Ou por que a economia atual está tão afastada da realidadeNa obra de Alejandro Casona “O barco sem pescador”, de 1945, nosso prolixo escritor teatral fez uma das críticas sociais mais inteligentes da Espanha, quando o franquismo ainda não havia optado pelo mais agressivo liberalismo econômico.
Em uma das cenas, um pescador chamado Marko pergunta a Ricardo, o protagonista: “O que você fazia lá na sua terra?”, e este respondeu que apostava na bolsa de valores. Surpreso, o pescador, depois de uma pausa, perguntou-lhe: “E depois de apostar, em que você trabalhava?”. Franzindo a testa, o empresário lhe respondeu: “A bolsa de valores não é um jogo: é um mercado”. “Um mercado?”, perguntou o pescador. “Sim – respondeu Ricardo –, mas não como os daqui. Vocês compram e vendem coisas. Nós fazemos isso com os nomes das coisas.”
“Não entendo. Como se pode comprar e vender trigo sem o trigo?”, perguntou o pescador. “Muito simples – respondeu Ricardo, pegando quatro copos do armário e organizando-os em fila sobre a mesa. Por exemplo: você acaba de plantar um trigo que só vai colher no ano que vem. Mas como precisa se manter até lá, eu lhe dou um crédito de cem coroas por conta desse trigo (coloca o primeiro copo). Aqui está a carta de crédito. Entendido? Então, se, no ano que vem, você perder a colheita, não importa: você pode me pagar esse valor com cem moedas de prata. Não é assim?”
“Isso mesmo”, responde o pescador. Então, Ricardo coloca o segundo copo e continua: “Aqui estão as cem moedas pelo valor do trigo. Mas, como o dinheiro é escasso, o banco o retira e coloca no seu lugar um papelzinho que diz: ‘Vale cem coroas’. Aqui está a nota (coloca o terceiro copo). Se, na hora de pagar, você não tem a nota, também não há problema: você assina uma nota promissória com esse valor. Aqui está a promissória (coloca o quarto copo). E então começa o milagre. Cem coroas do crédito, cem da prata, cem da nota e cem da promissória. Total: quatrocentas coroas o mercado e nem um só grão de trigo verdadeiro. Entendeu agora?”.
Então, Marko responde: “Agora sim. Há dois anos, passou por aqui um senhor que fazia a mesma coisa; mas ele fazia isso com um chapéu do qual saíam pombas”.
E uma senhora idosa que acompanhava a conversa acrescentou: “Eu não sei como são as coisas lá no sul. Mas aqui, o pouco trigo que existe sempre é de verdade. E a fome também”.
Bem sabia Alejandro Casona que especular com o valor nominal das coisas, e não o real, é, como dizia o meu avô, “pão para hoje e fome para amanhã”. Mas é nisso que se baseia nossa maltratada economia de mercado.
O barco sem pescador
Manuel Bru - publicado em 10/01/14
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