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O papa das surpresas

Foto pasaporte bergoglio – pt

AP

Pe. Dwight Longenecker - Aleteia Vaticano - publicado em 14/03/14

Se você acha que Francisco trouxe ar fresco à Igreja, está na hora de abrir os Evangelhos

Na semana da renúncia surpreendente do papa Bento XVI, eu comecei a escrever "perfis de papáveis" para a Aleteia. Fiz minhas pesquisas e aprendi tudo o que pude sobre os principais cardeais do mundo.

Fiquei impressionado com a variedade de talentos no topo da Igreja! Temos desde um jovem e dinâmico cardeal das Filipinas até um multitalentoso poliglota canadense; desde um converso da África pagã até o divertido e rubicundo cardeal de Nova Iorque. Temos uma vasta gama de habilidades, experiências e personalidades vívidas, que, com suas vestes cardinalícias, desfilaram naquela semana pelas minhas dissecações expostas ao mundo. Mas havia um cardeal que eu nem sequer mencionei. Era o cardeal de Buenos Aires, Jorge Mario Bergoglio.

Bergoglio estava na lista de cardeais, mas ninguém estava prestando atenção. Aos 76 anos, ele era considerado muito velho para ser papa. Seu momento já tinha passado e ele tinha perdido para Ratzinger em 2005. Ele não era um especialista em idiomas. Não era um homem muito viajado. Intencionalmente, ele tinha evitado ficar muito por dentro da Cúria. Não era um liturgista nem um perito em teologia. Ele era um jesuíta. Um “forasteiro” para os recônditos do Vaticano. Ele estava no outro lado do mundo. Ele era um desconhecido.

E no dia 13 de março de 2013 ele ficou em pé na varanda da Basílica de São Pedro e ofereceu ao mundo nada mais do que um sorriso plácido e um aceno de vovô. A minha própria primeira impressão foi de perplexidade: por que ele não disse nada? Então, ele falou em gentil italiano, desejando a todos "buona sera", pediu que orassem por ele e deu a sua bênção.

As surpresas estavam começando. Ele era o primeiro papa jesuíta, o primeiro papa americano e o primeiro papa com o nome do grande São Francisco de Assis. O Deus das surpresas tinha nos dado um papa de surpresas.

Imediatamente, o papa das surpresas nos chocou ao pegar o ônibus de volta para a Casa Santa Marta com os outros cardeais. No dia seguinte, ele nos surpreendeu novamente com uma visita não programada à Basílica de Santa Maria Maior para rezar, mas, no trajeto, parou no hotel para pagar a conta. Qual seria a próxima? Parar no McDonald’s e comer um Big Mac? O mundo ficou fascinado instantaneamente com um papa que parecia ser “um cara comum”.

E o papa Francisco continuou a surpreender. Com seu talento para as observações espontâneas, seu óbvio prazer em estar no meio das pessoas e sua vontade de assumir riscos e nos desafiar com as reivindicações radicais do Evangelho, ele recorda ao mundo que o próprio Evangelho é uma grande surpresa. Jesus Cristo, o Filho de Deus, é um pregador que subverte continuamente a ordem estabelecida, desafia o status quo, briga pelo oprimido e remexe com todas as nossas expectativas.

A imprensa laica se regozija contrastando Francisco e Bento XVI. O contraste é real, mas é uma questão de complementaridade e de continuidade, não de contradição nem de conflito. Quando o papa Francisco encorajou os jovens na Jornada Mundial da Juventude a "ir para casa e fazer bagunça", ele estava apenas sugerindo que seguissem o exemplo dele: seus esforços para reformar a Cúria, atualizar as finanças do Vaticano e purgar a Igreja da corrupção são o seu próprio esforço para "fazer uma boa bagunça".

É assim que as suas ações e palavras aparentemente perturbadoras são percebidas. Quando ele lavou os pés de uma jovem muçulmana; quando perguntou aos jornalistas "Quem sou eu para julgar?", no voo de volta do Brasil; quando teve um encontro improvisado e pessoal com um escritor ateu; quando estendeu a mão para os protestantes carismáticos; quando criticou tanto os radicais tradicionalistas quanto os radicais progressistas; quando disse que os católicos não devem ser "obcecados com o aborto nem com as uniões homossexuais", o papa Francisco estava apenas tentando nos fazer voltar o nosso coração e a nossa mente para aquilo que mais importa.



Depois do primeiro ano de pontificado, eu acho que ele é o papa das surpresas do mesmo jeito que o Evangelho é a "boa notícia". Importante: o Evangelho não é só bom; ele é notícia. Ele é novidade, frescor, surpresa. Para compreendermos o quanto o Evangelho realmente é chocante, precisamos nos sentar e ler o Evangelho. Quando encontramos Jesus Cristo, a mais impactante impressão é justamente a de surpresa.

A encarnação de Jesus Cristo no mundo é uma surpresa. Israel esperava um Messias herdeiro da casa de Davi. Em vez disso, veio um bebê, nascido de camponeses, numa cidadezinha remota e atrasada do Império Romano. Eles esperavam um rei conquistador montado num cavalo branco, mas veio um servo sofredor sentado em lombo de jumento. Eles esperavam que viesse um monarca imponente, mas veio um pregador imprevisível. Eles esperavam um governante, mas veio um curandeiro. Esperavam um rico soberano, mas veio um amigo dos pobres.

Os Evangelhos dão a impressão estonteante de que ninguém conseguia acompanhar o ritmo de Jesus Cristo. Ele estava sempre um passo à frente, indo direto ao ponto. Ele era inteligente e astuto; compassivo, mas poderoso; terno, mas duro; sublimemente espiritual, mas com os pés firmes no chão.

Eu aconselho, por isso, aqueles que estão tentando entender o papa Francisco a abrirem os Evangelhos e a lê-los direito e direto, como um livro. Esqueçam os vitrais e as imagens prontas sobre Jesus Cristo, abandonem os erros de interpretação da mídia, dos catequistas mais ou menos preparados, dos professores de religião mal informados, dos ativistas sentimentais e todas as balelas da cultura pop que nós vemos nos filmes sobre Jesus.

Vão direto à fonte e encontrem o Senhor das surpresas.

Fazendo isso, vocês vão entender melhor o papa Francisco e se assombrar mais ainda com a surpresa que Deus trouxe à Igreja, lá do fim do mundo.

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