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Gnocchi, Palmaro, Introvigne: sobre a obediência ao magistério do Papa

Papa Francesco e ragazzi delle scuole dei gesuiti – pt

© ANDREAS SOLARO / AFP

Julio De la Vega Hazas - publicado em 15/10/13

Não pode haver colisão entre obediência e consciência: ou o mandato é imoral ou a consciência está deformada

Diante das dúvidas surgidas pelo artigo que publicamos ontem, "Rejeitar o magistério ordinário de um papa leva ao cisma", consideramos oportuno pedir a opinião de um dos nossos colaboradores, o Pe. Julio De la Vega, para responder à pergunta: um católico deve aceitar os gestos públicos do Papa como parte do magistério?

Um dos nossos leitores, a quem agradecemos pela contribuição, comentou:

Os gestos públicos, as entrevistas, por exemplo, não são magistériopapal e, portanto, os fiéis não estão obrigados a obedecê-los. Este artigo da Aleteia conduz abertamente à papalatria, erro denunciado pelo Vaticano I ao esclarecer o dogma da infalibilidade papal. Os fiéis não podem renunciar à sua consciência moral em uma obediência cega à humanidade do Papa. A experiência nos diz, de forma irrevocável, que nem tudo o que os papas fazem é digno de imitação, por exemplo.

A seguir, a resposta do Pe. Julio De la Vega:

Pediram-me uma avaliação do artigo de Gnocchi e Palmaro – que tive de ler –, do comentário de Introvigne e do comentário feito pelo leitor da Aleteia. Pois bem, a verdade é que não posso dar completamente a razão a nenhum deles.

Evidentemente, preciso explicar meu posicionamento.

Em primeiro lugar, sobre o artigo que deu origem a tudo (o publicado em Il Foglio, N. da R.), o que se desprende dele é que temem uma atitude, que poderíamos chamar de "progressista", que relativiza um pouco o doutrinal a favor das atitudes cristãs consideradas mais autênticas: em linguagem mais técnica, tira-se o valor da ortodoxia a favor da ortopraxis. Esta postura é infeliz e causou muitos danos à Igreja nas últimas décadas.

Quanto à doutrina, a única coisa que citam são algumas frases – nenhum documento, homilia ou alocução – cujo sentido é algo incerto, pois podem ser interpretadas de várias maneiras.

E há motivos de sobra para concluir, vendo o magistério deste primeiro ano do Papa, que não interpreta estas afirmações no sentido que os colunistas dizem. Pelo que se vê, há algumas coisas do atual Pontífice – sobretudo de estilo – que não lhes agrada. Até certo ponto, é legítimo: a pessoa não precisa gostar de tudo. Mas o que já não é bom é que um católico escreva sobre o Papa neste tom. Este estilo, sim, é rejeitável.

Pessoalmente, tenho um grande respeito por Massimo Introvigne, por vários motivos – entre eles, a precisão com que costuma escrever e seu amor à verdade. E o que ele diz é certo. Mas levar a discussão ao campo de se aceitamos ou não o magistério ordinário me pareceu exagero. Seria melhor se ele se centrasse em como alguns interpretam as palavras e gestos do Papa.

Sobre o comentário recebido do leitor, ele me pareceu repleto de equívocos. Aqui não se trata em nenhum momento de como o Papa – ou qualquer papavive, mas do que ele ensina. A frase "Os fiéis não podem renunciar à sua consciência moral em uma obediência cega à humanidade do Papa" merece um comentário à parte.

Em primeiro lugar, nem os fiéis nem ninguém pode renunciar à sua consciência moral. Nem se quisessem. Simplesmente não se pode. Em segundo lugar, a "humanidade"… o que isso significa? Não se obedece à "humanidade" do Papa, mas ao Papa.

Em terceiro lugar, a obediência que os papas pedem nunca é cega: eles sempre fundamentam o que pedem. Se por "cega" se entende a renúncia a pensar ou a entender, o catolicismo não é assim; os exemplos do credo quia absurdum devem ser buscados no mundo protestante, se for o caso.

Mas o mais importante – e o mais sutil – é a contraposição entre consciência e obediência. Pode haver conflito entre elas, mas, quando há, isso deriva de uma situação, diríamos, patológica: ou o mandato é imoral ou a consciência está deformada (ou simplesmente equivocada).

A consciência não é autônoma. Ela julga, em cada caso, se a conduta é boa ou má, mas julga a partir de pautas que lhe são dadas – o conhecimento do bem e do mal – e, a partir delas, entende a que se deve obedecer e quando se deve obedecer. E entende que é preciso obedecer o magistério do Papa.

A alusão ao Vaticano I, ainda que seja correta, leva, neste caso, a uma confusão. Apresento aqui umas palavras desse concílio: "Deve-se, pois, crer com fé divina e católica tudo o que está contido na palavra divina escrita ou transmitida pela Tradição, bem como em tudo o que a Igreja, quer em declaração solene, quer pelo magistério ordinário e universal, nos propõe a crer como revelado por Deus" (grifo meu).

O concílio indica os requisitos para que um pronunciamento papal seja uma "declaração solene", mas não se limita a isso, senão que pede a mesma fé para o magistério ordinário.

Qual é a diferença, então? A diferença é que, para o magistério solene, basta um ato singular, enquanto o magistério ordinário precisa da reiteração necessária para poder julgar se o seu conteúdo é parte da doutrina da Igreja.

Isso sim, sem esquecer que o magistério é… magistério, ou seja, ensinamento, e ensinamento da doutrina. O resto é outra coisa, mas, ainda que não exija fé, pede respeito.

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