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“O Cristo de Charles de Foucauld”

CHARLES

Public Domain

Vanderlei de Lima - publicado em 19/01/18

O fiel católico crê, firmemente, que Deus se revelou a nós, de diversos modos, desde a criação do mundo

O título acima é o de um livro escrito pelo Pe. Leonardo de Salles, da Diocese de Lins (SP), e publicado pela Editora Palavra e Prece, em 2010, com 96 páginas.

O cerne da obra está no capítulo 2, que vai da página 39 à 54, e é bem delimitado, como o próprio autor deixa claro ao dar a essa parte o seguinte título: A Cristologia em alguns escritos de Charles de Foucauld, ainda que não cite nenhuma obra original dele, mas se valha, em grande parte, do excelente livro Charles de Foucauld: nos passos de Jesus de Nazaré (Cidade Nova, 2004). Eis alguns pontos do livro, a nosso ver, merecedores de maior atenção.

Na página 20, afirma que Foucauld “passou no Mosteiro de Nossa Senhora das Neves seis anos e meio”. Na realidade, esta é uma informação deficiente, pois ele ingressou, realmente, em Nossa Senhora das Neves, em 1890, mas daí se mudou, logo, para Akbès e, depois, ainda, para a Trapa de Staueli, perto de Alger, de onde foi enviado a Roma, em 1896.

À página 27, se lê que a oração de Foucauld “é a de um pobre. Nada de ofício canônico que possa afastar os que não sabem latim”.

Realmente, o “eremita do Saara” desejava para o povo de Deus uma oração mais acessível. Contudo, ele mesmo foi muito fiel ao Ofício Divino, até quando estava em viagem, conforme constatamos na seguinte passagem da longa carta, de 13 de julho de 1905, ao Pe. Huvelin, seu diretor espiritual: “uma coisa me aflige… gostaria de recitar o breviário, ter as horas de oração, de meditação, as pequenas leituras da Santa Escritura, como quando não estou em viagem, ao menos sob certa medida” (Antoine Chatelard. Charles de Foucauld: o caminho rumo a Tamanrasset. São Paulo: Paulinas, 2009, p. 227). Hoje, o Ofício Divino é rezado na língua de cada povo.

Afirma que Cristo era “leigo” (p. 46). O que é sério, pois assegurar que Jesus não usou, por circunstâncias históricas, o título de sacerdote ou de sumo sacerdote – que lhe pertencem (cf. Hb 6-10) – é correto. Isso, todavia, jamais quer dizer que Ele era um leigo como conhecemos hoje. É de fé que Jesus Cristo é o verdadeiro e único Sumo Sacerdote da Nova Aliança. Desse sacerdócio participam os demais sacerdotes.

Aparecem também afirmações que, levadas ao pé da letra, beiram o relativismo. Com efeito, o autor do livro em análise escreve que a espiritualidade de Foucauld não é a “católico romana”, pois ele venceu as “barreiras doutrinais” (p. 57). Mais: “Foucauld está certo que a melhor religião não é esta ou aquela, mas a que nos faz melhor” (p. 63).

Em resposta, notamos que não há como vencer as barreiras doutrinais de cada credo sem cair no relativismo ou mesmo em um sincretismo. Quem decidisse misturar pontos de duas religiões – a católica e a budista, por exemplo – não prestaria nenhum serviço relevante à humanidade, mas, ao contrário, acabaria por fundar uma nova religião que não seria nem a católica nem a budista. Isso, certamente, Foucauld não fez.

Ademais, a melhor religião é, de forma objetiva, aquela revelada por Deus. O próprio termo vem, aliás de religo, are, do latim, que significa a união do ser humano ao Criador (transcendente) e não algo meramente humano (imanente). O fiel católico crê, firmemente, que Deus se revelou a nós, de diversos modos, desde a criação do mundo, e, de forma plena, em Jesus Cristo. O depósito dessa revelação está confiado à Igreja para a autêntica interpretação (cf. Catecismo da Igreja Católica n. 51-67 e 84-85).

Na página 71, ao tratar da Mística poderia ter dito, em termos muito gerais, que por ela se entende a vida de íntima união com Deus a transbordar em caridade para com o próximo. Pode ser, ou não, acompanhada por fenômenos como levitação, estigmas, dom de cura etc.

Na página 84, há a afirmação de que Foucauld soube “amar a Igreja e ao mesmo tempo relativizá-la”. Ora, na vida, ou se ama ou não se ama. Algo não pode ser e não ser ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto. Isso é elementar em Lógica clássica.

Eis algumas observações ao livro O Cristo de Charles de Foucauld.

Vanderlei de Lima é eremita na Diocese de Amparo.

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