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A velhice é bela como o crepúsculo e a alvorada, como a folha amarela e o broto primaveril

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Aleteia Brasil - publicado em 09/09/15

Mas tememos a velhice justamente porque ela nos fala de um ciclo que tem seu ocaso

É verdade que em nenhum outro momento da história da humanidade a expectativa de vida ao nascer alcançou patamares tão altos. Já somos, nos países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento, sociedades “velhas”. Não que os idosos sejam a maioria da população, mas as crianças e os jovens já deixaram de ser o montante mais numeroso… Basta olhar à volta, dar uma espiada na janela da rua: vemos idosos se aventurando por nossos passeios esburacados, vemos cabeças prateadas circulando por todos os lados e vemos as filas ou os assentos “preferenciais” cada vez mais concorridos!

Apesar disso, ainda vivemos, culturalmente, sob o regime da “ditadura da beleza“. As rugas são esticadas, os cabelos brancos são pintados, as manchas são tiradas. Não digo que plásticas e cuidados com a aparência e com a pele sejam fúteis, mas é preocupante a não aceitação dos efeitos inexoráveis do tempo.

O tempo modifica tudo: desgasta os motores, enferruja o metal, modifica a natureza, expande o universo e, logicamente, envelhece os tecidos vivos. Não há matéria que não sofra os efeitos do tempo.

Acontece que o envelhecimento nos desconcerta – para alguns, conscientemente; para outros, no âmago do inconsciente – porque nos depara com uma realidade tão certa quanto tão desconfortável: a nossa efemeridade.

Tememos a velhice porque ela nos fala de um ciclo que tem seu ocaso.

E nos esquecemos de admirar o crepúsculo, tão deslumbrante quanto o alvorecer! Esquecemos de contemplar o baile das folhas amarelas que caem no outono, tão cheias de beleza quanto o broto primaveril! Esquecemos de considerar que o fruto maduro é o doce termo de uma semente que assim permanecerá frutificando!

Os sinais de envelhecimento, que para muitos representam uma vergonha, deveriam ser, porém, distintivos de méritos. Tendemos a achar a velhice feia porque pouco contemplamos das belezas imateriais. Valorizamos muito pouco as bonitas consequências das experiências bem aproveitadas. Ainda julgamos um rosto liso mais belo que um espírito prudente e sábio. Julgamos que um corpo perfeito é mais importante que dar a cada acontecimento da vida o seu justo valor, medida difícil de ser alcançada na juventude. Julgamos ainda – quão tolos insistimos em ser! – que uma vida feliz é uma vida de fama, de muito dinheiro, de prazeres e conforto. E vemos multidões de pessoas frustradas, apesar de terem alcançado tudo isso. Como diz um sábio oriental, é surpreendente que o homem de hoje viva como se não fosse morrer e morra como se não tivesse vivido.

Cada fase da vida tem suas belezas e seus dissabores. Talvez seja tolice, também, considerar uma determinada fase como “melhor idade”. Resta-nos, portanto, a sabedoria de viver cada fase com a intensidade do que nunca mais será vivido e que não deixará melancolia se mirarmos para frente, em busca dos bens que não passam.

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Texto escrito e gentilmente compartilhado conosco pela Dra. Luciana Pricoli Vilela, médica especializada em Clínica Geral e em Geriatria pela Universidade de São Paulo e membro da Sociedade Brasileira de Clínica Médica e da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia.

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