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O papa Francisco e os evangélicos

Pope Francis and the Evangelicals MARIO LAPORTA AFP – pt

MARIO LAPORTA /AFP

Pe. Dwight Longenecker - publicado em 31/07/14

A reforma planejada pelo papa é maior e mais profunda do que se imaginava

No início deste ano, o papa Francisco se encontrou com um velho conhecido chamado Tony Palmer. Ele era um sul-africano que vivia na Inglaterra, casado com uma italiana católica, e morreu tragicamente num acidente de moto na semana passada.

Tony Palmer conheceu Bergoglio quando era missionário na Argentina. Ele se apresentava como "bispo anglicano", mas não era bispo da Igreja da Inglaterra propriamente dita. É mais correto dizer que ele era bispo na "tradição anglicana". Membro de um novo movimento da Igreja evangélica que valoriza a tradição, a adoração carismática e o zelo evangélico, Palmer era um bom representante do movimento cristão que tem sido chamado de "Igreja de convergência".

A "Igreja de convergência" pode ser descrita como uma “Igreja paralela” que é carismática, evangélica e católica. Em outras palavras, seus adeptos abraçam e endossam o melhor dessas três tradições cristãs. Sem uma estrutura organizada e sem a burocracia de uma confissão institucional, os membros da “Igreja de convergência” se movem entre fronteiras confessionais, nacionais e tradicionais. Formando alianças com cristãos simpatizantes de muitas denominações, eles são, no geral, pessoas brilhantes, zelosas, positivas e proativas no ministério cristão.

Com ênfase numa mensagem simples do evangelho, eles também apreciam o culto litúrgico, a prática dos dons do Espírito Santo e um profundo amor pelas Sagradas Escrituras. Os cristãos da “Igreja de convergência” têm como objetivo pregar e viver um cristianismo radical básico.

Se quisermos entender melhor o papa Francisco como reformador, é o apreço dele por esta nova geração de evangélicos que pode lançar mais luz sobre os objetivos do seu papado e sobre ele próprio como pessoa. É interessante observar que o papa tem mantido relações cordiais com os líderes das denominações protestantes tradicionais, como Justin Welby, arcebispo de Canterbury, mas, quando se reúne com seus amigos evangélicos, ele os convida para o café-da-manhã ou para o almoço e passa horas conversando, rindo e desfrutando da comunhão com eles.

Quem vê o papa Francisco como reformador deve enxergar nas suas relações com os evangélicos o coração da sua reforma. Não é uma simples tentativa de limpar o chamado “banco do Vaticano” ou de varrer os pedófilos para fora da Igreja. Não é o simples simbolismo de morar na Casa Santa Marta, almoçar no refeitório junto com todos e andar num carro modesto. A reforma que ele planeja é muito mais radical do que isso. Ele quer que os católicos sigam Jesus Cristo de maneira radical, alegre e capaz de fazer a terra tremer.

O apreço de Francisco pelos evangélicos é, portanto, mais do que uma tentativa cordial de chegar até os cristãos que sempre foram marginalizados pela Igreja católica e que, verdade seja dita, têm sido, no geral, duramente anticatólicos. Seu apreço pelos evangélicos é mais do que uma tentativa de conter a onda de católicos que migram para as igrejas carismáticas do mundo todo. Francisco os admira de fato e, em muitos aspectos, quer que os católicos sejam mais parecidos com eles.

Isso quer dizer que os católicos têm que bater mais palmas nos louvores, falar em línguas e abraçar um calvinismo aguado e utilitarista? Quer dizer que Francisco quer “protestantizar” a Igreja católica? De maneira nenhuma. Eu acho que ele quer que os católicos sejam não exatamente mais protestantes, e sim mais católicos mesmo. Em outras palavras: ele quer que os católicos resgatem o zelo e a paixão dos santos e dos mártires. Ele quer que os católicos reaprendam a vida simples dos apóstolos e sejam alegres nos níveis mais elementares da fé: vivendo uma vida cheia do Espírito Santo na relação do dia-a-dia com Jesus Cristo.




A amizade do papa Francisco com os evangélicos dá também um rumo empolgante e inovador ao ecumenismo. Eu acredito que Francisco percebe que a união com as igrejas protestantes é uma causa perdida. Ele sabe que os anglicanos e outras igrejas do protestantismo estão trilhando um caminho divergente do catolicismo e que, quando dois caminhos divergem, eles só podem se distanciar cada vez mais. Encerradas num compromisso com a teologia reducionista, numa agenda progressista igualitária e num relativismo radical, essas igrejas são parceiras ecumênicas incertas e imprevisíveis.

Os carismáticos evangélicos, por outro lado, com toda a sua postura histórica anticatólica, realmente acreditam na fé cristã histórica. Eles acreditam na Bíblia, no essencial do credo e que Jesus está vivo no mundo de hoje através do poder do Espírito Santo. Eles podem ser um tanto “extremos”, mas Francisco percebe que o mundo precisa de uma forma radical de cristianismo. Ele também percebe que os extremos estão muitas vezes mais próximos um do outro do que as versões diluídas da fé.

Francisco, assim, concordaria com o escritor C.S. Lewis, que, quando perguntado sobre a reunificação da Igreja, respondeu: "Parece-me que os elementos ‘extremos’ em cada igreja estão mais próximos um do outro e que as pessoas liberais em cada corpo não poderão nunca se unir. O mundo do cristianismo dogmático é um lugar em que milhares de pessoas muito diferentes entre si continuam dizendo a mesma coisa. E o mundo de ‘mente aberta’ ou de cristianismo ‘aguado’ é um mundo em que um pequeno grupo de pessoas, todas do mesmo tipo, dizem coisas totalmente diferentes e mudam de ideia a cada poucos minutos. Deles, nós jamais obteremos a unidade”.

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