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A fé forte do povo nordestino

Flor no deserto

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Ana Lígia Lira - publicado em 27/11/17

"O dia que para alguns é 'feio', pra nós é esperança e, de tão bonito, dizemos: – Tá bonito para chover!"
Quero levar vocês a uma visita às casas de taipa, onde na parede tem sempre um quadro do coração de Jesus e outro do Coração de Maria. Como se o povo humilde do lugar intuísse ser Ela a medianeira de todas as Graças. Ensinamento amplamente divulgado por estudiosos da fé como Dom Rafael Maria, OSB, quando diz:
[…] O fundamento bíblico que atesta o que Maria é se pode tomar de Lc 1, 26 na saudação angélica, onde o anjo saúda a Virgem com um novo nome “kaire kekarithoméne” (Regozija-te Agraciada). […] Portanto, o título que o anjo Gabriel dá à Virgem de Nazaré, revela o que é e o que faz, distribuir/interceder aquilo que recebeu de Deus, a Graça ou as Graças, em uma só palavra: Jesus Cristo […] A natureza humana de Maria, cumulada pela Graça de Deus, não exerce uma função para si mas para o serviço e crescimento da Igreja, como nos indica Mt 10, 8: “Gratuitamente recebestes, gratuitamente dai”. Com esta gratuidade, buscamos ainda com o testemunho da Palavra divina o que nas atitudes de Maria nos revelam o mistério do seu serviço a favor da humanidade. Na sua visita a Isabel (cf. Lc 1, 39-56), onde cumulada pela Graça/Espírito Santo, vai distribuí-la a sua parente necessitada e Lucas afirma depois da saudação de Maria a Isabel, “…Isabel ficou repleta do Espirito Santo” (Lc 1, 39-41). A continuidade deste serviço no amor é nas Bodas de Caná que Maria mais uma vez revela o seu papel de “Agraciada/Intercessora”, consola os necessitados da festa do Esposo/Jesus (cf. Jo 2, 1-11), colaborando assim para aumento da fé no Senhor (cf. Jo 2, 11)[1].
Quero apresentar a vocês ao meu velho pai Antônio, devotíssimo de Nossa Senhora, que chamava os dias Santos de “Dias Grandes”, tirava o chapéu para falar no nome da Mãe de Deus e baixava a vista.
Deixe-me apresentar também minha avó Umbelina Joana, com suas fitas com medalhas de zeladora do Sagrado Coração de Jesus, as excelências que reza quando alguém morre, as novenas que faz aos pés do oratório improvisado em um caixote de madeira (mas muito bem cuidado) e enfeitado com flores de plástico colocadas em uma lata que um dia foi de leite. Seus livrinhos de oração que ela, semianalfabeta, até já sabe de cor.
Seja na abundância da chuva ou na escassez da seca, o sertanejo não muda sua fé. O valente vaqueiro, que enfrenta a caatinga cheia de perigos e espinhos não ousa levantar a voz contra os céus e tem por Maria pleno respeito e confiança.
A grandeza da fé do povo do sertão nordestino
A fé, por estas bandas, resiste a muito mais do quê pequenas provações diárias: Resiste à fome, à sede, à tristeza de ver o rebanho morto. Mesmo quando o pequeno rebanho de vacas ou cabras é a única coisa que se tem para alimentar a família. Aqui, não só acreditasse como vivesse o que Jesus disse “Está escrito: ‘Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus’” (Mt 4, 4,10).
Não estou falando de um sertão que ficou no passado nos livros de Graciliano Ramos ou Gilberto Freyre. Falo do sertão atual, cujo pó da terra rachada constantemente suja minhas sandálias e resseca minha garganta. Falo da seca que já entra para seis anos e que parece engolir tudo. Menos a fé… Ah! A fé deste povo é grande demais para ser engolida assim! Desdobram-se as ladainhas, novenas e rosários pedindo a intercessão da Virgem por seu povo:
“A Virgem de Nazaré não somente gerou o Filho de Deus, mas também o alimentou, educou e acompanhou durante toda sua vida, até o momento supremo de sua existência terrena, a sua doação total no sacrifício da Cruz. Isso significa que a Virgem Maria é medianeira universal, pois ao entregar-se inteiramente ao seu Filho Jesus, ela cooperou na obra da salvação de toda a humanidade. Ao mesmo tempo, Nossa Senhora é nossa medianeira particular, porque sua maternidade espiritual estende-se também a cada um de nós, que somos membros do Corpo de Cristo”[2].
Em contra partida, escuto dos meus amigos da cidade tantas lamúrias por tão pouca coisa. Tantos desafiam a Deus e, muito mais, a Maria Santíssima com propostas tão medíocres como: “Vou por esta rua escura porque acredito em Deus” ou “Fiz uma promessa para Nossa Senhora, se eu tiver aumento de salário, colaboro na obra do Padre”.
A Ave-Maria do povo nordestino
Há tanta gente suplicando tanto por tão pouco, como a chuva. Que ao mesmo tempo é tanto! Suplicando por coisas que muitos têm diariamente, gratuitamente e nem se lembram de agradecer. Recentemente, em viagem ao Sul do Brasil, escutei, diante de um dia de céu nublado, a frase: – Hoje o dia está feio!
Imediatamente lembrei que, aqui onde cresci, o dia que para alguns é feio, pra nós é esperança e, de tão bonito, dizemos: – Tá bonito para chover!
Esta é uma das coisas que os antigos ensinam aqui por estas bandas, em um Brasil que o Brasil não conhece. Mas, provavelmente, boa parte do Brasil tem ao menos uma gota do sangue nordestino. Sangue devoto. Sangue que todo dia, às seis horas da tarde, canta:
Ave Maria sertaneja (Luiz Gonzaga):
Quando batem as seis horas
De joelhos sobre o chão
O sertanejo reza
A sua oração
Ave Maria
Mãe de Deus Jesus
Nos dê força e coragem
Pra carregar a nossa cruz
Nesta hora bendita e santa
Devemos suplicar
A Virgem Imaculada
Os enfermos vir curar
Ave Maria
Mãe de Deus Jesus
Nos dê força e coragem
Pra carregar a nossa cruz.
Por Ana Lígia Lira, escritora
Referências:

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BrasilEsperançaMaria
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