclesial, os chamados “viri probati”.

Tal proposta visaria atender, sobretudo, as regiões populosas, mas carentes de sacerdotes. Daí a oportunidade de analisarmos, brevemente, a questão neste artigo.

A propósito, digamos que o celibato clerical na Igreja Latina (na Oriental, os padres diocesanos podem se casar) é uma norma disciplinar, e, embora com boas raízes na Escritura, na Tradição e no Magistério da Igreja, não constitui dogma, ou seja, é algo que poderia, a princípio, ser, um dia, revisto.

Uma declaração do Cardeal Marc Oullet, prefeito da Congregação para os Bispos, afirma que “a Igreja jamais ligou sacerdócio e celibato sobre o plano dogmático, mas sempre manteve o próprio juízo de valor pastoral sobre este vínculo que exprime no ministro a ‘escolha exclusiva, perene e total do único e sumo amor de Cristo’ (Sacerdotalis Coelibatus, 14)” (Celibato e vínculo nupcial de Cristo à Igreja. São Paulo: Fons Sapientiae, 2016, p. 23-24 – itálico nosso). E acrescenta que “a Igreja não pode renunciar ao valor simbólico, sacramental, escatológico e pastoral do celibato eclesiástico. Não obstante os deslizes e as contestações, ele permanece uma forma sempre válida de paternidade espiritual que testemunha a fecundidade eucarística do Senhor e da sua Esposa” (idem, p. 25).

A base bíblica do celibato está em duas principais passagens que devem ser lidas com vagar: 1Cor 7,25-35: há aí o louvor à vida una e indivisa por amor a Deus. Quem O descobre fica ciente de que a figura deste mundo passa, por isso tudo o que aqui for feito, deve ser realizado para o Senhor ou em vista do Eterno e Mt 19,12: trata do eunuco por livre opção ante aqueles que eram eunucos por natureza e por essa condição menosprezados pela Antiga Lei (cf. Lv 21,1-20; Dt 23,2). Certo é que o Senhor Jesus não desvaloriza, de modo algum, com isso, a sexualidade no sacramento do Matrimônio por Ele mesmo elogiado (cf. Mt 19,4-5 ligado a Gn 1,27; 2,24), mas, sim, ensina que o amor exclusivo a Deus, e por Ele ao próximo, deve ser vivido na entrega total ao Reino.

Outros textos que, à primeira vista, parecem polêmicos ou afrontadores do celibato, na verdade não o são, pois a Bíblia, enquanto Palavra de Deus, não pode se contradizer. Com efeito, em 1Tm 3,2.12; 5,9; Tt 1,6, há recusa de segundas núpcias aos epíscopos, presbíteros, diáconos e viúvas consagradas ao serviço do altar o que pode parecer recomendação ao primeiro casamento. Na verdade, São Paulo está tratando com uma comunidade na qual, muito provavelmente, não havia celibatários, de modo que é preciso escolher pessoas casadas para o trabalho eclesial com a recomendação de que uma vez viúvas não contraíssem nova união conjugal. Como bom soldado de Cristo, o ministro deve dedicar-se inteiramente ao serviço do Evangelho (cf. 2Tm 2,3-4).

Frente ao grande número de pessoas que livremente foram abraçando o celibato ao longo da história, a Igreja houve por bem dar normas disciplinares – portanto, não dogmáticas – a respeito da vida celibatária. Assim, o Concílio regional de Elvira, por volta do ano 300; o de Roma, em 386; os de Cartago, em 390 e 401; o de Toledo, em 400; o de Turim, em 401 (ou 417, a data é incerta); o de Latrão, em 1139, e o do Vaticano II (1962-1965). Também uma série de Santos e Papas, ao longo dos milênios, defenderam o celibato clerical, o que bem mostra a sua grande importância.

Diante do que foi, muito resumidamente, exposto, parece ficar a certeza de que a aprovação (hipotética até o momento) do sacerdócio ministerial para homens casados não afetaria nenhum dogma da Igreja, mas somente tocaria, sem retocar, um ponto disciplinar cristalizado na Igreja Latina – não, porém, na Oriental – e que seria, por isso mesmo, uma exceção na exceção: homens casados e experientes na vida eclesial (os “viri probati”) exercendo, lícita e validamente, o ministério sacerdotal.

Vanderlei de Lima é eremita na Diocese de Amparo.

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