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O que o Papa pede em relação às periferias é o que Jesus ordenou

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Aleteia Vaticano - publicado em 10/12/13

Entrevista com o cardeal de Aparecida, Dom Raymundo Damasceno Assis

Dom Raymundo Damasceno Assis é o atual arcebispo de Aparecida, presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e membro do Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais e da Pontifícia Comissão para a América Latina, na Santa Sé.



Esta entrevista toca essencialmente quatro pontos: as questões sobre a Vida, a comunhão do fiel católico com o Papa, a Igreja missionária e a posição do Papa sobre as questões morais.



O Papa Francisco tem se mostrado a favor da vida no seu Pontificado?



Dom Raymundo Damasceno: A posição do Papa Francisco em relação ao tema da vida é a posição que a Igreja sempre defendeu: a vida é o primeiro direito e o fundamento dos outros direitos e por isso, deve ser acolhida, respeitada e promovida em todas as suas fases de desenvolvimento, desde o seu começo até o seu fim natural. O Papa Francisco tem tomado posição firme e corajosa contra tudo que fere a dignidade da pessoa humana. A vida plena que Jesus veio trazer (Jo 10,10) não é só a participação na vida divina, mas vida com dignidade em todas as dimensões que inclui humanização, reconciliação, inserção social, numa palavra, libertação integral.



Qual deveria ser a atitude de um católico com relação ao Papa? Um católico que dissesse que só segue um Papa "ex cathedra", ou seja, que só segue o Papa quando fala de forma infalível, está cultivando uma atitude sadia, uma atitude de um verdadeiro católico?



Dom Raymundo Damasceno: O fiel católico deve aceitar não só os ensinamentos sobre a fé e a moral proclamados definitivamente pelo magistério da Igreja, mas também, os ensinamentos do magistério autêntico proposto não de maneira definitiva. Igualmente, o católico deve aceitar o magistério ordinário do Papa e dos Bispos que é exercido no seu serviço diário ao povo de Deus por meio da pregação, alocução, aprovação de catecismos. O Papa e os Bispos são revestidos da autoridade de Cristo e a eles, como pastores, foi confiada a missão de interpretar autenticamente a palavra de Deus escrita ou transmitida. É claro que, em todas manifestações do magistério, deve-se ter em conta o empenho, da autoridade com que o Papa e os Bispos em comunhão com ele, exercem seu magistério. 



Ultimamente o Papa tem feito um apelo à fome no mundo, que é um escândalo do egoísmo. Ir às periferias existenciais e sociais parece ser uma marca de Francisco. Como não associar esse "ir às periferias" com a proposta antiga da Teologia da Libertação, muito socializante?


Dom Raymundo Damasceno: A Igreja é para o mundo e não o mundo para a Igreja. Jesus enviou os seus discípulos a anunciar o evangelho a todos os povos. “Ide por todo o mundo, proclamando a Boa Notícia a toda a humanidade.” (Mc 16,15). O que o Papa Francisco está pedindo é o que Jesus ordenou aos seus discípulos: sair, partir ao encontro daqueles que vivem nas periferias não só geográficas, mas também, existenciais, àqueles em cujas vidas o evangelho não tem nenhuma ou quase nenhuma influência. Não basta a pastoral da acolhida, é necessário, também, sair ao encontro dos que não participam da Mesa do Senhor.  Esta opção não é ideológica, e sim, evangélica; é fruto da união e do amor a Jesus Cristo.



Criar a cultura do encontro, ir às pessoas de forma individual, tratar a pessoa humana como indivíduo e não como massa, são atitudes que o Papa Francisco está demonstrando no seu pontificado. Esse exemplo do Papa chega no coração das pessoas, e atrai muita gente, até mesmo inimigos antigos da Igreja, para a Igreja, para o diálogo com a Igreja. O que pode significar isso?



Dom Raymundo Damasceno: O Papa Francisco na sua viagem pastoral ao Brasil insistiu muito na cultura do diálogo, do encontro, na valorização do outro, pois ninguém é tão pobre que não tenha algo a oferecer e ninguém é tão rico que não tenha nada a receber. Esta atitude de abertura, disponibilidade, sem preconceitos em relação ao outro, o Papa Francisco definiu como “humildade social” que é o que favorece o diálogo. Numa sociedade marcada pelo individualismo, o egoísmo na qual vigora a divisa: “cada um por si, Deus por todos”, o Papa Francisco vem nos recordar que em Jesus Cristo somos todos irmãos e irmãs e, por isso, somos chamados ao respeito mútuo, ao encontro, ao diálogo, à partilha, ao intercâmbio, à solidariedade. A aproximação do Papa Francisco com o povo, sua simplicidade tem atraído muitos peregrinos a Roma. Ouvi alguém dizer em Roma que no tempo de João Paulo II, os peregrinos iam a Roma para ver o Papa; no tempo de Bento XVI, para escutá-lo e, agora, os peregrinos vão a Roma para tocar no Papa Francisco.




Para aquelas pessoas que ainda não conseguem entender o Papa Francisco, que ainda se sentem mal diante desse pontificado, que sentem saudade do Papa Bento, do Papa João Paulo II, o que o senhor diria? O que o Papa Francisco tem insistido mais aos católicos, por exemplo, quando ele disse que "não devemos privatizar a Igreja", ou quando falou sobre os "cristãos ideologizados?



Dom Raymundo Damasceno: Cada Papa tem suas características próprias, mas para o católico ele é sempre o sucessor de Pedro, o princípio e o fundamento visível da unidade de fé; o pastor de toda a Igreja com o qual devemos estar em comunhão afetiva e efetiva, comunhão que se traduz na oração por ele e no acatamento aos seus ensinamentos e orientações. O Papa Francisco, diferentemente dos seus antecessores decidiu residir na Casa de Santa Marta e não no Palácio Apostólico. Outra diferença está em suas homilias, elas são simples e as que são feitas na missa diária, na Casa de Santa Marta, são divulgadas pela mídia e tem um cunho muito familiar e sempre um tom positivo. Quanto aos temas morais, o Papa Francisco tem dado uma abordagem mais propositiva sem, contudo, mudar a doutrina da Igreja. “O amor salvífico de Deus é prévio à obrigação moral e religiosa.” O Papa Francisco tem afirmado que a Igreja não poder estar fechada, não pode reduzir-se a uma instância prestadora de serviços, mas deve abrir suas portas  e sair ao encontro das pessoas distanciadas, afastadas, esquecidas.



Cada um pode ter a própria opinião sobre os diversos temas, e é verdade que o Papa não fala de forma infalível em todas as circunstâncias da vida dele, por exemplo, quando dá uma entrevista, quando escreve uma carta, quando dá uma mensagem ou quando escreve uma encíclica. Mas, com qual espírito uma pessoa deveria ler uma entrevista do Papa, ou as suas palavras numa homilia?



Dom Raymundo Damasceno: O fiel católico deve acolher não só o que o magistério da Igreja propõe como definitivo, infalível. O magistério autêntico, exercido, por exemplo, quando o Papa escreve uma encíclica e o magistério ordinário que é o serviço diário que o Papa e os Bispos prestam ao povo de Deus por meio da pregação, aprovação de um catecismo, devem ser igualmente acolhidos.



Por último, os católicos do mundo podem confiar no Papa Francisco? Por quê?



Dom Raymundo Damasceno: Num mundo marcado pelo subjetivismo, pelo relativismo e por uma avalanche de notícias, o homem de hoje corre o risco de ser manipulado e de perder o senso crítico, sobretudo, nas questões da fé e da moral. Devemos lembrar das palavras de Cristo aos seus apóstolos: “quem vos escuta, a mim escuta.” (Lc 10,16). Por isso, os fiéis devem receber com docilidade os ensinamentos e as diretrizes que o Papa e os Bispos lhes dão sob diferentes formas. 



(Zenit)

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