Cientistas anunciaram nesta quarta-feira a descoberta de um planeta habitável orbitando a estrela mais próxima do nosso Sol, abrindo a tentadora perspectiva de uma exploração futura com sondas espaciais robóticas.
O recém-batizado ‘Proxima b’ tem aproximadamente a mesma massa da Terra e está em uma zona temperada compatível com a presença de água em estado líquido, um ingrediente-chave para a vida.
Os resultados, baseados em dados recolhidos ao longo de 16 anos, foram relatados na revista científica Nature.
“Finalmente, conseguimos mostrar que um planeta com pouca massa, provavelmente rochoso, está orbitando a estrela mais próxima do nosso sistema solar”, declarou Julien Morin, um astrofísico da Universidade de Montpellier, no sul da França, e coautor do estudo.
“‘Proxima b’ provavelmente será o primeiro exoplaneta visitado por uma sonda feita por seres humanos”, disse à AFP.
Um exoplaneta é qualquer planeta localizado fora do nosso Sistema Solar.
O principal autor e coordenador do projeto, Guillem Anglada-Escude, um astrônomo da Universidade Queen Mary de Londres, descreveu a descoberta como a “experiência de toda uma vida”.
Trabalhando com telescópios do Observatório Europeu do Sul no deserto chileno do norte, sua equipe utilizou o chamado método Doppler para detectar ‘Proxima b’ e descrever suas propriedades.
Sabendo que um planeta – se houvesse um – seria muito pequeno para ser visto diretamente, os profissionais observadores de estrelas passaram 60 dias consecutivos à procura de sinais de força gravitacional sobre sua estrela hospedeira, a anã vermelha ‘Proxima Centauri’.
Descoberta em 1915, a ‘Proxima Centauri’ é uma das três estrelas no sistema Alpha Centauri, uma constelação visível principalmente a partir do hemisfério sul.
Mudanças regulares no espectro de luz da estrela – repetidas a cada 11,2 dias – revelaram que se moveu alternadamente em direção e para longe do nosso sistema solar em ritmo vagaroso, cerca de cinco quilômetros por hora.
Depois de realizar uma verificação cruzada dos resultados com um conjunto de dados inconclusivos de 2000-2014 e de eliminar outras causas possíveis, os pesquisadores perceberam que apenas a presença de um planeta invisível poderia provocar a “oscilação” invariável da estrela.
Zona “cachinhos dourados””Estatisticamente, não há dúvida”, declarou Anglada-Escude aos jornalistas. “Encontramos um planeta perto de ‘Proxima Centauri'”.
A apenas quatro anos-luz do Sistema Solar, ‘Proxima b’ tem uma massa de 1,3 em relação à da Terra e orbita a cerca de sete milhões de quilômetros de sua estrela.
Um planeta tão próximo do nosso Sol – 21 vezes mais próximo que a Terra, oito vezes mais próximo do que Mercúrio – deveria ser uma inabitável bola incandescente de fogo.
Mas devido ao fato de ‘Proxima Centauri’ queimar a uma temperatura mais baixa, o planeta recém-descoberto, assim como o nosso, está em uma zona chamada “cachinhos dourados”: nem tão quente que faça a água evaporar, nem tão frio que a congele.
Mas a água líquida não é o único ingrediente essencial para o surgimento da vida da forma como a conhecemos.
Uma atmosfera também é necessária, e nesse ponto os pesquisadores ainda estão no escuro.
Tudo depende, segundo eles, em como ‘Proxima b’ evoluiu como um planeta.
“Você pode cogitar cenários de formação que terminam com uma atmosfera semelhante à da Terra, uma atmosfera como a de Vênus” – 96% de dióxido de carbono – “ou nenhuma atmosfera”, declarou o co-autor Ansgar Reiners, um especialista em estrelas “frias” do Instituto de Astrofísica da Universidade de Gottingen.
Se ‘Proxima b’ tiver atmosfera, sugerem os modelos de computador, a temperatura do planeta pode variar “no intervalo de menos 30 graus Celsius no lado escuro, e 30C no lado da luz”, disse Reiners aos jornalistas.
Assim como a Lua em relação à Terra, ‘Proxima b’ tem uma “trava gravitacional”, com uma face sempre exposta a sua estrela e a outra perpetuamente na sombra.
Mesmo com a presença de água e de uma atmosfera, há um outro desafio para o surgimento de formas de vida.
‘Próxima Centauri’ é constantemente bombardeada por radiação de alta energia na forma de raios-x e ultravioleta, cerca de 100 vezes mais em relação aos que atingem a Terra.
Busca de vidaUma atmosfera ajudaria a desviar estes raios, assim como um forte campo magnético.
Mas mesmo altas doses de radiação não impedem a vida, especialmente se pensarmos fora da caixa, afirmam os cientistas.
“Temos que ter a mente muito aberta para o que chamamos de ‘vida'”, afirmou Jean Schneider, especialista em exoplanetas no Observatoire de Paris.
“Poderia muito bem existir uma forma de vida que se adaptou aos raios X”, disse à AFP.
Cerca de 3.500 exoplanetas foram descobertos desde a primeira observação confirmada, em 1995.
Mas muitos destes mundos distantes – como os nossos próprios Júpiter e Netuno – são compostos de gás, um ambiente inóspito para a vida.
Mesmo os 10% que têm superfícies rochosas são, em sua maioria, muito frios ou quentes demais para conter água na forma líquida.
E – até hoje – os poucos que estão em uma zona temperada estão efetivamente fora de alcance.
No ano passado, por exemplo, a Nasa descobriu o Kepler 452b, um planeta cerca de 60% maior do que a Terra que poderia ter vulcões ativos, oceanos, gravidade, luz do sol como a nossa, e um ano com duração de 385 dias.
Mas, a uma distância de 1.400 anos-luz, a humanidade tem poucas esperanças de alcançar este irmão gêmeo da Terra em breve.
Em comparação, ‘Proxima b’ está a poucos passos de distância, embora ainda muito longe para os seres humanos visitarem com os foguetes existentes atualmente.
“Este é um sonho para os astrônomos se pensarmos em observações de acompanhamento”, disse Reiners.
Ele também terá um enorme impacto na agenda de pesquisas de cientistas que buscam planetas como a Terra fora do nosso Sistema Solar, acrescentou.
“O campo de exoplanetas percebeu recentemente que buscar planetas em torno de anãs vermelhas” – de longe o tipo mais comum de estrela na Via Láctea – “é o que vai ser mais espetacular, já que você pode encontrar planetas com água líquida mais facilmente”.
(AFP)