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O egoísmo do ateísmo

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Jim Schroeder - publicado em 27/09/14

A descrença em Deus se baseia em frágeis suposições

Algum tempo atrás, eu li dois livros que estavam no topo da lista de sugestões da Amazon no segmento de psicologia: “The Ego Trick”, do Dr. Julian Baggini, e “The Belief Instinct”, do Dr. Jesse Bering.

Depois de ler as duas obras, mandei cartas para os autores esperando dar andamento à discussão de vários tópicos ali tratados. Só recebi uma breve resposta do Dr. Baggini e nenhuma do Dr. Bering.

Os livros contavam com boa pesquisa e eram instigantes; propunham excelentes perspectivas e elementos de discussão sobre como o nosso cérebro funciona, especificamente no tocante às ideias sobre o "eu" e à "teoria da mente". Ambos foram escritos por autoproclamados ateus e ambos possuíam uma falha fatal: em meio ao entusiasmo dos autores para promover a teoria psicológica, seus livros se tornaram tentativas de fornecer provas contra a existência de Deus e das nossas almas imateriais. Um final um tanto decepcionante para um conjunto de hipóteses que prometiam, de modo significativo, aumentar a nossa compreensão da humanidade.

Eu trabalho numa área em que muitos profissionais compartilham as crenças ateístas, ou pelo menos agnósticas, desses autores. Seus pontos de vista são expressos de diversas maneiras. No entanto, quanto mais eu li e entendi a perspectiva dos ateus, mais percebi a reiterada presença de três temas na base de quase todas as suas declarações de descrença. Simplificando, os ateus pensam que a crença em Deus não é 1) lógica ou compreensível, 2) cientificamente verificável nem 3) emocionalmente razoável. Quem nega a existência do divino, em geral, volta constantemente a esses três "argumentos".

Quando uma questão espiritual não atende um desses critérios, o ateu pressupõe que Deus não pode existir. Isto implica, evidentemente, que Deus deve ser explicável – uma visão em direta oposição aos pontos de vista do cristianismo e de outras religiões, que sustentam que muitos mistérios, como a Trindade, por exemplo, existem além da nossa compreensão. Mas em nossa cultura atual, em que o narcisismo corre solto, parece que a ideia do "mistério" é inaceitável e, portanto, implausível. Alguns ateus dizem, assim, que o sofrimento de inocentes é uma prova de que Deus não existe. O erro é compreensível, especialmente se considerarmos o sofrimento de crianças que vivem em condições desumanas.

Outros afirmam que a descoberta científica de mecanismos neuronais responsáveis por experiências semelhantes às da fé comprova que Deus é uma invenção da nossa imaginação. As novas descobertas científicas são intrigantes, mas quando questões ainda abertas são assumidas como premissas definitivas no raciocínio ateu, nós temos que nos perguntar se não há egos entrando em cena.

A psicologia tem algo a dizer sobre esses três pressupostos do ateísmo. No tocante à ideia de que Deus não é lógico nem compreensível, podemos citar o bem conhecido princípio da ilusão de controle. Todos nós gostamos de achar que o nosso meio é previsível e controlável​​. Isto, porém, muitas vezes não é verdade, especialmente no caso de realidades demasiadamente complexas e vastas. Quando os ateus tentam reduzir a existência divina a premissas parciais absolutizadas, eles cedem à ilusão de que a nossa lógica está no controle de tudo.

Quanto à "invalidação" científica de Deus, mais uma vez descobrimos que as nossas próprias realidades psicológicas entram no jogo. O viés de confirmação nos convence de que as nossas opiniões são o resultado de anos de pesquisa e de observação. Na realidade, montanhas de pesquisas psicológicas apontam também para outras possibilidades. As nossas opiniões, muitas vezes, são resultado da atenção que prestamos àquilo em que acreditamos e do menosprezo com que ignoramos as informações que desafiam as nossas atuais convicções. Quando ideias científicas como a evolução e a teoria da mente são usadas ​​como “provas” da inexistência de Deus, isso parece querer confirmar as nossas tendências a olhar para o que "sabemos" e para aquilo em que "acreditamos", em vez de provocar uma abertura maior àquilo que não conseguimos provar cientificamente.

Por fim, quando se trata da dificuldade compreensível de se conciliar um Deus benevolente com a angústia emocional, com o sofrimento e com o horror, a psicologia oferece de novo um ponto de vista único. No mundo da terapia cognitivo-comportamental, que se concentra na redução das crenças irracionais (distorções cognitivas), existe uma crença com a qual todos nós lutamos de vez em quando. É o chamado raciocínio emocional. Trata-se da ideia de que aquilo que eu sinto deve ser verdade. Se eu me sinto estúpido, eu devo ser estúpido. Se eu me sinto só, eu devo ser só. Se eu sinto que Deus não existe, então Ele deve não existir. É interessante que muitos dos nossos maiores santos sofreram com este sentimento de dúvida e desolação em determinado momento da vida.

Mas indo além da teoria psicológica, vale a pena notar alguns pontos adicionais. Se um, apenas um, milagre eucarístico for autêntico, então o ateísmo não é autêntico. Se apenas um santo se encontra incorrupto, então o ateísmo não está incorrupto. E um indício comum, mas não menos válido da existência de Deus, é este: ao longo da história, deslumbrantes objetos de beleza foram criados por milhares de indivíduos, como pinturas, sinfonias, esculturas, catedrais, monumentos e invenções diversas. Ninguém jamais questionou seriamente o fato de essas realidades terem sido produzidas por algum criador ou grupo de criadores. Nós concordamos que a Muralha da China e a catedral de Notre Dame de Paris não surgiram por capricho da natureza.

Quando olhamos para o mundo e admiramos a genialidade do corpo humano e das muitas paisagens arrebatadoras que se espalham pela terra, parece muito difícil negar que deva haver um criador, não importando a teoria escolhida, seja ela a da evolução, a da mente ou qualquer outra. Também é importante notar que, enquanto a ciência e a lógica tentam explicar os mecanismos de um criador humano, as duas, repetidamente, se mostram distantes de recriar o gênio responsável ​por esses mecanismos. Tente explicar como e por que o universo existe e funciona. A ciência e lógica tentaram, mas não conseguiram. Tente explicar como um ser humano minúsculo e em fase inicial de desenvolvimento dentro do útero pode um dia chegar a falar, correr, aprender, liderar, amar e viver no coração e na alma de milhões de pessoas. É o caso de uma Teresa de Calcutá, de um João Paulo II, de um Padre Pio, de uma Teresa de Lisieux, de um Patrício, de um João de Deus, de um Inácio, de um Domingos, de um Francisco, de uma Clara, de uma Catarina de Sena, de um José, de um Pedro, de um Paulo e de milhares de outros. A ciência e a lógica ficam lamentavelmente longe de dar uma explicação definitiva.

Em essência, até mesmo as brilhantes realidades mundanas desafiam de muitas maneiras as leis da lógica, da ciência e da emoção. Sendo assim, parece um tanto estranho não podermos supor que haja um Criador divino. Afinal, a questão não é não ter dúvidas. Todos temos dúvidas. Para mim, aliás, é bem difícil, às vezes, acreditar na história épica do cristianismo, que chega a parecer muito mais incrível do que qualquer história abertamente fictícia. Mas talvez o maior truque do ego seja justamente o de acreditar que ele “sabe” o que é real…

Tags:
AteismoCiênciaPsicologia
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