Aleteia logoAleteia logoAleteia
Segunda-feira 05 Junho |
São Franco de Assergi
Aleteia logo
Atualidade
separateurCreated with Sketch.

E o Oscar vai para… a Igreja!

spotlight.png

Aleteia Brasil - publicado em 29/02/16

A premiação do filme "Spotlight", sobre o escândalo de pedofilia em Boston, é positiva

Spotlight: Segredos Revelados” é o longa-metragem de Tom McCarthy premiado com o Oscar de melhor filme de 2015. A produção relata a investigação jornalística realizada em Boston em 2001 e que denunciou por abuso sexual de crianças e adolescentes nada menos que 249 dos cerca de 1.500 padres católicos da cidade.

Matérias curtas em jornais locais já tocavam no pavoroso assunto desde a década de 1960. Mas nada que fosse realmente a fundo no pântano da pedofilia e da manipulação sacrílega. As coisas começam a mudar quando o judeu Marty Baron (Liev Schreiber) se torna o novo diretor de redação do jornal The Boston Globe. Ele destaca para o caso dos escândalos de abuso sexual a equipe de jornalistas investigativos conhecida como Spotlight (“holofote”, em inglês), formada por Robby (Michael Keaton), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams), Matt Carroll (Brian d’Arcy James) e Michael Rezendes (Mark Ruffalo). A Spotligh já tinha sido responsável, por exemplo, pela revelação das nebulosas ligações do mafioso James “Whitey” Bulger com o FBI, nos anos 1990 – outra história transportada para o cinema em “Aliança do Crime“, com Johnny Depp.

Os repórteres agora dedicados a investigar os casos de abuso sexual clerical descobrem as primeiras vítimas, a maioria psicologicamente frágil e com famílias desestruturadas. Várias vítimas já tinham se suicidado. As ainda vivas recebiam de um grupo de apoio o título – bastante eloquente – de “sobreviventes”. Seus depoimentos dolorosos revelaram abusos que iam muito além do físico, chegando também ao âmbito da covarde manipulação moral e espiritual. Não raro, vítimas de abusos sexuais de religiosos, no caso de Boston ou em qualquer outro, chegam a considerar que elas próprias são mais “sujas” perante Deus do que os seus abusadores – e por isso sepultam em seu interior atormentado o segredo que não se atrevem a revelar ao mundo.

A equipe Spotlight percebe também que, no geral, os padres abusadores ou suspeitos de abuso eram sistematicamente afastados de suas paróquias sob justificativas diversas – mas nunca entregues à justiça. Os jornalistas descobrem que o advogado Jim Sullivan (Jamey Sheridan) acobertava os criminosos, cobrando 20 mil dólares da Igreja, por cada processo, para não divulgar o escândalo na mídia. O diretor de redação insiste em fazer a sua equipe chegar até o cerne do esquema de acobertamentos, que, além da conivência da diocese, contava também com a leniência do poder judiciário, da polícia e até do próprio ex-diretor de redação do The Boston Globe, que fizera vista grossa a várias denúncias e documentos que tinham chegado ao seu poder anos antes.

Mais do que o escândalo da pedofilia clerical em si mesmo, o tema central do filme é o papel crucial do jornalismo investigativo, tão sufocado em nossos tempos por um pseudojornalismo focado em angariar o máximo possível de “curtidas” e “compartilhamentos” nas redes sociais – o que lhe exige prostituir-se para agradar a um público raso e obcecado por fofocas, futilidades e pífias batalhas ideológicas carentes de argumentação racional.

Isto não quer dizer que o premiado filme “Spotlight” seja ele próprio um cabal modelo de isenção jornalística e de imparcialidade absoluta. Há sutis detalhes no filme que parecem insinuar certa concessão à inexata e estendida ideia de que a Igreja toda é uma instituição corrompida: em várias cenas do filme pode-se ver uma igreja ao fundo, como a indicar a “onipresença” dessa “poderosa organização” e a possibilidade de que em cada um desses templos esteja acontecendo às escondidas mais alguma coisa terrível; também perturbadoras são as cenas em que os jornalistas preparam a matéria-denúncia enquanto se ouve como trilha sonora um sugestivo coral infantil de Natal…

O próprio Oscar é, com frequência, um holofote de marketing a serviço de interesses ideológicos laicistas, e, neste caso, não deixa de chamar certa atenção que um filme que não era apontado como o favorito tenha deixado para trás o provável vencedor “O Regresso“.

Como quer que seja, a vitória de “Spotlight” se justifica amplamente e não precisa ser vista como um enésimo “ataque à Igreja” – alguns setores do catolicismo procuraram levantar esta acusação, que é bastante parcial.

Em primeiro lugar, porque o escândalo que o filme aborda é uma devastadora verdade, desmascarada, comprovada e inegável, que não pode mesmo ser acobertada sob “justificativa” alguma. Padres pedófilos constituem um horror tamanho que o seu crime abominável deve ser desmascarado com a mais irrestrita de todas as ênfases, em todos os tempos. E isto passa muito longe de ser um “ataque à Igreja” – pelo menos não é um ataque externo: em todo caso, é muito mais um ataque vindo de suas próprias entranhas do que de inimigos “de fora” dela.

Em segundo lugar, setores da Igreja erraram sim, e criminosamente, ao acobertarem o inacobertável, tornando-se cúmplices de um sacrilégio que clama aos céus. O próprio Vaticano admitiu o erro gravíssimo de um número muito relevante de organismos eclesiais e e, graças também ao empurrão das denúncias tornadas públicas, adotou uma série de medidas de imensa importância para evitar que tais abominações continuassem a ser facilitadas ou mantidas impunes. Aliás, a Igreja católica nos Estados Unidos se tornou, depois dessa duríssima provação moral, uma das instituições com os protocolos de precaução mais avançados e rígidos do planeta em termos de regras voltadas a garantir a segurança de crianças e adolescentes em suas paróquias, escolas, abrigos, orfanatos, grupos juvenis – seu atual nível de atenção e transparência não é seguido nem de longe por instituições públicas, associações laicas, clubes esportivos, colégios particulares de renome e mesmo o exército.

Em terceiro lugar, o Oscar para “Spotlight” é um prêmio para todos aqueles que combatem o abuso cometido sob os disfarces da fé e da religião – seja o abuso sexual, moral, econômico, político. Ainda que houvesse intenções “tortas” por trás da premiação a um filme que expõe pecados hediondos de uma quantidade espantosa de membros do clero, essa mesma premiação serve como favor à própria Igreja, cujos setores limpos e sérios agradecem pelas ajudas fornecidas para a purificação de todas as suas estruturas humanas.

Quanto às ainda vastas porções da opinião pública que generalizam ao falarem (mal) da Igreja, reduzindo-a irresponsavelmente a uma máfia bimilenar e ignorando tudo o que ela oferece de bom e de belo ao mundo, a solução não cabe ao cinema. Cabe à própria Igreja, através de nós, católicos, que temos a missão de testemunhar a Verdade não apenas com palavras, mas, obrigatoriamente, com obras. Em vez de nos queixarmos daqueles que nos acusam, devemos parar de lhes dar motivos para nos acusar – e, muito mais do que isso: devemos lhes dar cada vez mais e mais motivos para nos respeitarem e reconhecerem, porque respeito não se pede.

Tags:
Abusos SexuaisCinemaIgrejaLaicismoPecado
Apoiar a Aleteia

Se você está lendo este artigo, é exatamente graças a sua generosidade e a de muitas outras pessoas como você, que tornam possível o projeto de evangelização da Aleteia. Aqui estão alguns números:

  • 20 milhões de usuários no mundo leem a Aleteia.org todos os meses.
  • Aleteia é publicada diariamente em sete idiomas: inglês, francês,  italiano, espanhol, português, polonês e esloveno
  • Todo mês, nossos leitores acessam mais de 50 milhões de páginas na Aleteia.
  • 4 milhões de pessoas seguem a Aleteia nas redes sociais.
  • A cada mês, nós publicamos 2.450 artigos e cerca de 40 vídeos.
  • Todo esse trabalho é realizado por 60 pessoas que trabalham em tempo integral, além de aproximadamente 400 outros colaboradores (articulistas, jornalistas, tradutores, fotógrafos…).

Como você pode imaginar, por trás desses números há um grande esforço. Precisamos do seu apoio para que possamos continuar oferecendo este serviço de evangelização a todos, independentemente de onde eles moram ou do quanto possam pagar.

Apoie Aleteia a partir de apenas $ 1 - leva apenas um minuto. Obrigado!

PT300x250.gif
Oração do dia
Festividade do dia





Envie suas intenções de oração à nossa rede de mosteiros


Top 10
Ver mais
Boletim
Receba Aleteia todo dia