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Famintas e aterrorizadas, 250 mil crianças estão comendo capim e ração em meio a cadáveres e bombardeios

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Aleteia Brasil - publicado em 10/03/16
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Espantoso relatório “Infância sob Cerco”, da Save the Children, descreve o inferno nas cidades da Síria sitiadas pela insanidadeA organização Save the Children [Salve as Crianças, em inglês] foi criada em 1919 com a missão que é explicitada em seu próprio nome: salvar crianças. Perto de completar 100 anos, a organização internacional ainda enfrenta desafios que, de tão absurdos e revoltantes, parecem possíveis somente em roteiros de filme-catástrofe. A Save the Children tenta há 3 anos proteger com especial empenho as crianças das cidades sírias sitiadas por uma guerra covardíssima, cujas dimensões reais são detalhadas no recente relatório “Infância sob Cerco”.

O documento foi elaborado a partir de testemunhos diretos de agentes humanitários da própria organização, de parceiros de organizações locais, de cidadãos sírios que conseguiram fugir das áreas sitiadas e de cidadãos sírios que ainda vivem no inferno criado e cercado pelos combatentes que lhes negam acesso a tudo e os reduzem a mera armas de guerra.

Confira algumas das estarrecedoras denúncias contidas no relatório:

  • As crianças estão morrendo por falta de alimentos e de medicamentos ou por causas absurdas, como a ingestão acidental de veneno quando escavam a terra em busca de alguma coisa para comer.
  • Desde 2011, quando começou a guerra na Síria, pelo menos 11,3 milhões de pessoas foram forçadas a fugir da própria casa: 6,6 milhões estão deslocadas dentro do país e 4,7 milhões fugiram para o exterior – onde enfrentam outro inferno, o da crise dos refugiados, com suas travessias marítimas quase suicidas e suas novas cercas seletivas, agora erguidas nas fronteiras terrestres dos países europeus.
  • O número de sírios assassinados nestes 5 anos de conflito armado está entre 250 mil e 400 mil.
  • O cerco contra civis é uma tática de guerra desde 2011, quando o próprio governo sírio sitiou a cidade de Dara’a e deixou sua população sem eletricidade, água e comida durante 11 dias.
  • O inferno não poupa sequer hospitais e clínicas. Mesmo a poucos quilômetros da capital Damasco, há cidades, como Moadamiyeh, nas quais os médicos são obrigados a trabalhar à luz de velas.
  • Quando os postos de controle liberam a entrada de poucos medicamentos nas áreas sitiadas, eles já estão quase 100% inutilizáveis devido às más condições de armazenamento impostas pela assassina burocracia de guerra.
  • Crianças não podem sequer receber vacinas contra doenças evitáveis. Muitas das que morreram foram vítimas da raiva ou de doenças da pele e do sistema digestivo, disseminadas pelo consumo de água contaminada pelo esgoto – o fornecimento de água potável é quase inexistente nas regiões sob cerco.
  • A fumaça das explosões constantes expõe especialmente as crianças a infecções respiratórias e inflamações.
  • Sem outro recurso, pessoas e famílias inteiras vagam entre escombros em busca de trapos que, depois de fervidos, possam ser usados como “curativos”.
  • Na cidade de Madaya, de mais de 400 pessoas que precisavam ser transferidas para receber tratamentos médicos delicados, só 37 foram autorizadas.
  • Entre os pacientes com maior risco de vida estão os diabéticos, hoje sem acesso à insulina, e os que precisam de hemodiálise. Destes últimos, o relatório informa que ao menos 17 que moram ao ​​norte de Homs foram impedidos de deixar a cidade para fazer seu tratamento.
  • A falta de equipamento e material hospitalar é descrita no documento em relatos concretos, como o dos médicos que não podem fazer transfusões porque não há mais sangue estocado, o de um jovem (dentre muitos) que teve de amputar uma perna por falta de material médico e até o da criança que perdeu os dois olhos após ser atingida por estilhaços – o hospital não tinha mais instrumentos para extraí-los.
  • Com a carência de médicos (muitos foram mortos), os doentes e feridos são atendidos do jeito que é possível por dentistas, veterinários e voluntários sem formação adequada.
  • A falta de médicos ameaça em particular as crianças, que, além da desnutrição, da hipoglicemia, da hipotermia ou de paradas cardíacas provocadas por hiper-hidratação, correm o risco de morrer por causa de infecções relativamente simples, mas que nem sequer são notadas pelos atendentes improvisados, apesar de sua heroica boa vontade.
  • Absurdo inominável: os remédios e equipamentos estão a muito poucos quilômetros de distância desses enclaves do inferno, mas simplesmente não são autorizados a passar pelos postos de controle.
  • O mesmo absurdo genocida acontece com os alimentos, que estão ao lado das pessoas famintas, mas impedidos de lhes ser entregues.
  • Em Yarmouk, há relatos de pessoas que tentam sobreviver com uma única colher diária de mel. Na mesma cidade, 40% das crianças sofrem de desnutrição – estes dados, no entanto, são da metade de 2015 e muito provavelmente já pioraram ainda mais.
  • Em Deir Ezzor, o relatório diz que muitas crianças se alimentam de capim e ração para animais.
  • Nas áreas rurais de Damasco, professores informam sobre crianças que desmaiam de fome em plena aula, privadas de comida há dias. Numa guerra que se arrasta como um monstro há 5 anos, as crianças menores jamais viram na vida uma maçã ou comeram um pedaço de frango. Mesmo os legumes, menos escassos, chegam a faltar durante semanas a fio. “Elas perambulam pelas ruas alteradas pela fome”, descreve um dos agentes humanitários.
  • Pelo menos os bebês, em tese, sofreriam menos, já que contam com a amamentação. Mas só em tese: as mães não têm leite suficiente porque elas próprias passam fome.
  • Em outubro de 2015, a ONU conseguiu distribuir alimentos para cerca de 10.500 pessoas – menos de 2% do total de sírios que sobrevivem nas áreas sitiadas.
  • Mesmo para os pouquíssimos que recebem ajuda, porém, a escassa comida disponibilizada oferece menos de um quarto das calorias recomendadas como mínimo em casos de crise humanitária.
  • Também em 2015, foram atendidos menos de 10% dos pedidos da ONU de acesso às áreas sitiadas, o que mantém centenas de lugares impedidos de receber ajuda. A cidade de Darayya é um caso assustador: sua população está sem receber ajuda desde outubro de 2012.
  • Mesmo quando há permissão para que as ajudas cruzem os postos de controle nas regiões sob cerco, não há garantia nenhuma de que elas sejam entregues a quem precisa. Em janeiro de 2016, por exemplo, comboios foram autorizados a entrar em Moadamiyeh, mas sob a condição de que as ajudas fossem descarregadas em uma periferia controlada e não diretamente à população.
  • Em julho de 2015, a ONU pôde enfim levar ajuda à cidade de Douma após 18 meses de impedimentos, mas os postos de controle, que estão equipados para identificar qualquer medicamento líquido, simplesmente apreenderam os antibióticos e demais medicamentos necessários para tratar infecções.
  • Valerio Neri, diretor geral da Save the Children, informa que menos de 1% da população das áreas sitiadas consegue receber ajuda alimentar da ONU e não mais que 3% receberam atendimento de saúde até o momento.
  • 2,8 milhões de crianças estão fora da escola (antes do conflito, 99% das crianças da Síria estavam nas salas de aula). No entanto, entre as que teoricamente ainda recebem educação formal, os períodos de ausência podem chegar a meses ou mesmo anos devido não só aos deslocamentos forçados das famílias, mas também aos bombardeios que destroem as escolas.
  • 25% das escolas (o que equivale a 4.000 de um total de 16.000 escolas) sofreram ataques nos últimos 4 anos. 20% dos professores sírios já foram mortos.
  • Assim como hospitais, clínicas e fábricas, há também escolas improvisadas em porões e abrigos subterrâneos, num tentativa de proteção contra os mísseis. Só em 2015, 22% dos alvos de ataques aéreos estavam nas áreas sitiadas.
  • A maioria dos pais relata que os filhos apresentam comportamentos agressivos, causados pelo medo e pela raiva. A situação de estresse agrava ainda mais as consequências físicas e psicológicas da desnutrição. O depoimento de uma mãe da cidade de Ghouta é estremecedor: “Não temos mais crianças aqui. Só pequenos adultos”.
  • A miséria e, em muitos casos, a morte dos pais obriga crianças sírias a trabalhar ou, pelo menos, vagar pelas ruas lotadas de escombros em busca de algo para comer, tentar vender ou queimar e se aquecer no inverno de temperaturas negativas.
  • Há relatos, no documento da Save the Children, de crianças sexualmente abusadas e viciadas em drogas, quando não sequestradas ou recrutadas pelos combatentes. Depoimentos de agentes humanitários citam casos de crianças de 8 anos já forçadas a pegar em armas e lutar como soldados das facções.
  • Ao finalizar o relatório, a Save the Childen pede acesso imediato e permanente às áreas sitiadas e o fim dos ataques a escolas, hospitais e estruturas básicas, além de apelar aos líderes mundiais para que as ajudas humanitárias não sejam vinculadas aos acordos de paz e, muito menos, negociadas politicamente.
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