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Por que os nomes dos dias da semana são diferentes em português?

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andy0man | Shutterstock

Padre Paulo Ricardo - publicado em 02/10/18

Tem a ver com a liturgia católica e um santo da Idade Média

Em tempos de desânimo e crise, é salutar recorrer a exemplos que alimentem a autoestima e nos ensinem a apreciar os frutos da nossa originalidade e criatividade. Assim é com uma das designações que mais usamos no quotidiano — os dias da semana — e que tornam Portugal a mais original nação da Europa.

Certamente que nunca nos perguntamos por que é que chamamos quinta-feira à quinta-feira. Depois será a sexta-feira e o seguinte sábado. Sabemos que noutros países, onde as raízes culturais são semelhantes à nossa, os nomes atribuídos aos dias da semana nada têm de similar — exceto o sábado e o domingo — à denominação que o nosso país utiliza. Já se perguntaram por quê?

Aqui ao lado, na vizinha Espanha, a segunda-feira denomina-se lunes, dia da lua; a terça-feira é martes, dia de Marte; a quarta-feira miercoles, dia de Mercúrio; a quinta-feira chama-se jueves, em alusão a Júpiter; e a sexta-feira viernes, Vênus. Trata-se de deuses pagãos da civilização romana. Da mesma forma o francês, inglês ou alemão utilizam os nomes da raiz pagã. Em algumas nações, fortemente marcadas pelo cristianismo, escaparam os dias de descanso que tomam os nomes ligados ao preceito religioso: o sábado, que recorda o “Sabat” judaico (Deus descansou ao sétimo dia) e o domingo, do latim dominus, que quer dizer dia do Senhor, em alusão à ressurreição de Jesus Cristo. Apesar disso, nos países anglossaxônicos, o domingo denomina-se sunday, que quer dizer dia do sol.

O grande responsável pelo fato de Portugal se demarcar do paganismo semanal foi São Martinho de Dume. Martinho era natural da Panônia, província romana situada no território da atual Hungria, tendo nascido presumivelmente no ano de 520. Este santo foi bispo da cidade portuguesa de Braga, de 562 a 579, numa época conturbada em termos religiosos, na qual exerceu um papel fundamental em termos diplomáticos e religiosos.

Em tempos de heresias, Martinho conseguiu converter ao cristianismo o rei suevo, cuja corte se situava em Braga, e, desta forma, conseguiu converter todo o reino. Era um homem de uma eloquência e sabedoria elevada e por isso proferia discursos e pregações excepcionais. Legou-nos alguns livros de enorme valia no campo moral e ético, documentos que utilizou para purificar a fé do seu supersticioso rebanho. Os mitos, medos e superstições no imaginário do povo conduziam a uma fé pouco depurada de influências pagãs e incoerente com a fé em Jesus Cristo. Dentro desta “limpeza” se inclui a dos dias da semana.

Assim, o dia da lua passou a ser a feria secunda, o dia de Marte a feria tertia e o dia de Mercúrio a feria quartaadotando-se a designação da liturgia eclesiástica (a liturgia ferial é a designação usada para os dias úteis). O primeiro dia da semana é o domingo, no qual se recorda a ressurreição de Cristo. Por isso, a segunda-feira é o segundo dia semanal, ficando bem vincada a marca cristã nas denominações quotidianas.

Dentre as obras de São Martinho de Dume, saliente-se o De correctione rusticorum, que significa “Correção dos rústicos”. Os rústicos eram aqueles povos rurais que permaneciam apegados às velhas superstições do paganismo. Esta obra é uma epístola moralizante que tenta fornecer critérios de ação à luz da fé que professam pelo batismo. S. Martinho apela à coerência de vida destes povos. Os ídolos, os demônios, o culto das forças da natureza, o hábito de dar aos dias da semana o nome de deuses da mitologia greco-latina, as práticas divinatórias, as superstições como o celebrar o dia do rato e das traças, são criticados por não serem consentâneos com o estatuto de um verdadeiro cristão. Por isso mesmo, urgia a modificação do nome dos dias da semana.

Nos primeiros séculos, foi tarefa primordial do cristianismo a purificação das inúmeras superstições e costumes pagãos que continuavam a vigorar nos povos já convertidos à fé em Cristo. A tentativa de conjugar estes ritos com a nova fé era muito frequente. Martinho, na sua missão de bispo metropolita, cujo domínio superava largamente o da sua diocese, enfrentou como principal desafio depurar esta fé vivida debaixo de influências pagãs. O cristianismo tentava, então, apagar os vestígios de rituais e superstições herdadas da ocupação romana.

Dado que a influência de Braga se estendia, à época, até a Galícia, hoje em dia também os galegos nos acompanham na denominação dos dias da semana. São Martinho de Dume é o padroeiro principal da arquidiocese bracarense e sua memória é celebrada pela Igreja do mundo inteiro no dia 20 de março.

Por Rui Ferreira, de Braga Maior (Portugal) – via site Padre Paulo Ricardo

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