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A amizade e as diferenças entre as pessoas

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Pe. Fabio Bartoli - publicado em 17/09/14

Somente com o amor se reduzem as distâncias que nos separam dos outros, distâncias e diferenças que não se anulam, mas somam

Deus cria distinguindo, separando, colocando de certa maneira uma distância entre as coisas: a luz e as trevas, a terra e o mar. As coisas começam a existir quando saem do caos, e quanto mais uma coisa é clara e definida, tanto mais existe.

Muitas consequências derivam deste princípio: a primeira é que tudo aquilo que existe tem um espelho duplo. As coisas vão de dois em dois, tudo aquilo que existe provém de um duplo original e se as coisas existem na separação é verdade que continuamente desejam voltar àquela unidade, como o sol e a lua que eternamente se seguem no céu, como Adão e Eva, que uma irresistível força empurrará sempre um ao outro, apesar de toda a guerra dos sexos. 

Mas se a distância foi criada por Deus, quer dizer que é boa. Sem a distância, sem a diferença que se caracteriza como indivíduo, não existiria identidade, nem liberdade.

A criança descobre a si mesma distinguindo-se da mãe, o amor é sadio e verdadeiro quando sai do estado de fusão típico da adolescência.

Os indivíduos só são livres porque são padrões de si. Sem distâncias entre nós viveríamos em uma mistura indistinta que aboliria cada liberdade pessoal. Solidão e responsabilidade são o preço a pagar para ter identidade e liberdade.

Assim agem em nós duas forças contrastantes: uma aspiração à identidade, que cria o desejo de distinguir-me, ou seja, de separar-me; e uma aspiração à unidade, que coloca o desejo de aproximar-me e assim eliminar as diferenças.

Entre as distâncias que nos definem existem alguns lugares nossos e outros criados diretamente por Deus, sobre o qual não podemos fazer nada. Podemos chamar estas últimas as nossas dimensões existenciais.

São princípios absolutos, ou seja, deveriam ser elementares e evidentes, mas muitas vezes são esquecidos, ou negados.

O primeiro princípio de existência é: eu estou aqui. O que significa obviamente que não estou ali. Isto cria uma distância e uma separação entre aquele daqui e aquele de lá. Se eu estou aqui e você ali, significa que eu não sou você e você não sou eu, que os nossos interesses, embora possam convergir em algumas coisas, serão sempre diferentes.

O segundo princípio de existência é: eu sou agora. O que significa que não sou amanhã, nem vinte anos atrás. Cada um de nós é o fruto de uma história e cada história com base ao primeiro princípio é diferente. Podemos fingir que não a vemos, mas a nossa história nos define e nos condiciona.

O terceiro princípio de existência é: eu sou um corpo. Não sou portanto uma pura vontade, um espírito, sujeito somente à própria escolha e à própria liberdade, mas vivo em um complexo bioespiritual que me precede e me determina: sou homem, sou alto, sou robusto, etc.

Estas três dimensões nos identificam na natureza, no tempo e no espaço.

Existe depois uma quarta distância que me define e é, em certo sentido, transversal às outras três e as inclui. Poder-se-ia exprimir na simples fórmula: eu não sou Deus. É portanto a distância estabelecida entre criatura e Criador que faz de nós inevitavelmente seres dependentes. Nós não nos damos a existência sozinhos, portanto somos destinados a existir na mendicância do ser, portanto somos felizes somente se obedecemos.

Quebrar as raízes das quais viemos significa condenar-se a uma vida sem razão, nem sentido. Na verdade existem duas vias para superar esta distância e construir uma verdadeira unidade, libertadora e não constritiva, uma natural e uma sobrenatural.

A via natural é aquela da amizade

A amizade não quer abolir a distância, não finge que não existam diferenças, mas carrega o peso de um trabalho necessário para superá-la. Este trabalho não nega a distância, implicitamente a afirma e a reconhece como boa, em um esforço de preencher esta lacuna.

A dificuldade com a qual dois amigos teimosamente recomeçam continuamente uma discussão no esforço de encontrar um acordo é um bom exemplo disso: não podem resignar-se a serem divididos, nem mesmo querem se violentar, portanto refinam continuamente o próprio pensamento na desgastante busca de uma verdade comum que permita salvaguardar a unidade sem sacrificar a liberdade e a consciência de cada um.

A via sobrenatural é aquela da graça, que encontra o seu protótipo na comunhão eucarística. Quando o meu corpo se une ao Corpo de Cristo é abolida cada distância entre o meu ser e aquele de Jesus, eu me torno literalmente parte Dele.

Isso não diz somente da nossa relação com Deus, mas também o nosso relacionamento entre nós. De fato, na medida em que sou fascinado por Cristo e seduzido por Ele, posso superar cada diferença que se coloca entre nós, como escreve São Paulo: “não existem mais judeus, nem gregos, nem escravos, nem livres, nem homem, nem mulher”.

Não somos nós que cortamos a distância, mas esta foi preenchida em um momento não do nosso trabalho, mas da graça de um dom não merecido de Deus, porque no encontro com Ele experimentamos um fascínio que povoa todo o nosso ser fazendo de nós “novas criaturas”. 

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