Inauguração do Ano Judiciário do Tribunal Apostólico da Rota RomanaO Papa recebeu em audiência na manhã deste sábado (25), no Vaticano, cerca de 350 pessoas para a inauguração do Ano Judiciário do Tribunal Apostólico da Rota Romana. No encontro, promovido todos os anos com o Pontífice, Francisco falou de casais evangelizadores, em movimento e em escuta ao Espírito Santo, mestres de proximidade e gratuidade.
Ao se dirigir a juízes, oficiais, advogados e colaboradores, o Papa apresentou Áquila e Priscila, descritos nos Atos dos Apóstolos, como um modelo santo de vida conjugal.
“É aquilo que precisariam as nossas paróquias, sobretudo nas áreas urbanas nas quais o pároco e os seus colaboradores clérigos jamais poderão ter tempo e força para alcançar fiéis que, mesmo se declarando cristãos, permanecem ausentes da frequência dos sacramentos e desconhecidos – ou quase – do conhecimento de Cristo.”
Áquila e Priscila, afirmou o Papa, “evangelizavam sendo mestres da paixão pelo Senhor e pelo Evangelho”, uma paixão do coração que não se traduz em palavras vazias, mas em gestos concretos de proximidade aos irmãos mais necessitados, de acolhida, de cuidado e gratuidade, referências da Reforma do Processo Matrimonial desejada pelo Pontífice. E é nesse ponto que Bergoglio interpelou os juízes presentes e questionou se, ao julgar, eles têm estado próximos ao coração das pessoas, se têm aberto o coração à gratuidade e também se têm sido tomados por interesses econômicos e comerciais. E Francisco ressaltou: “o juízo de Deus será muito forte sobre isso”.
Não deixar os casais às margens da pastoral cristã para que ela não seja pastoral de elite que esqueça do povo, mas ser pastores que escutam o rebanho, que se colocam ao lado, que aprendem a língua das pessoas e que sejam capazes de apoiar as pessoas durante as noites e nas suas solidões, inquietações e fracassos: é isso que o Papa pediu aos pastores, aos bispos, aos párocos e até aos juízes, de amar, como fez o Apóstolo Paulo, casais de casados missionários disponíveis a alcançar praças e edifícios e cidades onde ainda não penetra a luz de Cristo.
“… casais cristãos que tenham a coragem de sacudir o sono, como fizeram Áquila e Priscila, capazes de serem agentes, não digamos em modo autônomo, mas carregados de coragem até o ponto de acordar do torpor e do sono os pastores, talvez muito parados ou bloqueados pela filosofia do pequeno círculo dos perfeitos. O Senhor veio buscar os pecadores, não os perfeitos.”
Aos pastores, entregou também a tarefa de iluminar e guiar os santos casais cristãos, de dar a eles visibilidade, de mostrar uma nova capacidade ao viver o matrimônio e de tutelar para que não caiam na rede das ideologias, que minam a solidez do sacramento.
“É preciso vigiar para que não caiam no perigo do particularismo, escolhendo de viver em grupos selecionados; ao contrário, é preciso se abrir à universalidade da salvação. De fato, se somos gratos a Deus pela presença da Igreja, de movimentos e associações que não descuidam da formação de casais cristãos, por outro lado se deve com força afirmar que a paróquia é, por si, o lugar eclesial do anúncio e do testemunho porque é naquele contexto territorial que já vivem casais cristãos, dignos de iluminar, os quais podem ser testemunhas ativas da beleza e do amor conjugal e familiar.”
Hoje o mundo precisa de casais de cônjuges em movimento, insistiu o Papa, retornando, porém, idealmente às raízes do cristianismo, lá onde a Igreja “foi despojada de todo poder humano, foi pobre, foi humilde, foi oprimida, foi heroica” e restabelecendo a primazia do Espírito Santo, verdadeiro autor e motor da evangelização que, se não invocado, permanece desconhecido e ausente.
O Papa, concretamente, exorou a viver as próprias paróquias como um “território jurídico-salvador”, casa entre as casas, família das famílias, Igreja pobre para os pobres, rede de casais entusiastas e enamorados pelo Ressuscitado, como Áquila e Priscila, capazes de uma nova revolução da ternura e do amor, jamais apagados, jamais cansados.
“Devemos estar convictos, e gostaria de dizer, seguros, que na Igreja, semelhantes casais de cônjuges são já um dom de Deus e não por nosso mérito: pelo fato que são fruto da ação do Espírito, que jamais abandona a Igreja. Melhor, o Espírito espera o ardor por parte dos pastores para que não seja apagada a luz que esses casais difundem nas periferias do mundo.”
O Papa concluiu dizendo que, de Áquila e Priscila, se destaca ainda o testemunho e não o proselitismo, porque a Igreja não é e não pode ser feita de poucos. Por isso, o chamado final de Francisco:
“Queridos juízes da Rota Romana, o escuro da fé ou o deserto da fé que as decisões de vocês que já há 20 anos denunciam como possível circunstância causal da nulidade do consenso oferecem a mim, como já ao meu predecessor Papa Bento XVI, o motivo de um grave e urgente convite aos filhos da Igreja na época que vivemos, a se sentir todos e individualmente chamados a entregar ao futuro a beleza da família cristã. A Igreja precisa de casais de cônjuges como Áquila e Priscila, que falem e vivam com a autoridade do Batismo, que não consiste em comandar e se fazer ouvir, mas no ser coerentes, testemunhas e, por isso, companheiros de estrada na vida do Senhor.”
Na saudação ao Pontífice, o Decano da Rota, dom Pio Vito Pinto, falou da “dependência fiel e amorosa do Espírito Santo” tanto para os trabalhos do dicastério como caracterizante do próprio Pontificado de Francisco, para socorrer a família cristã, que permanece “a coluna evangélica, o próprio coração da Igreja”.
Longe de cair no “pessimismo pastoral”, o Decano também compartilhou com o Papa a gratidão dos tribunais diocesanos e muitos casais casados manifestada pela “reforma do processo matrimonial” que, apesar de inevitáveis dificuldades, tem alcançado os fiéis “como uma esperança inesperada”. Além disso, disse que as decisões da Rota Romana tem trabalhado com mais agilidade, oferecendo “solicitude pastoral e rápida resposta”.