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Espiritualidade
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Ao homem não bastou matar o Cristo

persecuzione cristiani – pt

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Rômulo Cyríaco - publicado em 29/05/16

Mas, para o Cristo, não há medida que baste para a entrega do Seu amor à Criação

“Escrevi para ele os grandes ensinamentos da minha lei, mas estes foram tratados como uma coisa estranha” (Oseias 8,12).

Ao homem não bastou matar o Cristo. Ao homem, aliado ao pecado, cego pelas tentações, distorções e dissimulações do diabo – o anjo caído, o príncipe deste mundo, agenciador do pecado original – não bastou perseguir, agredir e matar o Cristo.

Além disso, o homem quis e quer: continuar não crendo n’Ele; ofendê-Lo, ridicularizá-Lo, blasfemar Seu nome; perseguir, ofender e ridicularizar (quando não matar) também todos aqueles que n’Ele creem, desde então. Não apenas isso, mas, também, por outro lado, “adorá-Lo” com fanatismo e violência, distorcer suas palavras e mensagens para interesses próprios e/ou maldosos, atribuir práticas humanamente rígidas (assim como discursos humanamente adoecidos) ao seu Nome Divino…

E as distorções são tantas, que o mundo do pecado, aliado ao diabo ou cegado por este, vê como se fossem certas sobre Ele todas as distorções, e vê como distorção tudo o que é certo e ortodoxo sobre Ele: pois é isso que o diabo e o pecado fazem, distorcem a mente, os olhos e o espírito dos homens, ainda não agraciados com o despertar da fé.

A fé, por sua vez, remove imediatamente (ou gradativamente) do nosso olhar as lentes distorcidas do pecado, e nos torna então (mais) aptos a perceber a presença verdadeira, libertadora e transformadora de Deus, de que passamos a cuidar e que desejamos, e a presença do pecado, que passamos rejeitar e a evitar.

As distorções se espalham, neste mundo, com muito maior rapidez e intensidade do que as percepções e coisas retas, diretas e claras. De modo que os homens não conseguem mais ver com retidão, e esta é uma consequência agradável ao diabo, pois os homens que não conseguem ver com clareza desenvolvem uma dificuldade quase cristalizada, endurecida, de enxergar a real presença de Deus na vida e reconhecê-Lo, como o Criador que ainda cuida de nós e nos orienta, cuja orientação é a Verdade, que os homens ainda tomados pela constituição do pecado rejeitam e negam – e assim se tornam vulneráveis às influências malignas, obscurecedoras da vida interna e externamente. Onde seria possível ver a Verdade, eles veem mentira; e onde seria possível (e necessário) ver a mentira enquanto tal, eles aderem a ela como a mais desejável das verdades.

Além disso, mesmo a sociedade laica que, em alguns âmbitos, torna-se mais “simpática” a Jesus Cristo – considerando-o como uma figura “histórica” e “bondosa” – às vezes fala criticamente de como o homem assassinou Jesus, sem se dar conta, na descrença ou ignorância que tem sobre a Sua Divindade, da mais profunda tragédia que esse assassinato representa, pois este evento explica a miséria espiritual da nossa civilização, a vida decaída da nossa sociedade. E de que modo o explica? Pela verdade de que Jesus é Deus feito Homem, é o próprio Criador da Vida, tendo encarnado como Homem e vindo à terra viver entre nós para nos salvar… “Vindo ao mundo para comunicar aos homens a vida divina, o Verbo que procede do Pai como esplendor da sua glória, ‘Sumo Sacerdote da Nova e Eterna Aliança, Cristo Jesus, ao assumir a natureza humana, introduz nesta terra de exílio o hino que eternamente se canta no Céu.’” E nós O matamos. Isto é: nós, os humanos, matamos Deus, na Cruz… nosso próprio Criador!

Tamanha é a resistência da espécie humana em cantar o hino que se canta no Céu eternamente, pois quer fundar para si uma canção inócua, infrutífera e danosa, com sua própria métrica – incompatível com a do hino divino – quer construir para si uma terra que tem suas próprias leis, não as leis da Vida, mas leis de mortificação estabelecidas no pecado original, a partir da captura do homem pelo anjo caído. Nós, animais inteligentes da espécie humana, matamos o nosso próprio Criador, Aquele que nos deu e nos dá a Vida e a mantém e sustenta!… Este acontecimento, evidentemente, foi algo de profundamente terrível e trágico: e muitos dos homens de hoje, descendentes dos que O mataram, sequer percebem isso, pois são herdeiros fiéis não de seu Salvador, mas do pecado de sua própria ascendência – aliás, a sociedade, como organização global da vida humana, parece mesmo querer esconder de todos esta percepção, realmente pavorosa, capaz de nos colocar por terra em desespero e penitência, de que o homem matou o Filho de seu próprio Criador. Percepção que pode, logo em seguida, nos reerguer a todos em salvação, liberdade e alegria, pois Cristo Ressuscitou! Mas, pecaminosa, a humanidade segue, até os dias hoje, ou talvez ainda mais nestes dias, mantendo-se cega à visão da gravidade daquele acontecimento – e também à Esperança que se levantou três dias depois do mesmo – permanecendo aliada, se não apaixonada, por uma realidade amplamente decaída e perversa.

Mas as Boas Novas de Jesus Cristo entram justamente, também, aí neste ponto:  Ele nos mostrou e provou – através de sua vida na terra – assim como ainda mostra e prova poderosamente ao homem – através da Igreja, da vida dos santos e das ações do Espírito Santo – que, mesmo que o homem mate a Vida e o seu Criador e permaneça o fazendo, o Seu poder é infinitamente maior – Ele, e somente Ele, é Onipotente! E mesmo que o homem O mate, Ele, então, Ressuscita! A Vida não pode morrer, a morte não pode com a Vida. O homem matou seu Deus, mas Deus não pode ser morto pelo homem, e se reergue triunfante em pura Glória e Amor… Deus vence o reino da morte, e, entrando diretamente em nossa História, de fato triunfou, ao Ressuscitar, e nos revelar em definitivo que Deus é muito maior do que os nossos pecados.

Não há pecado maior na História humana do que ter matado seu próprio Criador… Mas Ele vence o reino da morte e do pecado, porque Ele é o Criador da Vida, portanto, Jesus Cristo mostra e prova ao homem pecaminoso e ao diabo que o projeto deles – inaugurado no pecado original – é um projeto falido, fadado a terminar num Juízo Final, pois Deus é eternamente poderoso, é o Juiz Universal, e não pode ser morto, não há pecado, mesmo o mais abominável, que possa ser maior que a força de Deus de superá-lo. Deus, feito Homem, quando morto, ressuscita, permanece 40 dias nós, e envia aos seus apóstolos o Espírito Santo, para nos acompanhar e guiar até o fim dos tempos.

Deus mostra aos homens que, mesmo tendo sido morto por eles, Ele os perdoa e seguirá o fazendo, como um Pai eternamente Bondoso: pois o Amor perene, a Misericórdia infinita, fazem parte intrinsecamente do que é o Poder de Deus, do qual apenas um pequeno vislumbre humano e pecador nos faz estremecer em corpo e espírito. O Amor é o legítimo Poder da Vida, no qual e diante do qual todas as forças do mal se desmantelam, pois com este Poder não podem sequer conviver, não são com ele compatíveis.

Por isso, os seres humanos que se convertem e creem no Evangelho, entram num caminho de busca pela santidade, como realizam, de maneira especial, seus apóstolos e discípulos, como todos os santos e mártires, aproximando-se de Deus imitando Cristo… Como Estevão, que pede que Deus não considere o pecado daqueles que o apedrejavam até a morte. E essa Pureza é poder, é uma aproximação plena ao Poder de Deus, que é um Poder eternamente Amoroso e Misericordioso, não fazendo distinção de amigo ou inimigo, mas vendo em tudo e em todos irmãos na partilha dos Dons sagrados do Pai, do Filho e do Espírito Santo, e conhecendo intimamente a realidade do Amor que a tudo transforma, cura e vivifica. Pois é o Amor que está na base da própria Criação… Deus criou, a tudo e a nós mesmos, num movimento originário e puro de Amor. Pureza, esta, realizada com plenitude divina também em Maria, a Santa Mãe de Deus… Pureza, esta, tão escassa no mundo humano – que ainda se alimenta do fruto do pecado original – cuja concepção de poder é distorcida socialmente, e desorienta a muitos homens.

O Poder de Deus, que é o poder verdadeiro da Vida, inclui essa mensagem original de Amor e Misericórdia, que é: não importa o quanto os homens sejam pecadores, blasfemadores, mortificadores e assassinos da vida e da própria presença do seu Criador. Deus continua nos amando. Deus se entristece, pois quer seus filhos por perto, quer ser reconhecido como Pai, mas, nessa tristeza, permanece amando seus filhos e nunca cessa de buscá-los, alerta-los, cuidar deles, trazê-los para perto de si.

O homem, aliado ao pecado, ao diabo, quer matar o amor – matou, inclusive, ao próprio Filho de Deus quando Ele se tornou Homem – mas o Amor não pôde e não pode ser morto, e é essa a Onipotência Divina. O Amor ressuscita e perdoa aqueles que O mataram! O esforço do homem para matar o Amor é um esforço vão, daí a qualidade de vaidade de todas as coisas humanas, pois tudo no mundo humano que está fora do contato com o Divino é pura vaidade, é tudo vão, tudo em vão.

Para notar a racionalidade que há na percepção desta batalha, travada pelo diabo no mundo humano, do qual quer permanecer sendo o príncipe, basta ver como tudo o que há em nós de puro… de pureza… é constantemente ridicularizado, na sociedade do diabo. Aliás, torna-se um valor social não ser puro, aprender a típica “malícia” do mundo humano, que é associada a um “saudável” crescer. O diabo faz assim, em suas estratégias: impõe o pecado no mundo humano – o homem come o fruto proibido, atraído por este, que o diabo faz parecer o fruto mais desejável… O homem vive a sentir que o fruto mais gostoso e atraente para ser comido é justamente aquele que o distancia do seu Criador. Assim se inicia, e se mantém, a tragédia humana: quantos dedicam suas vidas a todas as coisas que os tiram a vida, que os mantêm no reino da morte!

Assim, são distorcidos em nossa sociedade todos os reais e essenciais valores e sentidos da vida para o homem e no homem, pois este não consegue e não quer mais ver Deus – pois vendo Deus e sendo visto por Ele, sendo recuperado por Ele e reintegrado no Seu rebanho, para louvá-Lo – ganhará a Vida, mas perderá o seu fruto “delicioso”, o fruto que dá acesso aos prazeres perversos que estruturam a vida em sociedade.

Toda a sociedade se estrutura, desde a base, nesses valores distorcidos. E aplica uma supervalorização social e cultural a esses valores, de modo que as crianças, os adolescentes, por exemplo, querendo então fazer parte da “sociedade”, querendo ser valorizados socialmente, aderem a estes valores produzidos pelo pecado e rejeitam todos os valores da pureza divina, que são socialmente mal vistos. E quantos adultos ainda são “crianças” e “adolescentes” nesse sentido…

Por isso Jesus nos disse que aceitar o seu reino, o reino de Deus, é morrer para esse mundo. Morrer para esse mundo… o mundo do pecado. Mas justamente para ressuscitar numa vida nova, num mundo renovado, reintegrado com o Reino de Deus, com o Cristo, que é o único verdadeiro caminho vivo para a Vida.

O homem pecador, como ovelha que todos nós somos, é uma ovelha cuja visão está distorcida, porque o pecado original precipitou a espécie humana na escuridão… Então não se consegue mais ver o nosso Pastor, não se O reconhece mais como tal, e portanto perde-se o único verdadeiro caminho. E os homens são levados constantemente para outros caminhos, mais e mais distantes do nosso Pastor; pela desorientação de um falso pastor, que é o diabo e os seres que trabalham para ele. Trágica, a história de um animal que não reconhece mais o seu Pastor, mesmo que este continue chamando, amando e cuidando. A depressão, o pânico, a ansiedade, entre outras enfermidades humanas multiplicadas no mundo contemporâneo, são frequentemente sinais e manifestações profundas de espíritos que se perderam do caminho do seu Pastor… e que agora andam a esmo num deserto em trevas, como ovelhas sozinhas, ou na companhia de outras igualmente perdidas, que não podem se ajudar, sem saberem onde está o caminho “de casa”… com medo de não acharem mais esse caminho… o caminho do Pastor… que poderia salvar, acolher e cuidar… vivificar, solidificar, dar consistência e segurança.

Mas que bom que Deus é um Pastor, e não cessa de buscar suas ovelhas e trazê-las de volta… Que alegria, que segurança e firme esperança: temos esse Criador tão misericordioso, e Onipotente!… Que, quando retornamos ao rebanho, não nos repreende por termos fugido, mas nos perdoa e se regozija com a nossa presença entre nossos irmãos. Podemos sempre confiar n’Ele… Se nos perdermos, Ele vai nos buscar… Não há dúvidas. Se acordamos para a vida com a fé e estamos atentos, podemos nos manter sempre próximos d’Ele, pois Ele nos quer perto. Basta querê-Lo perto também, Ele nos quererá, e seguirá nos orientando e guiando, para o caminho da Vida Eterna.

Amém.

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