Mulher cristã, esposa e mãe de 5 filhos, ela vivia no inferno do corredor da morte do Paquistão há quase 9 anos, acusada de “blasfêmia contra o islã”Uma notícia longamente aguardada, entre esperanças e angústias, há mais de 8 anos, finalmente se tornou realidade nesta quarta-feira, às 9h20 da manhã pelo horário do Paquistão: a Corte Suprema daquele país asiático de absoluta maioria islâmica absolveu Asia Bibi, a esposa e mãe de família cristã que tinha sido condenada à morte, em 2010, por um suposto crime cometido em 2009: o de “blasfêmia contra o islã“.
“A sentença de morte está anulada. Asia Bibi está absolvida de todas as acusações”.
As palavras de Saqib Nisa, presidente da Suprema Corte, ressoaram entre excepcionais medidas de segurança que incluíram até especialistas em desativação de bombas na entrada do tribunal, de acordo com as informações da agência EFE.
Eisham Ashiq, a filha caçula de Asia Bibi, declarou emocionada à Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN):
“Não vejo a hora de abraçar a minha mãe! Finalmente as nossas orações foram ouvidas!”
Ashiq Masih, marido de Asia Bibi, também respondeu à ACN:
“É a melhor notícia que poderíamos receber! Foi extremamente difícil ficar longe da minha esposa durante esses anos e saber que ela estava naquelas condições terríveis. Agora, finalmente, a nossa família vai se reunir, apesar de que eu duvido, infelizmente, que vamos poder continuar no Paquistão”.
Joseph Nadim, advogado de Asia Bibi, falou ao Vatican Insider:
“Estamos muito felizes. Nosso Senhor ouviu as nossas orações pela Asia e as orações de todos os que a apoiaram. Hoje é um grande dia que nós vamos recordar para sempre. A justiça triunfou e uma inocente finalmente está livre”.
Por outro lado, o também advogado Saif ul-Maluk, que fez parte da defesa de Asia Bibi, se declarou com “muito medo do que possa acontecer”, por causa da forte presença de “muitos fundamentalistas neste país”:
“Tanto a minha família quanto eu estamos em grave risco, especialmente porque eu sou um muçulmano defendendo uma cristã. Por isso, eu teria cometido blasfêmia”.
Ainda assim, o advogado dá graças a Deus “por este momento histórico em que, depois de 9 anos e meio, finalmente a justiça foi feita para Asia Bibi”.
Quem é Asia Bibi
Em 2009, a mãe de família Asia Bibi bebeu água de um poço nos arredores da sua localidade no Paquistão e foi acusada por um grupo de mulheres muçulmanas de ter “contaminado a água” por ser cristã. Ela respondeu aos insultos contra a sua fé questionando:
“Eu acredito na minha religião e em Jesus Cristo, que morreu na cruz pelos pecados da humanidade. O que seu profeta Maomé fez para salvar a humanidade?”
Esta foi a sua sentença de morte: segundo a famigerada “lei da blasfêmia”, vigente no país oficialmente islâmico, ela afrontou o profeta e, com isto, incorreu numa blasfêmia cuja pena seria o enforcamento.
A lei antiblasfêmia do Paquistão
Baseada na sharia, que é o rígido arcabouço legislativo islâmico, a lei paquistanesa da blasfêmia prevê punições rigorosas a qualquer pessoa que insulte Alá, o islã, o alcorão, Maomé e outras personalidades da fé muçulmana. As sentenças podem incluir de chibatadas até a pena de morte. Essa lei costuma ser manipulada para atender a interesses pessoais, o que inclui vinganças de todo tipo, inclusive de muçulmanos contra outros muçulmanos. É frequente que a minoria cristã no Paquistão seja alvo de acusações de blasfêmia contra as quais é quase impossível defender-se. Os abusos são facilitados porque até testemunhos sem provas são aceitos pelos tribunais.
Um processo no inferno
Asia Bibi foi jogada na prisão em 14 de junho de 2009. Um ano depois, foi condenada à morte pela acusação de blasfêmia. Desde 2013, após duas transferências de presídio, ela passou a fenecer em uma das três celas sem janelas do corredor da morte de Multan, no Punjab.
Em 2014, o Supremo Tribunal do Paquistão adiou o julgamento de um recurso porque 150 especialistas na “lei islâmica”, os muftis, simplesmente ameaçaram de morte qualquer um que viesse a ajudar os “blasfemos” do país. A partir daí, o caso parou no tempo. Em 30 de agosto de 2017, Asia Bibi completou 3.000 dias de encarceramento. Somente em abril de 2018 é que o presidente do Tribunal Supremo do Paquistão, Mian Saqib Nisar, anunciou que retomaria o julgamento que poderia definir a libertação de Asia Bibi. Ainda foi necessário esperar até 30 de outubro para que esse dia chegasse.
Amplo apoio cristão e humanitário
Milhões de cristãos de todo o planeta se mobilizaram ao longo destes anos para salvar Asia Bibi e dezenas de outras pessoas aprisionadas e condenadas simplesmente por causa da própria fé em diferentes países.
Em 22 de fevereiro de 2018, a filha caçula e o esposo de Asia Bibi foram recebidos pelo Papa Francisco. Eles participaram no Vaticano de um encontro em favor dos cristãos perseguidos no mundo, organizado pela fundação pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN, pela sigla em inglês adotada como padrão internacional). A ACN é uma das entidades que mais se destacam na ação objetiva em prol dos cristãos perseguidos.
Por ocasião daquele encontro, o Coliseu de Roma foi iluminado de vermelho para recordar o sangue dos mártires cristãos em todo o planeta. Foram iluminadas também a catedral maronita de Santo Elias, em Aleppo, na Síria, e a igreja de São Paulo em Mossul, no Iraque, outros países brutalmente martirizados em nossa época.
Do horror do cativeiro, uma pungente oração a Jesus Cristo
Ao longo dos seus muito mais de 3.000 dias de encarceramento à sombra da morte, porém, Asia Bibi não parou de rezar nem de pedir orações.
A cristã que se tornou ícone para todos os que lutam no Paquistão e no mundo contra a violência em nome da religião compôs em 2017 uma oração por ocasião da Páscoa. Esta prece passou a acompanhá-la como sustento vital em seu cativeiro:
Senhor Ressuscitado, permite que a tua filha Asia ressuscite contigo.
Rompe as minhas correntes, liberta o meu coração para além destas barras e acompanha a minha alma, para estar perto das pessoas que eu amo e sempre perto de ti.
Não me abandones no dia do tormento, não me prives da tua presença. Tu, que sofreste a tortura e a cruz, alivia o meu sofrimento. Sustenta-me perto de ti, Senhor Jesus.
No dia da tua ressurreição, Jesus, eu quero orar pelos meus inimigos, por aqueles que me feriram. Rezo por eles e te peço que os perdoes pelo mal que me fizeram.
Peço-te, Senhor, que retires todas as barreiras, para que eu alcance a bênção da liberdade. Peço-te proteção para mim e para a minha família.