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Será mesmo que História já acabou?

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George Weigel - publicado em 18/08/14

Com o ressurgimento de regimes autoritários em muitas partes do mundo, o triunfo da democracia liberal ainda não é um fato definitivo

Em 1989, quando a Guerra Fria estava no fim, o cientista político Francis Fukuyama escreveu um ensaio memorável intitulado "The End of History?" [“O fim da História?”]. Apesar do ponto de interrogação no título do artigo, a ideia foi interpretada como uma resposta direta equivalente a "Sim, a História terminou".

Aquele raciocínio tinha algo de hegeliano, filtrado pelo pensamento de um francês de origem russa chamado Alexandre Kojève, e cabia perfeitamente no espírito daqueles tempos: o comunismo estava em colapso; os grandes debates dos dois séculos anteriores pareciam estar se resolvendo com a vitória das economias de mercado sobre as economias baseadas no Estado e da democracia sobre o autoritarismo; a “História”, entendida em amplo sentido filosófico, “tinha acabado”; e, ao mesmo tempo em que as coisas pareciam estar se tornando mais pacíficas, elas também pareciam estar ficando mais entediantes.

Num artigo publicado há dois meses no Wall Street Journal, meu amigo Fukuyama revisitou o seu ensaio de 1989 e começou com o óbvio: "O ano de 2014 se revela muito diferente do ano de 1989". De fato. O autoritarismo está ressurgindo na Rússia e na China. O islamismo radical está envolvendo a política mundial num pacote de conflitos políticos e de perseguição anticristã que se estende da costa oeste de Senegal até a borda leste da Indonésia. Várias experiências socialistas estão ensaiando um retorno na América Latina. Mas Fukuyama se atém às suas armas analíticas e argumenta que, mesmo tendo aprendido muito mais sobre o desenvolvimento político do que ele sabia há um quarto de século, e mesmo que povos diferentes estejam chegando ao nível desenvolvido em momentos diferentes, a democracia e a livre economia ainda caracterizariam o "fim da História".

Quando o ensaio original de Frank Fukuyama veio à luz, eu escrevi que a História continuaria porque a História é mais do que política e economia. A História também é literatura e arte, convicção religiosa e paixão moral: a História é impulsionada pela cultura, conforme uma ideia que eu aprendi do papa João Paulo II. Ponderando as dificuldades que alguns países têm enfrentado desde 1989 para garantir a transição do comunismo à livre economia e do autoritarismo à democracia, eu me vejo propenso a afinar este mesmo ponto, como tentei fazer em junho durante uma palestra que dei na Embaixada da Lituânia em Washington:

"…Apesar do núcleo de verdade contido no argumento de Fukuyama, a História, de modo manifesto, continua. Ela continua porque a democracia e a livre economia não são máquinas capazes de funcionar por si mesmas.



A
História continua porque o complemento essencial da democracia política e da livre economia é uma cultura moral pública vibrante, que tem o poder de formar cidadãos capazes de fazer a livre política e a livre economia funcionarem, de modo que o resultado final destes sistemas notáveis ​​seja a liberdade, a justiça, a abundância, a solidariedade e outros elementos públicos do florescimento humano.



A História continua porque o grande desafio dentro da História não é a criação dos mecanismos da democracia e da livre economia; por mais difíceis que essas tarefas possam ser em determinadas circunstâncias, o desafio maior é nutrir a cultura moral pública que está embutida nas instituições da sociedade civil, que enobrece a liberdade política e econômica e impede que a máquina da democracia e da livre economia trave ou, pior ainda, corrompa os homens e mulheres, os cidadãos de quem depende, em última análise, o futuro da liberdade".


Da perspectiva da Doutrina Social Católica, a autogovernação
democrática não é um fato inevitável, mas apenas possível; e esta possibilidade nunca pode ser dada como certa. Mesmo as democracias consolidadas podem decair, a ponto de tornar-se uma possibilidade real e preocupante aquilo que Bento XVI chamou de "ditadura do relativismo": o uso do poder coercitivo do Estado para impor estilos de vida libertinos em nome da tolerância, marginalizando-se, ao mesmo tempo, as pessoas que se opõem a esse regime em nome das verdades morais clássicas. Esta possibilidade está bem avançada em várias partes da Europa e não pode ser descartada nem sequer nos Estados Unidos.

É necessária certa massa crítica por parte dos cidadãos, vivendo-se determinados hábitos de mente e de coração, para que a democracia e a economia livre funcionem corretamente. A formação desses hábitos é uma tarefa essencial das livres associações da sociedade civil. A Igreja desempenha um papel fundamental no processo de dar forma aos entendimentos morais que animam essas livres associações. A História continua porque nunca termina a tarefa de formar os cidadãos virtuosos que devem garantir o bom funcionamento da liberdade.

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