Perguntamos antes de tudo: quais as características do autêntico milagre?A etimologia da palavra milagre se prende a miraculum, i, do Latim, e quer dizer “algo admirável ou despertador de admiração”. Na Teologia, se liga a semeion (grego) e significa sinal: um sinal de Deus para confirmar algo por Ele apresentado aos homens. É sua assinatura única e infalsificável.
Ao tratarmos do tema, perguntamos antes de tudo: quais as características do autêntico milagre? – Respondemos: para se ter um autêntico milagre é preciso que se trate de fato:
1) Real – O episódio apresentado como possível milagre há de ser um caso autêntico, histórico, passível de pesquisas e comprovações. Isso é imprescindível, uma vez que a mente humana é fértil na criação ou interpretação de casos – reais ou não – tidos como maravilhosos. Enquadram-se aqui os ditos populares “Quem conta um conto, aumenta um ponto” ou “De boca em boca, a formiga vira elefante”.
2) Inexplicável pelas ciências contemporâneas ao fato – O fato real deve ser submetido ao exame de cientistas da área em foco, sejam eles de quais correntes filosóficas ou religiosas forem, desde que ajam com honestidade e real espírito científico perante a questão. Caso obtenham explicações plausíveis, já não se tem um milagre, mas tão somente um caso digno de notoriedade.
Há fatos que a Ciência jamais conseguirá explicar ou reproduzir, assim como a ressurreição de um morto há vários dias, as cicatrizações instantâneas, a transformação de água em vinho etc. Serão sempre milagres. Importa, no entanto, no conceito de milagre, que apenas a ciência contemporânea ao fato não consiga explicá-lo.
3) Realizado em autêntico contexto religioso – Para a Igreja não basta ter um fato real e inexplicável pelas ciências contemporâneas a ele. É preciso que tal fato seja realizado em um contexto de fé pura e autêntica em resposta à prece humilde dos fiéis ou em confirmação a uma doutrina da qual se tem dúvida.
Caso, porém, ocorram fatos estupendos em outros ambientes que não os da fé verdadeira, já não se tem um milagre, mas um prodígio diabólico ou – o que é mais comum – um fenômeno parapsicológico. Sim, isso é lógico e muito coerente, pois dado que o milagre é a assinatura infalsificável de Deus, Ele não pode assinar em favor dos erros, mas tão somente onde está a sua Igreja e a sua doutrina verdadeira. Fora daí não há milagres! Certo é que o milagre pode também ocorrer a pessoas que não têm fé, exatamente para que venham a tê-la. Nesse caso o contexto inicial é a falta de fé, mas o resultado é a fé – o descrente, diante do milagre, pode passar a crer.
Para que seja reconhecido pela Igreja um milagre de cura, tal como é exigido em um processo de beatificação ou canonização de um servo de Deus, são necessários os seguintes itens: a) Trate-se de uma doença orgânica grave causadora de profundas alterações no organismo do doente e que, depois de bem diagnosticada, é tida como totalmente incurável pelos recursos disponíveis à medicina contemporânea; b) Tenham sido ineficientes todos os recursos terapêuticos conhecidos aplicados; c) Verifique-se a cura do doente em tão breve espaço de tempo que supere as expectativas da Medicina para aquele caso, podendo, por isso, ser a recuperação considerada instantânea; d) A pessoa curada comece a andar, alimentar-se e trabalhar em um prazo recorde e sem sequelas, pois a longo prazo a natureza também faz seus prodígios e e) Seja a cura duradoura, capaz de ser comprovada por sucessivas avaliações médicas em prazos longos: 5, 6, 10 anos.
Fique claro o seguinte dado importante: a Medicina não declara que o fato é um milagre. Diz apenas que “a ocorrência estupenda não pode ser elucidada pelos atuais conhecimentos da Medicina”. A autoridade eclesiástica competente, no caso o Bispo da Diocese na qual o fato portentoso se deu, é quem faz a declaração de que houve um milagre. Por que é assim? – Porque sempre pelo efeito (uma cura que foge aos padrões médicos conhecidos) se supõe a Causa direta (Deus).
Vanderlei de Lima é eremita na Diocese de Amparo; Igor Precinoti é médico, pós-graduado em Medicina Intensiva (UTI), especialista em Infectologia e doutorando em Clínica Médica pela USP.