Quando fazemos bem o nosso trabalho, apesar do cansaço e dos espinhos, crescemos na virtude que nos leva ao céu
Um dos prazeres da paternidade é apresentar aos filhos mais velhos uma boa rotina de música e dança. A música “If I Were a Rich Man” (Se eu fosse rico), de Fiddler on the Roof, é uma ótima escolha. É uma canção cativante e os movimentos de dança não são tão rigorosos a ponto de arriscar lesões significativas.
Mas e a mensagem? O trabalho diário é algo que só suportamos na pobreza e na necessidade? Por que celebramos a festa de São José Operário em 1º de maio? Se eu fosse um homem rico, abandonaria meu trabalho para o estudo vagaroso das Escrituras?
Como teólogo, minha resposta a essa pergunta é um pouco mais complicada, mas, infelizmente, relativamente pouco do meu dia de trabalho é gasto no feliz estudo das Escrituras e da Tradição. Passo mais tempo entre a papelada, comitês e negócios da educação. Como católico, como devo entender a necessidade desse trabalho?
Obviamente, nossa vida profissional é corrompida pelo pecado. Como Deus disse a Adão, temos que viver pelo suor da nossa testa, lutando contra espinhos e cardos o tempo todo. E, se esse episódio de Gênesis 3 fosse a história toda, se o trabalho e o sofrimento fossem a essência vida, seria algo que perduraria até que fôssemos libertados pela morte, aposentadoria ou ganhássemos na loteria.
Porém, se voltarmos ao segundo capítulo de Gênesis, alguns fatos básicos ficam claros. O trabalho não é uma conseqüência da queda. Na segunda segunda-feira de manhã, Adão e Eva se levantaram e dedicaram um dia de jardinagem (e um pouco de criação leve). Muito antes da fatídica pausa para o almoço, o trabalho fazia parte do plano original de Deus.
Como o resto da criação de Deus, o trabalho humano é bom. Somos feitos à imagem de um Deus que é um Criador. Podemos não formar o cosmos do nada, mas podemos usar o material que Deus forneceu e atrair a bondade e a beleza em potencial no mundo ao nosso redor. Deus poderia ter moldado aquela floresta primordial em um jardim, mas como parte do Seu amor por nós, Ele nos deu parte de sua obra.
O pecado dificulta, mas não muda nosso propósito ou objetivo. Como Jesus nos ensinou na Oração do Senhor, almejamos a vinda do reino de Deus e que Sua vontade seja feita aqui na Terra, como no céu. Quando a maioria de nós pensa em como isso acontece, tendemos a pensar em coisas “religiosas”: oração, liturgia ou atos pessoais de sacrifício pelos outros. E, certamente, essas são todas as coisas boas que promovem o reino de Deus. Porém, nosso trabalho diário também pode fazer isso.
O verdadeiro significado do trabalho está presente nas Escrituras e na Tradição. Um dos melhores exemplos está nos capítulos 38 e 39 do livro de Eclesiástico. Talvez não surpreendentemente, como estudioso bíblico, Sirac vê sua profissão como o chamado mais nobre. Mas ele também elogia o trabalho do médico, fazendeiro, gravador, ferreiro e oleiro. Ele reconhece que eles podem ocupar um lugar humilde na sociedade, mas desempenham papéis vitais.
No Novo Testamento, Paulo leva essa ideia um passo adiante. Até os escravos são chamados a dar glória a Deus por meio de seu trabalho e a realizar todas as suas tarefas como o Senhor (Colossenses 3, 22-24).
O ensino moral católico tradicional também fala sobre o significado do trabalho. Como cristãos, somos chamados a crescer em virtude. Algumas virtudes que recebemos como presentes, mas outras são desenvolvidas por nossas escolhas e ações diárias. Quando fazemos bem o nosso trabalho, apesar do cansaço, dos cardos e dos espinhos, crescemos na virtude que nos leva ao céu. E nosso trabalho pode aproximar um pouco mais o reino de Deus da realização, seja criando beleza, atendendo às necessidades físicas de outras pessoas ou prestando serviços que fortaleçam nossas comunidades.
Não somos feitos à imagem de um “assalariado” divino; somos feitos à imagem de um Criador amoroso. Nosso trabalho diário é uma chance de resistir aos efeitos do pecado, crescer em semelhança com Ele e promover Seu reino.