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Biografia não-autorizada

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Élison Santos - publicado em 29/10/13

Viver da melhor forma possível é nosso desafio, diante dos olhos curiosos das crianças e dos olhos obcecados dos curiosos de plantão

Há alguns anos, em minha infância, costumava ouvir que uma senhora que morava no quarteirão ao lado pegava as crianças para fazer sabão, eu morria de medo dessa senhora. O tempo passou e eu fui percebendo que ela não passava de uma senhora ranzinza que vendia verduras para a vizinhança. Quem tem o direito de falar da vida alheia? É fato que as histórias que se contam sobre uma pessoa são muitas vezes ouvidas como se fossem verdades, ainda que sejam uma grande mentira, e neste sentido vale citar um dos personagens da história que soube utilizar da mentira para servir a suas ideologias de poder, o assessor de comunicação de Hitler, Joseph Goebbels, disse uma vez: “uma mentira cem vezes repetida torna-se uma verdade”. Desde as esquinas mais movimentadas do interior do país até as revistas mais badaladas nas bancas, todos parecem regozijar do inegável direito de falar da vida alheia e quanto mais conhecida é a vítima menos parece ser seu direito de defesa.

Há aqueles que buscam mais a fama do que a paz, para estes o “falem bem ou mal, mas falem de mim!” parece ser uma máxima. Na era do Youtube, dos reality shows e da supervalorização do aparente, toda possibilidade de sucesso, ainda que instantâneo e passageiro é perseguida por muitos de forma tão obsessiva quanto os que se dedicam a falar da vida alheia. Neste sentido o mundo parece estar em harmonia, os obcecados pela fama e os obcecados pela vida dos outros se encontram numa novela duplamente mexicana, para não dizer brasileira.

Uma vez ouvi dizer que o Brasil tinha uma história maravilhosa, uma terra de grandes riquezas e de grandes conquistas, descoberta por pessoas de imaculada índole cujo desejo, ao longo dos anos, era de gritar por sua independência e liberdade. O tempo passou, essa história que era contada para os estudantes do ensino fundamental na década de 80 transformou-se com dados históricos mais fidedignos, o Brasil passou de uma terra idealizada para uma terra cuja história questionou meu orgulho de ingênuo cidadão. Em uma visita aos EUA, já na década de 90, pude ouvir absurdos sobre meu país. Descobri que muitos jovens americanos pensavam que no Brasil nós falávamos espanhol, vivíamos na selva e não existiam pessoas claras ou loiras em nossas terras, não pude culpá-los justamente porque era esta a história que contavam a eles sobre o Brasil.

Há cada quatro anos ouvimos histórias sobre anônimos que se tornam pessoas de imaculada índole e vilões que se tornaram verdadeiros heróis capazes de transformar toda a história do Brasil. Deixando a ironia de lado, lhe pergunto se algum dia, alguma história mal contada lhe fez perder o precioso tempo da sua vida ou o precioso voto que a democracia lhe outorgou. Será que algum dia você deixou de ser amigo de alguém, apaixonar-se por alguém, casar-se com alguém porque uma história mal contada chegou aos seus ouvidos sobre aquela pessoa? Será que algum dia um filme, uma música, um ator, uma cantora, um personagem da história deixou de ter sua apreciação porque você preferiu ouvir o que diziam a seu respeito ao invés de buscar você mesmo conhecer aquela pessoa de verdade?

A biografia de uma pessoa é lida a cada dia por aqueles que convivem com ela. Se há momentos de heroísmo, certamente eles não passarão desapercebidos, algum dia alguém falará sobre eles, da mesma forma se há momentos de extrema fraqueza e de vergonha, estes também não passarão desapercebidos, em algum momento alguém refletirá sobre eles ou até mesmo falará sobre eles. Viver da melhor forma possível é nosso desafio, diante dos olhos curiosos das crianças e dos olhos obcecados dos curiosos de plantão, já o que se fala nas janelas, nas revistas, nos tabloides, jornais e telejornais diz mais sobre os que se deram ao trabalho de falar ou escrever. De certa forma, a vida dos que se tornaram notícia mexeu com a vida dos que se dispuseram a noticiá-la!

Falar é uma arte, contar histórias também, viver e ser protagonista da própria história é algo sublime, uma dádiva acima de toda arte!

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