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Quando um filho segura a mão da sua mãe em seu suspiro final

Mark Gordon - publicado em 19/11/14

Os ensinamentos católicos sobre a morte me ajudaram a entender e vencer uma série de riscos morais
Faltavam dez minutos para a uma da tarde, na sexta-feira, 31 de outubro. Eu estava segurando a minha mão da minha mãe quando ela deu seu último suspiro e partiu deste mundo.

Barbara Gordon tinha nascido na pobreza, mas pôde superá-la. Ficou viúva ainda jovem, mas superou esse revés também. Durante os últimos 30 anos, ela viveu um profundo sofrimento físico: teve de lutar contra uma infecção viral no coração, que exigiu um transplante; outros problemas de saúde destruíram os seus rins; o diabetes a limitava cada vez mais; e uma variedade de outras doenças a acompanhou continuamente. No meio de todo este sacrifício, ela irradiava a alegria, a paz e a coragem que vem do relacionamento pessoal permanente com Jesus Cristo. E foi através d’Ele que ela superou tudo, inclusive na hora da morte.

Como seu filho, foi um privilégio, para mim, ficar ao seu lado para reconfortá-la e amá-la até o fim. E foi um privilégio, também, ficar ao lado dela como católico; como o católico que a minha mãe não era. Ela, assim como o meu falecido pai, era ministra protestante evangélica. Os três filhos tinham todos se reconciliado com a Igreja em algum momento da vida adulta. Embora respeitasse as nossas escolhas, porém, a nossa mãe permaneceu fora da fé católica até o término da vida terrena.

Mesmo assim, o seu falecimento me trouxe uma nova apreciação do ensino da Igreja sobre a morte e sobre a dignidade da pessoa humana, especialmente no final da vida, bem como dos ritos que confortam a pessoa que está morrendo e também as que permanecem aqui depois de presenciarem a sua partida.

Uma semana antes do falecimento da minha mãe, eu tinha recebido um telefonema do diretor médico da casa de repouso onde ela vivia desde o ano passado. Ele explicou que, em sua opinião e na da equipe de enfermagem, mamãe estava começando o processo de "transição", que ele descreveu como o movimento interior que a levava da luta pela vida para a aceitação da morte. Ele nos recomendou interná-la, para que ela pudesse contar com bons cuidados paliativos.

Conversamos com a equipe da clínica alguns dias depois deste conselho. Explicamos que estávamos preparados para deixar a natureza seguir o seu curso, mas que não queríamos acelerar a morte da nossa mãe nem privá-la de recursos vitais como água e comida. Em outras palavras, queríamos que ela ficasse confortável, mas não desejávamos nenhuma espécie de eutanásia. A equipe do hospital ficou visivelmente aliviada. Eles nos contaram que, muitas vezes, têm de lidar com pedidos para “acelerar as coisas” ou administrar “golpes químicos de misericórdia”, dando um fim não natural a um processo natural.

Ao tomar a decisão final como católico, eu pude me amparar na extensa doutrina da Igreja sobre o final da vida. Esse tesouro me ajudou a entender e vencer os perigos morais envolvidos nas distinções entre os cuidados ordinários e extraordinários, a gestão da dor e a sedação terminal, a utilidade e a necessidade. Contei com um embasamento moral e filosófico para avaliar os particulares da situação da minha mãe. Contei também com uma linguagem moral finamente matizada, essencial para esclarecer as minhas dúvidas e para comunicar as minhas conclusões aos profissionais médicos.

Além disso, os ensinamentos da Igreja me desafiaram em todos os momentos a verificar as minhas motivações, incluindo a minha reação emocional ao fato de ver a minha mãe morrendo diante dos meus olhos. Com o aconselhamento provado da Igreja, eu pude desenvolver uma objetividade essencial na minha tomada de decisões, sem nunca abandonar a identificação empática com a minha mãe e os profundos laços de amor filial e de responsabilidade para com ela. A Igreja me ajudou a ver o que estava acontecendo, mas também o que deveria acontecer para que a minha mãe tivesse uma morte santa e cristã e para que eu saísse dessa experiência com a consciência serena.

Durante a última semana de vida terrena da minha mãe, nós rezamos, cantamos e lemos para ela as sagradas escrituras, especialmente os seus salmos favoritos. Como ela cumpria as condições do cânon 844.4, que trata do sacramento da unção dos enfermos para os não católicos, eu pedi que o meu pároco lhe desse o sacramento e ele nos atendeu. Durante toda a semana, ficamos muito atentos ao pessoal clínico para nos certificar de que eles cumpririam os nossos desejos e os dela.

Alguns poucos instantes depois que a minha mãe faleceu, eu levantei as mãos, olhei para cima e imaginei o seu espírito se elevando e me observando lá do alto. "Espero que eu tenha deixado você orgulhosa, mãe", sussurrei. "Eu vou encontrar você lá no céu!". Uma grande paz tomou conta de mim, confirmando que eu tinha ajudado a dar a ela uma partida digna do seu batismo, da sua confissão de fé e do seu destino final. E eu tenho que agradecer à Igreja por essa graça.

Os dias que se seguiram foram preenchidos pelas diversas tarefas necessárias a um funeral, enterro, notificações… Como sempre, eu busquei refúgio na santa missa da manhã, cujas palavras assombrosas e familiares da liturgia ganharam para mim um novo significado: "Lembrai-vos também dos nossos irmãos e irmãs que morreram na esperança da ressurreição e de todos os que partiram desta vida: acolhei-os junto a vós na luz da vossa face".

Minha mãe tinha pedido um funeral privado e simples, numa casa mortuária, seguido do enterro. Meus irmãos e eu não chamamos ministros protestantes, pois, sem a Eucaristia, consideramos que não há realmente nenhuma necessidade. Em vez disso, lemos um salmo e uma passagem da Primeira Carta aos Tessalonicenses. Cantamos um hino e dissemos as nossas palavras de despedida e de homenagem a ela diante do pequeno grupo de familiares mais próximos. Um pouco depois, à beira do túmulo, eu senti que precisávamos de algo mais: voltei para a igreja e rezei uma oração pelo descanso eterno dos fiéis defuntos.

"Em vossas mãos, Pai das misericórdias, recomendamos a nossa irmã Barbara, na esperança segura e certa de que, juntamente com todos os que morreram em Cristo, ela ressuscitará com Ele no último dia. Senhor Misericordioso, voltai-vos a nós e atendei as nossas preces: abri as portas do paraíso para a vossa serva e ajudai a nós, que aqui permanecemos, a consolar-nos uns aos outros com as garantias de fé, até que todos nos encontremos em Cristo e estejamos convosco e com a nossa irmã para sempre. Nós vo-lo pedimos por Cristo, nosso Senhor".

Mais uma vez, a sabedoria da Igreja se manifestou. A linguagem formal e poética desta prece, muito mais do que as minhas palavras jamais poderiam ter conseguido, manifestou para todos os presentes, católicos e não católicos, a singela despedida que Barbara Gordon certamente gostaria de ter tido. E foi assim que a minha mãe terrena se foi, enquanto a Santa Mãe Igreja permanece, para nos confortar e nos consolar, para nos ensinar e nos alimentar. Eu lhe sou, por isso, eternamente grato.