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O Sínodo, a inculturação e um rito amazônico

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Antoine Mekary | ALETEIA

Vanderlei de Lima - publicado em 04/11/19

Desde o início da Igreja, é possível haver diversidade de ritos ou liturgias dentro da unidade católica

Dois pontos debatidos durante o Sínodo sobre a Amazônia foram a inculturação da fé e um rito litúrgico próprio para a região amazônica. Abordemos os temas.

O Cardeal Kurt Koch, presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, disse que, ao se falar em inculturação na Amazônia, deve-se lembrar também da necessidade de purificação dos elementos que não são bons nas culturas. Afirma ele: “Tenho a impressão de que durante este Sínodo os bispos falaram principalmente sobre inculturação e não muito sobre purificação. Eu perguntei sobre isso também no meu grupo (círculo menor), quais são os elementos que precisamos purificar, e não recebi uma resposta clara”. 

Isso é sério. Afinal, segundo o mesmo Cardeal, “a evangelização sempre precisa de inculturação, porque o Evangelho deve ser entendido em diferentes culturas”, mas “temos de considerar duas coisas: primeiro de tudo, a inculturação e, por outro lado, a purificação da cultura, porque nem todas as coisas em outras culturas são boas”.E continua: “Temos diferentes desafios e distintos problemas, e estes precisam passar por um claro discernimento de espírito sobre o que podemos aceitar e receber dessas culturas para uma melhor compreensão do Evangelho” (A inculturação exige a purificação das culturas, afirma Cardeal. ACI Digital, 24/10/19, online).

A tese do Cardeal Koch faz eco ao Documento Fé e inculturação, da Comissão Teológica Internacional (CTI) ligada à Congregação para a Doutrina da Fé, dado à luz em 1988, e a um livro de Dom João Evangelista Martins Terra, SJ, Bispo auxiliar emérito da Arquidiocese de Brasília (DF), ao escrever, de modo muito claro, o que segue: “Inculturação é um neologismo cunhado na década de 1970 para expressar a penetração do Evangelho e da fé no interior das diferentes culturas. É a encarnação da fé e da Igreja numa determinada cultura. A inculturação do Evangelho não destrói a cultura do povo evangelizado, antes a depura de imperfeições respeitando todas as características que lhe dão identidade. Desse modo, a pluralidade cultural não está em contradição com a unidade da Igreja, mas é expressão de sua verdadeira catolicidade. A mensagem cristã deve encontrar suas raízes nas culturas humanas, mas deve também transformar essas culturas. Sendo uma realidade viva, nenhuma cultura é fossilizada, mas passa por uma constante renovação. Há uma constante endocultuação ou evolução no interior das culturas” (Catequese de índios e negros no Brasil colonial. Aparecida: Santuário, 2000, p. 38).

Mais: embora a inculturação seja importante, “não podemos, no entanto, esquecer a transcendência do Evangelho em relação a todas as culturas humanas, em que a fé cristã está vocacionada a enraizar-se e a desenvolver-se com todas as suas virtualidades. Por muito grande que deva ser o respeito por tudo o que é verdadeiro e santo na herança cultural de um povo, esta atitude não vai até à exigência de conferir um caráter absoluto a essa herança cultural. Ninguém pode esquecer que, desde a origem, o Evangelho foi ‘escândalo para os judeus e loucura para os pagãos’ (1Cor 1,23). A inculturação que busca a via do diálogo entre as religiões nunca poderá apadrinhar o sincretismo” (CTI. Fé e inculturação, 1988, cap. III, n. 14). Em suma, a Igreja há de aceitar – e, de fato, aceita – bons elementos de cada cultura, mas deve purificá-la dos menos bons ou mesmo maus sem concessões sincretistas (mistura de doutrinas opostas: por exemplo, o monoteísmo cristão e o politeísmo pagão), dado que isso seria a negação do Evangelho ou a apostasia (cf. Catecismo da Igreja Católica n. 2089).

Quanto a um novo rito litúrgico, Dom Oswald Gracias, Cardeal Arcebispo de Bombay, acredita ser importante “inculturar métodos de formação nos seminários e sustenta que não vê nenhuma dificuldade em existir um rito litúrgico com elementos da cultura amazônica” (El cardenal Stella alaba el celibato, y él y el cardenal Gracias ven posible un rito amazónico. Religion en Libertad, 25/10/19, online). Sim, desde o início da Igreja, é possível haver diversidade de ritos ou liturgias dentro da unidade católica. É preciso, por certo, redobrada vigilância para não existir nisso, em vez de edificação, escândalo do Povo de Deus em sua sede inata do Eterno.

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