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Asia Bibi fala com Aleteia: “perdoei aqueles que me condenaram”

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Agnès Pinard Legry - publicado em 28/02/20
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Condenada à morte por blasfêmia no Paquistão, Asia Bibi passou dez anos na prisão antes de ser absolvida. Excepcionalmente passando por Paris, ela concedeu uma entrevista à AleteiaSeu nome foi escrito, pronunciado e entoado milhares de vezes nos últimos anos. Sua história, contada pelos quatro cantos do planeta.

Asia Bibi se tornou um símbolo: o da luta contra a lei antiblasfêmia no Paquistão. Condenada à morte por ter bebido a mesma água que as mulheres muçulmanas, ela teve que passar dez anos na prisão antes de ser absolvida.

E aqui está ela, Asia Bibi. Mãe paquistanesa e mulher cristã, uma mulher pequena, mas de uma força incrível, de grande resiliência e com profunda fé.

Desde sua partida do Paquistão, pouca informação vazou sobre sua nova vida, com exceção de seu país anfitrião, o Canadá. E então um dia, a notícia chega: Asia Bibi está visitando a França.

Em Paris, ela concede entrevistas e participa de reuniões oficiais. Foi recebida pela prefeita de Paris, Anne Hidalgo, que a nomeou cidadã de honra da cidade. Nesta sexta-feira, ela se encontraria com o presidente Emmanuel Macron.

Asia Bibi ainda está se recuperando das consequências de sua prisão. No entanto, apesar do cansaço, ele sorri. Embora suas respostas sejam breves e às vezes lacônicas, seu rosto gentil e caloroso e seu olhar profundo atestam o caminho que ela percorreu: longos anos de solidão e, talvez, desânimo.

Mas ela também transmite sua fé, com confiança e simplicidade. Graças a um intérprete Franco-Urdu (a língua falada no Paquistão), a Aleteia conversou com Asia Bibi.

– Asia Bibi, qual é a sua história?

Você deve conhecer minha história. Mas até hoje parece irreal. Cristã e mãe de uma família, meu trabalho era, entre outros, colher como trabalhadora agrícola.

Do dia 14 de junho de 2009, ainda me lembro do calor que estava, então bebi água do poço no mesmo recipiente que as outras mulheres. Duas delas me acusaram de ter manchado a água por ser cristã. Alguns dias depois, fui acusado de blasfêmia.

Então, fui julgada e condenada à morte por blasfêmia em novembro de 2009. Em outubro de 2014, o Supremo Tribunal de Lahore confirmou minha condenação.

Eu mantive Deus em meu coração. E rezei todos os dias.

– O que passou na sua mente quando soube da sua condenação?

Meus filhos. Eles eram muito pequenos na época e eu senti uma enorme pena. Por dentro, eu repetia que aquilo tudo não era possível, que eu não havia feito nada.

– Uma vez condenada, você passou dez anos na prisão. Como era a sua vida diária?

Eu estava muito isolada e fiz o possível para ficar extremamente silenciosa. Mas, acima de tudo, a cada momento eu mantive Deus em meu coração.

– O que a impediu de afundar?

Eu vivi isso como um teste enviado por Deus. Quando um ser humano é posto à prova, o desejo de vencer, de superar o transe, é extremamente forte. Eu sabia que a oração me ajudaria nesse sentido. E havia muitos sinais que também me incentivavam.

Por exemplo, uma noite sonhei que um padre me fazia recitar versículos da Bíblia. Quando abri os olhos, lembro-me de me surpreender por não vê-lo. Eu disse a mim mesma que talvez tenha sido Deus quem me enviou um sinal para tentar aprender aqueles versículos que seriam meu apoio. E foi isso que eu fiz. Eu leio os Evangelhos com muita regularidade.

– Alguma passagem da Bíblia te trouxe um apoio específico?

Sim, as palavras que me vieram sem parar foram: “O Senhor é o seu refúgio”. Em cada ocasião, era o primeiro salmo que me vinha à mente.

– Seu marido, Ashiq, também tem sido um apoio fiel.

Sim, ele tem sido um pilar para mim durante todos esses anos. Ele nunca me abandonou, apesar das ameaças e dificuldades que sofreu. Foi ele quem me informou que uma jornalista, Anne-Isabelle Tollet, fora a primeira a levantar a voz em meu nome. Foi ele quem me disse que havia muitas pessoas interessadas no meu caso.

Foi ele quem me informou que o Papa rezava por mim. Lembro-me de sentir uma alegria intensa! Nossos filhos eram a maior parte de nossas conversas. Por causa das ameaças que pesavam sobre eles, eu não os via com frequência. Pedi a Ashiq que não os tirasse da escola.

– Você finalmente recebeu a absolvição no outono de 2019, mas uma onda sem precedentes de manifestações a impediu de deixar o país naquele momento. O que você sentiu diante dessa avalanche de ódio?

Minha libertação exacerbou as tensões de uma maneira terrível. Mas a parte mais difícil era que eu podia ouvi-los. Eu ouvi tudo o que eles disseram. Eu podia ouvi-los cantando minha morte. Por todos os meios. No entanto, por incrível que pareça, retive minhas forças. Eu nunca tive medo.

– Você perdoou aqueles que a condenaram?

Sim, eu os perdoei. Perdoei aqueles dez anos de prisão longe da minha família. Do fundo do meu coração, eu perdoei.

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Aleteia

– Na cela que você ocupou por dez anos hoje está uma cristã, Shagufta Kousar, condenada à morte após uma acusação de blasfêmia.

Ela tem todo o meu apoio e, se minha história e meu testemunho puderem ser úteis, ficarei muito feliz. Shagufta Kausar também é mãe e foi acusada pelo marido de ter enviado mensagens blasfemas via SMS. Uma acusação completamente improvável, considerando que eles não sabem escrever. Mas sei que eles estão em boas mãos: Saif-ul-Malook, o mesmo advogado que me defendeu, é quem os representa.

Além de Shagufta, existem as outras mulheres e homens que ainda estão detidos hoje e que precisam ser ajudados. Eu gostaria que o mundo se unisse por essa causa para obter sua libertação, quer eles pertençam a minorias ou à maioria. Todos devem ser ouvidos. Hoje é minha luta: acredito que a lei antiblasfêmia deve ser reformada. Para isso, desejo dedicar minha vida daqui em diante.

– Você acaba de receber a cidadania honorária da cidade de Paris e também expressou o desejo de solicitar asilo político a Emmanuel Macron. Por que a França?

Eu amo a França porque foi da França que se falou em meu nome para me defender. Foi a França que ajudou a devolver minha identidade.

– Como você contempla o futuro?

Eu gostaria que todos pudéssemos trabalhar de mãos dadas para reformar a lei antiblasfêmia do Paquistão. No que diz respeito ao meu futuro pessoal, meu desejo mais ardente é que minhas filhas possam ter acesso à instrução, que possam crescer em um ambiente educado e que possam lutar pela igualdade.

– Você se sente livre?

Ainda estou recebendo ameaças, mas sim, estou livre.

– O que mais te entristece hoje?

Senti uma dor imensa quando tive que deixar o Paquistão, o país onde nasci. Foi depois da minha libertação e sei que Deus me mostrou o caminho. Mas ainda me apego firmemente à esperança de que um dia possa voltar à minha terra.

– E por outro lado, o que lhe traz mais alegria hoje?

Sinto a maior alegria quando me curvo diante da grandeza de Deus.