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A dolorosa trajetória recente do país mais católico do mundo depois do Vaticano

Timor-Leste

José Fernando Real | CC BY-SA 4.0

Ray Cavanaugh - Reportagem local - publicado em 26/02/20

98% da população: a ilha que abraçou em peso a fé católica em pleno século XX, no meio de muito sofrimento

Surgiram notícias, recentemente, de que o Papa Francisco poderia visitar ainda este ano o Timor-Leste, como parte de uma viagem apostólica que abrangeria também a Indonésia e Papua Nova Guiné.

Breve história de um país sofrido

O país tem esse nome porque ocupa a porção leste da ilha de Timor, no Sudeste Asiático. O restante da ilha pertence à Indonésia.

Timor-Leste se declarou independente em 28 de novembro de 1975, mas, nove dias depois, foi invadido pela Indonésia. Começaram décadas de conflito entre milícias locais e o exército indonésio. Muitos não combatentes, incluindo mulheres e crianças, foram mortos violentamente nas ruas ou foram presos e acabaram “desaparecidos”.

Em agosto de 1999, mediante referendo de independência supervisionado pela ONU, cerca de 80% dos eleitores de Timor-Leste reiteraram a vontade da população de se separar da Indonésia. Imediatamente após a votação histórica, um grupo local contrário à independência empreendeu uma contra-ofensiva apoiada pela Indonésia, massacrando em poucas semanas cerca de 1.400 pessoas, entre as quais padres e freiras, além de incendiarem aldeias inteiras e praticamente destruírem a infraestrutura já precária do país, incluindo suas escolas.

A formalização da independência passou pela eleição do independentista Xanana Gusmão, em abril de 2001, como o novo presidente de Timor-Leste. Finalmente, em 20 de maio de 2002, o país foi reconhecido como independente de fato.

O catolicismo timorense

A nação tem hoje cerca de 1,4 milhão de habitantes, dos quais 98% são católicos: trata-se da maior proporção de católicos em todo o mundo, depois do Vaticano.

O catolicismo chegou à ilha no início dos anos 1500 com os portugueses, que colonizaram o território. A língua portuguesa, aliás, continua sendo uma das duas oficiais do país, junto com o tétum, idioma da família linguística austronésia.

A história timorense é marcada pela magnitude do sofrimento de grande parte da sua população, especialmente no final do século XX, quando quase um terço dos habitantes morreu em decorrência da violência, das doenças ou da fome.

Quando a carnificina indonésia começou, nos anos 1970, só 20% dos timorenses eram católicos. Em meio à violência prolongada, porém, muitos não-católicos recorreram às igrejas como locais de refúgio físico e, aos poucos, também espiritual.

Os clérigos católicos protestavam abertamente contra os atropelos aos direitos humanos e muitos prestavam assistência direta aos combatentes pró-independência. À frente do clero que apoiava os timorenses estava o bispo dom Carlos Ximenes Belo, cuja coragem e autoridade moral o levaram a ganhar o Prêmio Nobel da Paz em 1996. Ele o compartilhou com José Ramos-Horta, que serviu em momentos diferentes como presidente e primeiro ministro do país.

Além de dom Belo, o Papa São João Paulo II é outro herói católico de Timor-Leste. Ele atraiu a atenção internacional para a luta do país quando visitou a capital, Díli, em outubro de 1989. A tensão foi tamanha durante a visita que, enquanto o Papa celebrava a missa ao ar livre, manifestantes timorenses e policiais indonésios entraram em conflito atirando-se cadeiras e paus.

Esse episódio de violência, porém, não se compara ao ocorrido dois anos depois, em 12 de novembro de 1991, quando 250 civis desarmados foram mortos a tiros pelas forças de segurança indonésias durante uma procissão fúnebre no cemitério de Santa Cruz de Díli.

Cinegrafistas estrangeiros conseguiram captar imagens em vídeo daquele massacre. As imagens aparecem no documentário In Cold Blood: The Massacre of East Timor [A Sangue Frio: o Massacre de Timor-Leste], que ajudou a aumentar a indignação internacional pela ocupação militar que muitos passaram a considerar um genocídio.

Cenário social ainda crítico

Em decorrência da trajetória de violência e destruição da infraestrutura, Timor-Leste ainda apresenta indicadores precários no tocante ao desenvolvimento. As taxas de analfabetismo têm diminuído notavelmente, mas permanecem muito altas para o século XXI: estimativas indicam que mais da metade das mulheres são analfabetas e que a maioria da população, incluindo homens e mulheres, nunca leu um jornal.

Dois terços do povo timorense vive em pequenas aldeias geograficamente isoladas. Metade da nação vive em extrema pobreza, com menos de 1,90 dólar por dia, e metade das crianças menores de 5 anos sofrem de desnutrição.

Timor-Leste continua a ter muitas dificuldades na criação de emprego para os cidadãos mais jovens. Muitos, principalmente nas áreas urbanas, se tornam alvo de gangues. Apesar da criminalidade, porém, a situação não se compara ao caos vivido nos últimos anos do século XX e no começo do século atual, durante as lutas pela independência.

A fé católica, enquanto isto, se mostra sólida. Em vez dos seminários fechados por falta de candidatos, como se vê no Ocidente, o “problema” oposto ocorre em Timor-Leste: há centenas de aspirantes a seminaristas sendo rejeitados por falta de vagas, antes mesmo de se iniciar o processo de discernimento vocacional.

Uma visita do Papa poderia atrair mais atenção mundial a esse país jovem e subdesenvolvido, que ainda tenta se recuperar da carnificina recente.


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