separateurCreated with Sketch.

Razões do sucesso da devoção à Santíssima Virgem

VIRGIN, BLACK, WHITE
whatsappfacebooktwitter-xemailnative
Gaudium Press - publicado em 08/05/18
whatsappfacebooktwitter-xemailnative

Uma leitura espiritual para alimentar sua alma de amor a MariaAs maravilhas da devoção a Maria não podem ser explicitadas inteiramente por nenhuma análise. Nenhuma descrição, nenhum raciocínio pode dar dela uma idéia adequada…

Razões e analogias ajudam a compreender

Um jovem teólogo – M. Neubert – analisa as razões, ou melhor, as analogias de ordem natural que nos ajudam a compreender o sucesso ou a eficácia da devoção a Santíssima Virgem. Pois a devoção a Nossa Senhora leva todos a bom êxito. Constitui um axioma católico que Ela é para todo mundo um meio seguro de santificação.

A razão fundamental disso, a única razão evidente, é sem dúvida a vontade de Deus. Tendo Deus querido dar-nos Jesus Cristo por meio da Virgem Santíssima – diz Bossuet – esta ordem não muda mais, e os dons de Deus são irrevogáveis (cf. Rm 11, 29). Sempre será verdade que, havendo recebido através dEla o princípio universal da graça, recebamos também por seu intermédio as diversas aplicações desse dom em todos os variados estados dos quais se compõe a vida cristã.

Mas, a par desta explicação teológica, sobrenatural, que examina as coisas do ponto de vista divino, nada impede que se procure uma explicação psicológica para confirmá-la.

Harmonia entre a devoção a Nossa Senhora e o progresso da alma

Quais são, em nossa natureza, as harmonias entre a devoção à Santíssima Virgem e o progresso de nossa alma?

Um primeiro fator de progresso humano é o esforço pessoal: o difícil é induzir e sustentar o esforço da vontade. Nossa vontade é movida pelas ideias, mas por ideias vigorosas que são ao mesmo tempo conhecimento, sentimento e desejo. Ora, dessas ideias robustas, a mais forte é aquela que se volta para uma pessoa amada. Quem ama voa, corre, alegra-se e está disposto a tudo. Ora, ter devoção a Maria é amá-La, e amar Maria é fazer o que Ela deseja e evitar o que Lhe desagrada.

Para quantas almas, por exemplo, o pensamento posto em Maria constituiu a força pela qual triunfaram das tentações – de longe as mais violentas e frequentes – contra a mais delicada das virtudes!

Encontramos uma confirmação disso numa experiência de ordem humana. Um menino solicitado durante muito tempo pelas sugestões e argumentos pérfidos de um companheiro perverso, acaba duvidando de seu dever e vai deixar-se arrastar pelo mal.

Mas seus olhos cruzam-se com os de sua mãe: nesse mudo entreolhar, ele sente a gravidade da ação que ia cometer e obtém a coragem de fazer qualquer sacrifício para não entristecê- la.

Da mesma maneira, quantas almas assaltadas durante longo tempo e estando a ponto de ceder, ao pensar em sua Mãe celeste, tão afetuosa e amada, tão pura e desejosa de vê-las também puras, sentiram a tentação desaparecer e uma força nova as armar contra o mal! Esse gênero de vitórias costuma permanecer sepultado no segredo das consciências, mas como elas são frequentes!

Forte contra as tentações, o pensamento posto em Maria é igualmente eficaz para nos impelir na via do sacrifício. Não há santo cuja vida não ofereça a esse respeito exemplos eloquentes.

Humildade e confiança em Deus

O esforço nos é solicitado por Deus, mas não basta. Ele não passa de uma condição posta por Deus para recebermos a graça, a qual, entretanto, nos vem unicamente dEle. Não devemos contar com nossos próprios esforços, se quisermos que eles sejam coroados de êxito, mas sim com Deus. Portanto, desconfiança de nós mesmos, ou humildade, e confiança em Deus.

Ora, a devoção à Santíssima Virgem favorece de modo admirável esses dois sentimentos em nós.

Primeiramente, ela alimenta nossa humildade. Pode-se, sem dúvida, ser humilde na presença de Deus sem invocar Maria; seria o caso, por exemplo, de um protestante de boa fé para o qual invocar Maria é ofender a Deus. Entretanto, também é certo que recorrer à intercessão de Maria para ir a Deus, ir a Deus por meio de Maria, é reconhecer que não somos dignos de ir a Ele por nós mesmos; é reconhecer nossa miséria, nossa indignidade diante dEle; é fazer, mesmo sem se preocupar com isso, um ato de humildade.Eis o motivo pelo qual São Luís Maria Grignion de Montfort insiste tanto nas relações entre a devoção a Maria e a prática da humildade.

Ademais, alimenta nossa confiança em Deus. Cremos na misericórdia divina, mas com uma fé frequentemente teórica que, na prática, é exposta a graves deficiências. Ora, nesses momentos escuros pensar em Nossa Senhora constitui para nós um facho de luz que nos dá confiança.

Não por julgarmos que a Santíssima Virgem tenha um coração mais misericordioso que o do próprio Deus, mas sim por ser Ela como um argumento vivo que nos toca mais de perto e nos ajuda a melhor apalpar a misericórdia divina. Assim como ver Madalena aos pés de Jesus nos faz compreender a bondade do Salvador mais do que o faria uma idéia abstrata de sua divina perfeição, do mesmo modo a contemplação de Maria nos faz entender e sentir, melhor do que todos os raciocínios, a misericórdia dAquele que nos deu uma tal Advogada e uma tal Mãe.

Sem devoção a Nossa Senhora, a religião fica tingida de racionalismo

Estas duas disposições – humildade e confiança – constituem o próprio fundo do sentimento religioso. E é por esta razão que toda alma religiosa compreende a devoção à Santíssima Virgem.

Uma alma que cessa de compreendê- la deixa de ser religiosa ou está prestes a fabricar para si uma religião mais ou menos tingida de racionalismo, tal como certos estoicos batizados que formaram sua espiritualidade mais nos livros de moral dos estudos universitários do que nos autores ascéticos. Para essas almas, o Cristo é mais um modelo que posa diante delas, do que um amigo que vive nelas e as faz viver.Dia virá em que, após inúteis esforços, elas reconhecerão por fim sua radical fraqueza e se lançarão humildemente nos braços de Deus. Nesse dia, elas começarão também a se voltar para a Santíssima Virgem.

Eis a razão pela qual tantas pessoas aos poucos deixaram de ter uma religião e se contentam com uma simples filosofia: elas eliminaram a devoção à Santíssima Virgem para irem mais diretamente – conforme pensavam – a Jesus Cristo. Ora, perdendo de vista a Santíssima Virgem, eles rapidamente perderam também a Jesus Cristo.

Diz o Cardeal Newman, em sua magnífica “Carta a Pusey” sobre o culto a Nossa Senhora: “A Maria é confiada a guarda da Encarnação. Assim, se olharmos para a Europa, verificaremos que as nações e os países que perderam a fé na divindade de Cristo são precisamente aqueles que abandonaram a devoção à sua Mãe, e que, por outro lado, os que mais se distinguiram no seu culto guardaram a ortodoxia…”.

Traçando o mapa da devoção a Maria, teríamos traçado o próprio mapa da expansão e da conservação da fé cristã, e isto não apenas no século XIX nem a partir da Reforma, mas ao longo de toda a História da Igreja, como concluirá o próprio Neubert em sua tese, no que toca aos primeiros séculos cristãos, onde “em suma, toda a história das origens da mariologia se apresenta como a história da defesa e da dilatação da cristologia. A Mãe era a garantia do Filho, e a glória do filho começava a jorrar sobre a Mãe”.

As grandezas de Maria só podem ser entendidas com relação à Encarnação

O Evangelho é a vida de família com Deus. Ele será chamado Emanuel: Deus conosco, Deus nosso Pai, Jesus nosso Irmão Primogênito, vindo a nós para nos encontrar e nos reconduzir ao Pai. Mas nunca compreenderemos melhor quanto Deus é nosso Pai, senão pensando na doce Mãe que Ele nos deu. E jamais compreenderemos Jesus como nosso Irmão Primogênito, a não ser contemplando- O junto de Maria, nossa Mãe comum. E assim como não devemos isolar Jesus de Maria, não devemos isolar Maria de Jesus.

Maria nos ajuda a compreender Jesus. Não é possível meditar os privilégios de Maria sem melhor entender seu Filho, de quem e por causa de quem Ela os recebeu. Mas, reciprocamente, só em Jesus podemos entender Maria: Jesus é toda a razão de ser de Maria, e esta não seria o que Ela é senão em vista da Encarnação e da Redenção. Exaltar as grandezas de Maria sem mostrar suas relações com a Encarnação é fazê-lo pela metade e dar a forte impressão de gente extraviada. Eis o motivo pelo qual certos livros, certas tiradas sobre a Santíssima Virgem deixam às vezes uma impressão de vazio, de insipidez ou de hipérbole. Jamais correremos o risco de parecer hiperbólicos, ao falar de Maria, se tivermos o cuidado de apresentá-La com seu Divino Filho. Mas querer admirar Maria fazendo abstração de Jesus é coisa tão absurda quanto extasiar-se com os esplendores da aurora num dia em que o sol esteja encoberto por nuvens cinzentas.

Se quiséssemos passar em revista as virtudes cristãs e toda a diversidade de nossos estados de alma e as fases de nossa vida interior, poderíamos multiplicar indefinidamente os pormenores desses aspectos psicológicos da devoção à Santíssima Virgem.

Resolvendo uma aparente objeção

Uma objeção, entretanto, se põe: não nos arriscaremos, assim, a tirar desta devoção seu caráter divino e dar razão aos protestantes, os quais pretendem que ela seja, não um dom do alto, mas um produto desta terra? Ocorre exatamente o contrário, responde M. Neubert.

Uma tal adaptação da devoção a Maria a todas as nossas aspirações religiosas é antes uma prova de sua origem divina: toda devoção é feita para o homem, e quanto mais uma devoção responde às necessidades do homem, mais ela tem chance de ser querida por Deus.

Aliás, esta objeção só pode afetar aqueles cuja devoção a Maria sempre foi superficial. Os que verdadeiramente vivem desta devoção percebem que não se pode, por uma simples análise psicológica, dar uma explicação completa de seus maravilhosos efeitos, da mesma forma como não é possível, pelas leis da luz e das cores, explicar o imponderável inefavelmente belo e celeste que se vislumbra nos olhos de uma criança, da mesma maneira como não se consegue, por meio da anatomia e da fisiologia, explicar o amor de uma mãe pelo seu filho.

Algumas vezes, no momento de pôr-se o sol, o céu se cobre de nuvens leves, quase transparentes, e margeadas por uma tonalidade rósea, como nunca se vê no restante do dia. Depois, subitamente, essas nuvens se entreabrem e o olhar mergulha maravilhado num mar brilhante feito de ouro derretido, de um inigualável esplendor. Essa face voltada para o sol é que explica a beleza da face inferior. O mesmo se passa com os fenômenos religiosos. O psicólogo só pode descrever o que ele percebe na face inferior, a face humana; entretanto, há uma outra face, a face voltada para o Sol divino, e só esta pode explicar a beleza da face inferior.

As maravilhas da devoção a Maria não podem ser explicitadas inteiramente por nenhuma análise. Nenhuma descrição, nenhum raciocínio pode dar dela uma ideia adequada…

(Tradução, com adaptações, de L´Ami du Clergé, 1911, pp. 682- 684 – in “Revista Arautos do Evangelho”, n. 89, p. 34 à 36)

 

(via Gaudium Press)