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Não chores por mim, Justin Bieber

Dont Cry for Me Justin Bieber Richard Shotwell Invision AP – pt

Richard Shotwell/Invision/AP

Jason Jones e John Zmirak - Aleteia Vaticano - publicado em 19/02/14

Por que os tropeços dos famosos nos alegram?

[Este texto, publicado originalmente na edição da Aleteia em língua inglesa, menciona celebridades particularmente populares nos Estados Unidos. Entretanto, a reflexão aqui proposta é válida para qualquer sociedade contemporânea que padece os efeitos do culto aos famosos e da obsessão pelas suas quedas]

Por que acontecem coisas ruins com as pessoas famosas? E por que não acontecem com mais frequência? Sério, existe alguma coisa mais gratificante do que ler em detalhes o último tombo de uma celebridade? Ficamos chocados ao ver alguém tão rico sendo tão estúpido, ou alguém tão glamouroso sendo fotografado em uma situação tão deplorável: a máscara pública de uma estrela se despedaça em cacos e, por trás dela, aparece a face real de alguém que se despe dos trajes Armani e veste um macacão laranja, para a foto da ficha policial. Ah, a queda do pedestal! Bem feito por ser tão mundano, tão conquistador, tão… arrogante.

Quando começamos a ler uma história como essa, protagonizada pelo jovem cantor Justin Bieber, o que nos incentiva é a simples curiosidade ou, talvez, um ligeiro espanto. Podemos até sentir verdadeira raiva do que essas celebridades fazem. Mas dificilmente sentimos compaixão. Nem paramos de ler sobre o seu tropeço com aquela sensação de satisfação inundando a nossa alma. Quanto pior a atrocidade do famoso, melhor a nossa sensação. Milhões de americanos que assistiram à fuga de O. J. Simpson da polícia, pelas estradas da Califórnia, ficaram profundamente decepcionados quando ele se entregou em vez de se atirar de um penhasco em meio a uma nuvem de glória (Thelma e Louise) ou de fazer os policiais o abaterem a bala (Butch Cassidy). E esses milhões de americanos saboreiam o desenrolar-se do processo como quem assiste a um acidente de trem em super-câmera-lenta, sentindo uma agridoce alegria. Mais recentemente, pudemos ler todos os detalhes das seguintes “disfunções” de gente famosa:

– Justin Bieber preso por dirigir sem carteira, em alta velocidade e sob o efeito de drogas, em um bairro residencial.

– Alec Baldwin perdendo as estribeiras e acusando uma repórter que o assediava de vários pecados que clamam aos céus.

– Miley Cyrus, fazendo várias… digamos, performances ousadas… em uma premiação musical.

– Charlie Sheen tendo um colapso psicótico prolongado na internet.

– Lindsay Lohan em suas idas e vindas no tratamento contra as drogas.

Outros escândalos mais antigos, que já aqueceram os nossos corações de pedra, incluem as arremetidas de Mel Gibson contra policiais judeus e garimpeiros russos, o casamento de Woody Allen com uma jovem que ele tinha criado como filha e as palhaçadas de inúmeros artistas ao longo das décadas, regadas a álcool e a alucinógenos, esmiuçadas em revistas populares, em programas de fofocas na televisão e em livros com títulos sugestivos, como “Babilônia Hollywood”.

É claro que o nosso prazer é maior quando pensamos em alguma razão legítima para não gostar da celebridade em questão. Talvez não gostemos da sua visão política ou reprovemos o conteúdo moral dos filmes em que ela participou. Talvez ela tenha até lançado alguma moda horrorosa que os nossos filhos adotaram. A mãe de um dos autores deste texto, por exemplo, reagiu à morte de John Lennon dizendo: "Ótimo. Depois de todas as crianças que ele ajudou a viciar, estou feliz por vê-lo morto".

Existe um termo para expressar o prazer que sentimos com os infortúnios das outras pessoas e, sem maiores surpresas, trata-se uma palavra alemã: Schadenfreude. A língua que nos deu as obras de Lutero, de Hitler e de Kafka recebe o crédito de batizá-lo, mas esse prazer amargo que desfrutamos é atemporal e universal. O poeta Milton nos diz que Satanás tentou Adão e Eva em parte porque os invejava, e o Gênesis declara, com firmeza, que Caim matou Abel por ciúmes: Deus parecia mais satisfeito com o seu irmão do que com ele. Sabemos de santos que foram perseguidos mesmo dentro dos conventos e dos mosteiros por irmãos que tinham inveja dos seus êxtases. Se alguém com grandes dons naturais é irritante (ver Amadeus), alguém sobrenaturalmente privilegiado por bênçãos é simplesmente intolerável (ver antissemitismo e anticlericalismo).

Não pretendemos, aqui, curar você desse pecado mortal que Tomás de Aquino considerou o mais mortal de todos (e não por procurar prazer ilícito, mas apenas por se alegrar com a dor alheia). Gostaríamos apenas de oferecer uma semente de antídoto: algumas reflexões que o ajudarão a resistir à tentação na próxima vez em que um famoso fizer alguma coisa infame. É coisa pequena e fácil de esquecer, mas esperamos que seja de ajuda:

Essas pessoas são seres humanos. São pecadores. São tolos, como todos nós. Mais ainda: eles são tolos que conseguiram, com muito trabalho duro, temperado com um pouco de sorte, conquistar uma posição na vida em que as tentações são implacáveis. Eles são caçados por jornalistas. São alvejados por sociopatas (em Los Angeles, há reuniões dos Alcoólicos Anônimos frequentadas por atores em tratamento e nas quais paparazzi e gigolôs caça-estrelas se inscrevem e se fingem de alcoólatras só para ter acesso aos ricos e famosos).

Imagine-se no lugar dessas celebridades. Imagine que você possa comprar qualquer droga que desejar e que está rodeado de gente que sabe como providenciá-la em questão de minutos. Imagine que você pode entrar em qualquer boate e olhar para qualquer desconhecido atraente com a certeza virtual de que vai levá-lo para a sua casa em qualquer noite que quiser. Imagine que você tenha acesso quase ilimitado a dinheiro vivo e a linhas enormes de crédito. Imagine que se você precise fugir de uma situação ruim: bastaria subir a um avião particular e voar para qualquer lugar que quisesse, com dinheiro suficiente para ficar por lá durante o tempo que fosse, até as coisas esfriarem.

Quantos de nós se comportariam exemplarmente com essa mesma falta de restrições? Sexo sem compromisso, drogas recreativas, uso irresponsável do carro… Essas coisas não são, por acaso, o pão de cada dia da juventude moderna? Os dois autores deste texto já foram culpados de cada uma dessas coisas; aliás, agiram até pior. Existe alguém cuja família não tenha ninguém com algum vício ou com algum problema mental? Então, por que ficamos tão “chocados” quando os ricos e famosos, submetidos a constante escrutínio, revelam também eles a sua parcela de feridas?

Nós achamos que, se pagamos para ver os filmes dessas pessoas, também temos o “direito” de assistir à sua espiral da morte. É excitante. Essas celebridades não mais reais nem menos reais para nós do que o Scooby Doo. Elas são desenhos animados, que nós vemos na tela. Mas será que nós realmente queremos que essas pessoas talentosas e trabalhadoras acabem na lona, destruídas? A nossa vida fica mesmo mais feliz de alguma forma ao vermos Justin Bieber chorando?

A inveja é um pecado mortal, minha gente. Cuidem do seu coração e troquem de canal. E lembrem-se de fazer uma oração por cada pessoa que é tentada com muito mais ferocidade do que vocês jamais serão. Justin Bieber é mais um soldado da linha de frente nesta guerra entre o bem e o mal. Se ele foi ferido, o nosso instinto deveria ser o de socorrê-lo. Não o de dar-lhe coices, do conforto do nosso sofá.

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