O que um pai aprendeu do filho sobre a vida
Como todos os pais sabem, qualquer acontecimento pode desencadear a torrente das nossas lembranças.
Algumas semanas atrás, eu estava imobilizado em uma sala de emergência, refém do cateter. Meu filho de 29 anos, que tem síndrome de Down, considerou que o meu estado de incapacidade me manteria ocupado e impedido de dizer "não" aos seus planos de explorar o hospital.
Duas horas mais tarde, quando eu já estava ficando realmente preocupado com o seu sumiço, ele voltou com um sorriso enorme. Tinha ido até a cafeteria fazer um lanche, que incluiu pelo menos duas fatias de bolo. Depois, foi para o laboratório, onde se apresentou a todos na esperança de encontrar um amigo que trabalhava por lá. Finalmente, subiu até o sétimo andar para explorar a unidade de neurocirurgia ("Pai, eu queria ver onde eles trabalham com os cérebros").
Lembranças de vinte anos atrás, quando o paciente era ele, voltaram de repente. Estávamos em outra sala de emergência e meu filho delirava com uma febre de 40 graus. Os médicos tentavam segurá-lo para enfiar uma agulha em seu pulso. "Socorro! Abuso! Abuso!".
Alguns seguranças chegaram correndo. Mas foi bom, para mim, constatar que ele sabia muito bem como conseguir ajuda…
Com alguma experiência em situações hospitalares caóticas, eu pedi ajuda a nada menos que quatro médicos para segurarem, cada um, com cuidado e com firmeza, as pernas e braços do meu filho. Apoiei a cabeça dele nas minhas mãos e sussurrei: "Agora nós temos que descobrir que tipo de germe está deixando você doente. Os médicos vão ter que colocar uma agulha no seu pulso. Vai doer. Vai doer mais do que qualquer dor que você já sentiu. Mas, se não fizermos isso, os médicos não vão saber que tipo de remédio eles têm que dar para você melhorar".
Houve alguns gritos em alto e bom som e alguns gemidos incoerentes, mas tudo acabou bem. E os seguranças não vieram correndo dessa vez.
Duas semanas depois, um amigo psicólogo me deu a entender que eu tinha causado um transtorno de estresse pós-traumático no meu filho ao segurá-lo daquele jeito. E seria bom para mim, completou ele, participar de um grupo de apoio que me ajudasse a ser um pai melhor para uma criança com necessidades especiais…
Então eu perguntei ao meu filho: "O papai fez alguma coisa no hospital que deixou você chateado?".
"Sim", disse ele.
"O que foi que o papai fez?".
"Você me fez dividir os vídeos no quarto com as outras crianças quando eu estava ficando melhor. Eu queria os vídeos para mim".
"Você ficou chateado quando o papai ajudou os médicos a segurar você?".
"Não, papai, você tinha que descobrir sobre os germes malvados. Mas, da próxima vez, não deixe os outros pegarem os vídeos".
Um pensamento leva ao outro e eu me lembrei do nascimento dele, às 3 da manhã de uma festa de Halloween. Eu o segurava nos braços e dizia: "Meu Deus, o meu bebê tem síndrome de Down!". Não era uma queixa, e sim uma aceitação imediata, mas eu fui repreendido na hora por todos na sala de parto, porque os pais não têm experiência nessas coisas, não é?
Meu filho presta bastante atenção na igreja. Alguns anos atrás, o padre deu um sermão maravilhoso sobre o quarto mandamento, com muitas coisas boas para as crianças presentes na missa se lembrarem pela vida afora. Mas, depois, o meu filho foi se queixar com o padre: "Padre, por que o senhor não falou do mandamento onze?". O padre sorriu e perguntou qual era o "mandamento onze", esperando alguma resposta infantil daquele jovem com síndrome de Down.
"Honrar as crianças!".
Eu espero que isso não tenha levado ninguém a pensar que o meu filho não estava sendo bem tratado em casa, mas recebi mais do que uma… digamos… olhada crítica.