Aleteia logoAleteia logoAleteia
Domingo 04 Junho |
Aleteia logo
Religião
separateurCreated with Sketch.

Em defesa dos seminaristas: identidade em crise

Number of Seminarians, Deacons Increasing, Study Finds – pt

Jeffrey Bruno

Fr. Rafael Vieira, SCJ - Reparatoris - publicado em 08/11/13

Nós, seminaristas, como qualquer outro vocacionado a qualquer profissão, estamos desenvolvendo nossas potencialidades

Parece que aquele sistema de seminário altamente regimental é coisa do passado. Há uma abertura de consciência dos formadores e, também, da Igreja no que diz respeito à formação dos seminaristas. O sentimento que cada formando carrega é o da auto-formação, ou seja, a liberdade de educar a si mesmo. Contudo, não encontramos pessoas realizadas em sua vocação, afinal, devia ser esse o estereótipo de um formando, porque segundo os parâmetros modernos essa liberdade injetada no seminarista devia realizá-lo como pessoa e como seminarista que busca ser sacerdote do Altíssimo. Em contraposição encontramos seminaristas geralmente em “crise vocacional” – termo usado comumente nas casas de formação. Mas, então, por que realizar-se como “projeto de padre” é um problema? Em minha humilde análise de um seminarista em contexto proponho uma resposta ao questionamento: isso é um problema de identidade.

Nós, seminaristas, como qualquer outro vocacionado a qualquer profissão somos pessoas que estamos desenvolvendo nossas potencialidades e temos uma vaga idéia da direção em que nossos passos querem seguir. De modo que, na formação precisamos basicamente de três coisas: competência, controle e vocação. Explico: competência significa ter condições de lidar com as interpelações da sociedade; controle, ou seja, canais para nossos impulsos rebeldes, e vocação, a convicção de que somos chamados a fazer aquilo pelo qual somos atraídos. Acontece que nos encontramos não competentes para responder à demanda da sociedade, a vida celibatária parece que está além do horizonte, os impulsos são fortes e difíceis de serem controlados, e o sentimento geral é de que não sou chamado a viver a radicalidade do evangelho. Por isso, todos nós procuramos uma estrutura clara para nos testar e sermos testados a fim de tomar as decisões futuras.

Vejamos como isso se torna um problema de identidade. Se um seminarista quer ser competente ele se vê nos campos mais difíceis que é a filosofia e a teologia. Poucos alunos têm orgulho em estudar esses cursos, até mesmo porque até hoje se discute se a teologia é um campo de estudo ou não, e a filosofia é considerada coisa para quem não tem o que fazer. Um médico, um advogado, um psicólogo orgulha-se de seu campo de atuação porque isso é valioso diante da sociedade. E, mesmo nossos professores não nos passam orgulho em terem estudado teologia e filosofia, porque são poucos os que acreditam na eficácia de contribuir com o mundo através desses campos. Por isso, nós seminaristas ficamos projetando para o futuro outros cursos para sermos competentes em ajudar a sociedade, a filosofia e a teologia se tornaram apenas um modo de cumprir o currículo.

O controle das nossas pulsões, por vezes, também não é claro. Se um seminarista começa a namorar dentro do seminário ele não é mandado embora, ao contrário, se faz vista grossa e se diz: “é melhor que ele tenha uma experiência de namoro antes de assumir o celibato”. Até mesmo se tem hoje um receio muito grande por parte dos formadores em chamar a atenção pelas amizades particulares, mesmo que os seminaristas estejam envolvidos em relações consumidoras de enormes energias, desgastante, por causa do apego excessivo. Isso é um problema do seminarista, ele que deve resolver sozinho a questão. Como podemos perceber, não há uma identificação do seminarista com a vivência do celibato.

Se o seminarista quer um auxílio à sua vocação ninguém sabe lhe dizer com precisão o que significa ser sacerdote. Parece que quanto mais estamos perto da ordenação mais vagas ficam as nossas idéias sobre o ministério. Antigamente a Igreja dizia que era uma honra ordenar um sacerdote e se o candidato não correspondesse às exigências devia se retirar. Hoje não temos exigência e nós seminaristas que parecemos dizer à Igreja “se você não corresponder às minhas expectativas eu me retiro”. Porque antes tínhamos claramente, como a água, o que era ser padre, hoje, ninguém quer abraçar uma vocação que não tenha certa carga de exigência. Existem muitos padres que não acreditam na eficácia do seu ministério e na força do seu apostolado, por vezes se tornam professores, psicólogos, cantores entre outras coisas, mas não convencem a nós seminaristas que vale a pena ser padre.

Nessas três áreas citadas (competência, controle e vocação) estamos frustrados. Encontramos-nos em meio ao dilema. Sentimos-nos como alguém que não tem uma disciplina respeitada (competência), os impulsos não podem ser controlados, tudo é ambíguo (controle), e o chamado se tornou uma fonte de questionamentos intermináveis (vocação). Evidentemente, não há muitos referenciais para seguirmos, pessoas que realmente amam a sua função. Por isso, sofremos uma crise de identidade, não nos identificamos com o que vemos e o que devemos ser. Essa reflexão surgiu a partir de minha vivência seminaristica com meus amados formadores Pe. Luciano Toller e Hélio Feuser que, com amor e cuidado me ajudam a criar competência, controle e vocação. Posso dizer que a Congregação dos Padres do Sagrado Coração de Jesus tem me ajudado a integrar-me como pessoa-humana e pessoa-vocação.

* Texto baseado no livro “Intimidade”, de Henri Nouwen.

(Reparatoris)

Tags:
IgrejaPadresVirtudes
Apoiar a Aleteia

Se você está lendo este artigo, é exatamente graças a sua generosidade e a de muitas outras pessoas como você, que tornam possível o projeto de evangelização da Aleteia. Aqui estão alguns números:

  • 20 milhões de usuários no mundo leem a Aleteia.org todos os meses.
  • Aleteia é publicada diariamente em sete idiomas: inglês, francês,  italiano, espanhol, português, polonês e esloveno
  • Todo mês, nossos leitores acessam mais de 50 milhões de páginas na Aleteia.
  • 4 milhões de pessoas seguem a Aleteia nas redes sociais.
  • A cada mês, nós publicamos 2.450 artigos e cerca de 40 vídeos.
  • Todo esse trabalho é realizado por 60 pessoas que trabalham em tempo integral, além de aproximadamente 400 outros colaboradores (articulistas, jornalistas, tradutores, fotógrafos…).

Como você pode imaginar, por trás desses números há um grande esforço. Precisamos do seu apoio para que possamos continuar oferecendo este serviço de evangelização a todos, independentemente de onde eles moram ou do quanto possam pagar.

Apoie Aleteia a partir de apenas $ 1 - leva apenas um minuto. Obrigado!

PT300x250.gif
Top 10
Ver mais
Boletim
Receba Aleteia todo dia