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Messianismo e idolatria: o culto a Chávez

Rafael Luciani - publicado em 21/03/13

Um messianismo político que pode terminar em culto religioso

Há uma clara opção de Jesus pelos mais pobres da sociedade. O que faz dessa opção algo único é o modo como Jesus procedeu. Ele não se aproxima dos pobres para os tornar dependentes, mas para libertá-los e fortalecer suas vidas. Tampouco os integra a uma ideologia política. Menos ainda os usa, em nome de Deus, de forma utilitária, para defender com violência o projeto do Reino.

 

Apesar de ter se registrado na maioria do governos da América Latina um crescimento da preocupação com os pobres, estes ainda não chegam a ser sujeitos da sua própria história, e muitas vezes são manipulados, inclusive convertidos, em muitos casos, em objetos ideológicos.

 

Não basta que os discursos e as políticas públicas sejam para os pobres, mas em que medida permitem a eles se converter em sujeitos e alcançar autonomia. Para isso, é importante que toda a sociedade, em seus distintos estratos e possibilidades econômicas, comece a entender que deve assumir a causa dos pobres, porque só poderemos crescer como país quando todos lutarmos contra os fatores que produzem dependência, pobreza, autoritarismo, e nos fazem objetos de outros.

 

Na história política sempre houve sujeitos com desejos messiânicos. No entanto, a esse fenômeno sócio-político, acrescenta-se hoje um elemento pseudo-religioso novo. O de alguém converter-se em objeto de culto. Este é o caso de Hugo Chávez, a quem o atual presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, jurou, em nome de todos os seus seguidores, adesão absoluta, inclusive depois da morte do líder, a quem chamou de o Cristo dos pobres.

 

Quando toda a vida de um sujeito, desde suas expectativas e crenças mais essenciais, até o desenvolvimento econômico e a prática religiosa, gira em torno da existência de um sujeito histórico ou de um projeto ideológico, é fácil convertê-lo em objeto de culto no momento da morte de seu líder ou fundador. O que os cristãos conhecem como idolatria, traduz-se aqui sob a forma de culto ao messianismo político, com a pretensão de dar continuidade no poder a regimes políticos, fazendo uso das consciências e crenças religiosas dos mais necessitados

 

Este novo fenômeno de culto pós-morte a uma figura política vem-se traduzindo em práticas religiosas que se fundem com elementos próprios da superstição, uma vez que se mesclam com celebrações eucarísticas e orações comunitárias presididas por membros da comunidade católica e de outras confissões religiosas.

 

No suposto nome de Deus, está nascendo esse fenômeno na América Latina, onde a união do messianismo político e o culto pós-morte pretende alcançar a continuidade de projetos ideológicos, mediante a criação de imaginários religiosos alternativos.

 

Já se tinha visto tal tentativa na Argentina, com Eva Perón, e agora se vê na Venezuela, com Hugo Chávez. E continuará aparecendo enquanto houver pobreza, e enquanto todos juntos não assumirmos a causa dos pobres; enquanto não desabsolutizarmos o poder e a função das ideologias; e enquanto não reconhecermos, como cristãos, que Jesus é o único mediador de salvação, e não um político, padre ou figura social deste mundo.

Por Rafael Luciani
Doutor em Teologia Dogmática
Venezuela