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Sem propriedade privada pode haver dignidade humana?

No Property No Personhood John Perivolaris – pt

John Perivolaris

Jason Jones e John Zmirak - Aleteia Vaticano - publicado em 03/04/14

Nós afirmamos que não. Mas por quê?

A propriedade privada é uma implicação natural e necessária da dignidade da pessoa humana, porque a riqueza é resultado do trabalho humano combinado de forma inteligente com a generosidade da natureza.

Esta definição de riqueza, que parece ser senso comum para a maioria das pessoas, foi mais memoravelmente afirmada pelo filósofo político John Locke e posteriormente endossada pelo papa Leão XIII. Mas é uma descrição resultante de milhares de anos de reflexão e debate.

No mundo antigo, filósofos e teólogos concebiam a riqueza de forma bastante diferente disso: eles viam os frutos da terra e os recursos naturais, em grande parte, como uma fonte permanente de satisfação das necessidades da vida, que o homem essencialmente coletaria sem aumentá-las nem melhorá-las. Assim, a tarefa de sábios e santos foi a de nos encorajar a distribuir com sabedoria e justiça essa quantidade finita de riquezas, doada por Deus, levando em conta as necessidades do Estado e dos pobres.

No jogo de soma zero que aqueles pensadores acreditavam que a humanidade estivesse condenada a jogar, o acúmulo de bens por um único homem só poderia ocorrer em detrimento do vizinho. De fato, a economia antiga se baseava amplamente na produção agrícola, que, por sua vez, era feita em grande medida pelos escravos. O valor agregado por comerciantes e banqueiros, que realizam o trabalho vital de distribuição de bens e capitais a partir de lugares onde eles não são necessários para levá-los a lugares onde possam ser usados mais produtivamente, foi mal compreendido e muitas vezes rejeitado: os comerciantes e banqueiros, assim, foram condenados como parasitas econômicos. De Aristóteles a São João Crisóstomo, você procuraria em vão por pensadores influentes que reconhecessem o quanto as trocas econômicas poderiam render benefícios mútuos e aumentar os níveis gerais de riqueza, através da sua alocação mais eficiente e do seu uso focado em atender as necessidades humanas com mais eficácia.

Escolásticos medievais tardios, em especial um grupo de frades dominicanos da Espanha, avançariam na compreensão da riqueza ao estudarem empiricamente a natureza das trocas econômicas e os benefícios mútuos que elas conferem a ambas as partes, em qualquer comércio honesto. Aqueles frades, com seus votos de pobreza, fizeram esse esforço em meio à explosão de riqueza que marcou a Alta Idade Média, impulsionada tanto por avanços tecnológicos na agricultura (como arados mais eficazes e rotação de culturas) quanto pela explosão do comércio com o Oriente Médio, na esteira das Cruzadas.

As guildas medievais, compostas por produtores e comerciantes que tinham se organizado em linhas religiosas sob santos padroeiros, formaram grupos de interesses que defendiam a legitimidade moral de empreendimentos com fins lucrativos e a utilidade social do comércio, apesar de usarem as suas alianças privilegiadas para sufocar a concorrência.

O poder econômico das elites urbanas começou a ameaçar o domínio da aristocracia, permitindo que os burgueses comprassem isenções e que as cidades se estabelecessem como santuários livres de servidão: ali as pessoas comuns poderiam obter sucesso ou fracasso de acordo com os seus méritos, em vez de permanecerem imobilizadas na casta em que tinham nascido.

A expansão da liberdade econômica ajudou a criar uma base de apoio para a liberdade política. Cresceram as demandas por representação dos cidadãos no governo, como no caso, por exemplo, da Casa dos Comuns, na Inglaterra. Esse impulso em direção a um governo representativo colidiria com os esforços de príncipes, em sua busca pela monarquia "absoluta", para subjugar os nobres e os plebeus. Conflitos como a Guerra Civil Inglesa e a "Revolução Gloriosa", além das guerras suíças de independência contra as absolutistas França e Áustria, asseguraram a sobrevivência do princípio do governo representativo e a expansão do tipo de liberdade econômica e política que os líderes cívicos norte-americanos se uniriam para defender em 1776.


As implicações da propriedade privada não são essencialmente políticas nem econômicas, mas morais. Quando aceitamos este princípio, vemos que a diferença entre um pedaço de terra fértil e um pedaço de pão é vencida apenas por meio do trabalho de seres humanos, cada um dos quais é uma criação única e insubstituível. Cada pessoa na cadeia de produção, do agricultor que planta as sementes até os investidores da John Deere, cujas fábricas produzem o trator, tem o direito de dispor do seu próprio trabalho e riqueza e de ser o seu principal beneficiário. Cada hora de trabalho que uma pessoa realiza e cujos frutos são arrancados dela pela força equivale a trabalho forçado.

Assim, quando tiramos a riqueza de uma pessoa para gastá-la com outra pessoa, devemos admitir para nós mesmos o que estamos fazendo: estamos obrigando pessoas a trabalharem contra a sua vontade em benefício de um terceiro. Uma sociedade justa deve evitar sequestrar o trabalho das pessoas ou parte da sua riqueza, em primeiro lugar por deferência à sua dignidade humana e à sua liberdade de ação.

Os impostos que retiram parte da riqueza de uma pessoa só podem ser cobrados se a sua utilização for exigida por um dos princípios essenciais do desenvolvimento humano, como a sacralidade da vida ou a ordem moral transcendente. A riqueza dos cidadãos deve ser vista não como uma piscina comum em que os governantes mergulham a seu bel-prazer, mas como uma extensão da liberdade dos cidadãos, que não pode ser agredida nem sequer de leve.

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