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As mulheres estão sendo medicadas para ser… menos mulheres?

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Carolyn Moynihan - publicado em 06/03/15

Uma psiquiatra e uma polêmica: feminismo, remédios e danos contra a biologia feminina

Medicando os sentimentos das mulheres”: este era o título do artigo mais compartilhado por e-mail, no último fim de semana, pelos leitores do site do “New York Times” (original em inglês).

A autora do artigo, Julie Holland, é uma psiquiatra preocupada com o “boom” de cidadãos norte-americanos que estão tomando medicamentos psiquiátricos; em particular, mulheres. Julie calcula que pelo menos uma em cada quatro mulheres anda tomando esse tipo de medicação, diante de um em cada sete homens.

Este quadro é "insano", considera ela. E eu tive que concordar. Mas o que realmente me surpreendeu no artigo foram outras considerações feitas por ela:

“O humor das mulheres oscila naturalmente. Pelo nosso design evolutivo, somos equipadas para ser sensível aos nossos ambientes, empáticas com as necessidades dos nossos filhos e intuitivas quanto às intenções dos nossos parceiros. Isto é fundamental para a nossa sobrevivência e para a da nossa prole”.

Como é que é? Somos regidas pelas nossas emoções, mais do que pela razão? Design evolutivo? Equipadas? Ué, mas não deveríamos acreditar, hoje, que o comportamento é todo fruto de condicionamentos sociais, que o corpo tem muito pouco a ver com o que somos e que é hora de dar às mulheres mais direito à sua cabeça e aos homens mais direito ao seu coração?

Pode ser que 90% daqueles e-mails disparados pelos leitores do “New York Times” tenham sido enviados por feministas e professores da teoria de gênero bufando de raiva com as implicações biológicas da afirmação de Julie Holland.

“Algumas pesquisas sugerem que as mulheres têm frequentemente mais facilidade do que os homens para expor os seus sentimentos porque o desenvolvimento do cérebro feminino reserva mais capacidade para a linguagem, a memória, a escuta e a observação das emoções dos outros”.

Como? Mas e todos os cérebros femininos que estão se destacando cada vez mais na análise do mercado de ações e na manipulação de genes? E o ponto de vista cada vez mais difundido de que a espécie humana não é só macho e fêmea, e sim todo um espectro de gêneros cuja beleza e diversidade estamos agora começando a enxergar?

Se bem que, por outro lado, talvez houvesse centenas de mulheres “comuns” encaminhando o artigo por e-mail para as amigas e dizendo: "Olha só, isso aqui bem que faz sentido, né?".

Holland até acena com um lencinho branco da paz para os teóricos do gênero ao dizer que "não pretende polemizar com tipo algum de ideologia pró ou antifeminista", mas, ao mesmo tempo, se mantém firme em apresentar as suas “armas” biológicas. Provavelmente, porque ela é uma profissional da saúde e realmente lida com mulheres concretas, de carne e osso, que estão angustiadas de uma forma ou de outra e a quem ela quer ajudar na prática, em vez de se dedicar a virar a sociedade de cabeça para baixo.

O que vem incomodando Julie Holland é a maneira como as empresas farmacêuticas e alguns médicos estão explorando os naturais altos e baixos dos sentimentos das mulheres e tentando convencê-las (ou conseguindo convencê-las), através de uma publicidade implacável, de que as oscilações femininas de humor são patológicas e precisam de medicação. Uma horda de mulheres em busca de receitas de antidepressivos e antipsicóticos está criando o "novo normal".

No entanto, diz a psiquiatra, "esse ‘novo normal’ está em desacordo com a biologia dinâmica das mulheres; o cérebro e a química do corpo precisam fluir". O ciclo menstrual e seus efeitos sobre os hormônios têm uma razão natural de ser. Se as mulheres se sentem irritadiças, insatisfeitas e até choram sob a pressão da casa e do trabalho, esse


fluxo natural serve para alertá-las de que as coisas precisam de mudança, incluindo, por exemplo, um sono de melhor qualidade e mais exercícios ao ar livre.

O consumo de medicamentos (é cada vez mais comum consumir os que regulam a serotonina, que é o ingrediente químico do cérebro responsável pela sensação de “tudo beleza”) implica o risco de ir entorpecendo o paciente, física e emocionalmente. Algumas mulheres percebem que ficam menos interessadas em sexo; outras relatam que sentem menos irritação, menos tristeza, menos raiva e menos preocupação, mas também sentem menos empatia, menor criatividade e menos inclinação a deixar os seus sentimentos se manifestarem.

Quando os níveis de serotonina são mantidos constante e artificialmente elevados nas mulheres, elas correm o risco de perder a sensibilidade emocional, com todas as suas flutuações naturais, e de acabar moldando um equilíbrio hormonal mais estático, mais comum ao sexo masculino. Esse embotamento emocional incentiva as mulheres a adotar comportamentos normalmente aprovados pelos homens: parecer invulneráveis, por exemplo, o que até pode ajudar as mulheres a ascender mais rápido em ambientes de negócios dominados pelos homens.

Em tudo isso, o que eu achei mais interessante é a hipótese de Holland de que a biologia humana tenha um sentido ético: se alguém se sente mal física ou mentalmente, é porque o corpo está lhe dizendo alguma coisa que é melhor ouvir e talvez mudar, em vez de só apelar para o Prozac e continuar igual a antes. Esta visão das coisas contrasta com a atual tendência de tratar o corpo como um volume de matéria ligado à mente e remodelável ao nosso bel-prazer, a fim de se adequar aos nossos desejos ou às exigências que a sociedade materialista nos impõe.

Se as mulheres estão hoje se medicando contra a depressão e a ansiedade duas vezes mais do que os homens é porque, ao longo dos últimos 50 anos, elas sofreram mais os efeitos de impor ao seu corpo um comportamento biologicamente masculinizado. Não nos esqueçamos de que, antes de medicar os sentimentos das mulheres, a indústria farmacêutica já tinha se concentrado, com grande empenho, em medicar a sua química reprodutiva. E, talvez, pela mesma razão: por exemplo, para impedir que o funcionamento natural do corpo feminino atrapalhasse os seus objetivos econômicos e políticos.

Em prol de um mundo com menos gente e, portanto, com mais sobras financeiras para consumir cada vez mais frivolidades materiais que nunca satisfazem os anseios humanos de amor correspondido e de sentido de vida, os anticoncepcionais foram o centro de um bombardeio propagandístico obedientemente engolido pelas mulheres. Agora, as mulheres estão engolindo um bombardeio de pílulas que as molda emocionalmente a um mundo consumista e focado em trabalho, carreira, status e ter.

Holland insiste:

“A emotividade das mulheres é um sinal de saúde, não de doença; é uma fonte de energia, não de fraqueza. Mas nós vivemos sob constante pressão para conter o nosso emocional. Somos doutrinadas a pedir desculpas pelas nossas lágrimas, a sufocar a nossa raiva e a ter medo de ser chamadas de histéricas”.

Poderíamos dizer exatamente o mesmo sobre o objetivo biológico da natural emotividade feminina:

“A fertilidade das mulheres é um sinal de saúde, não de doença; uma fonte de energia, não de fraqueza. Mas nós vivemos sob constante pressão para contê-lo. Somos doutrinadas a pedir desculpas por ficar grávidas, a sufocar a nossa raiva e a ter medo de ser traídas pela nossa própria evolução natural (como de fato somos, e cada vez mais)”. 
Isso também, para usar o mesmo termo de Julie Holland, é “insano”.

Se pelo menos a maioria dos psiquiatras reconhecesse este fato, estaríamos mais bem encaminhadas para resolver a epidemia do sofrimento psíquico feminino, em vez de tentar driblá-lo com paliativos que geram bilhões de dólares (para bolsos que não são os nossos).

Tags:
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