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Por que Deus permite os flagelos?

KORONAWIRUS
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Padre Paulo Ricardo - publicado em 23/03/20
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Que resposta de fé devem dar os cristãos em momentos que nos colocam diante da nossa impotência e fragilidade?De uma inquietação e de um mistério se compõe hoje o nosso Evangelho (cf. Jo 9, 1-41). A inquietação a ouvimos na pergunta que a Cristo fazem os discípulos: “Mestre, quem pecou para que nascesse cego?” O mistério o temos velado na resposta que lhes dá o Senhor: “Nem ele nem seus pais pecaram”. Supõe e manifesta a pergunta dos Apóstolos que há no mundo diversos gêneros de mal como a cegueira: “Quem pecou para que nascesse cego?” E revela sem muitos detalhes a resposta de Cristo que nem sempre se devem os males ao pecado dos homens: “Nem ele nem seus pais pecaram”, mas aos desígnios por que Deus os permite: “Isso serve para que as obras de Deus se manifestem nele”.

A mesma pergunta é o que nos inquieta hoje, vendo como vemos o mundo flagelado por uma nova peste, e o mesmo mistério, para deste flagelo fazermos cicatrizes, é o que queremos desvelar até onde alcança a inteligência, seguindo para isso a que foi mais elevada pela fé: Santo Tomás de Aquino. Comentando pois o Doutor Angélico esse nosso Evangelho (cf. Super Io., c. 9, l. 1), diz que há cinco razões por que Deus costuma permitir os sofrimentos e males da natureza, como é o caso dessa pandemia:

1.ª Às vezes, permite Deus que haja sofrimentos para manifestar a sua glória. É o que fez com o cego de nascença, que padeceu por anos dessa privação para que, uma vez curado, gerações inteiras dali para frente se curassem da cegueira da incredulidade. “Isso serve para que as obras de Deus” (isto é, os milagres físicos, signos dos mistérios da graça) “se manifestem nele”. Do sofrimento, portanto, pode Deus tomar ocasião para obrar milagrosamente, em favor tanto do que sofre quanto dos que hão de tirar proveito do milagre, crendo e convertendo-se.

2.ª Às vezes, permite Deus que haja sofrimentos para exercitar-nos na virtude, como diz S. Paulo: “É na fraqueza que se revela totalmente a minha força” (2Cor 12, 9), e S. Tiago: “É preciso que a paciência efetue a sua obra” (Tg 1, 4). Com a dor, prova Deus a quem sofre pela paciência, pela resignação, pelo silêncio, pelo abandono, pela esperança. Mas prova também a quem não sofre fazendo ver sofrer a quem ama, convidando à generosidade, dando ocasião às obras de misericórdia, impondo a necessidade da ascese. Do sofrimento, portanto, pode Deus tirar partido para dele sairmos os santos que sem ele talvez não seríamos.

3.ª Às vezes, permite Deus que haja sofrimentos para prevenir pecados futuros, como de si mesmo reconhecia o Apóstolo: “Para que a grandeza das revelações não me levasse ao orgulho, foi-me dado um espinho na carne, um anjo de Satanás para me esbofetear e me livrar do perigo da vaidade” (2Cor 12, 7). Há dores, com efeito, que são necessárias à cura, há perdas que afiançam melhores ganhos e há sofrimentos, se bem sofridos, que preservam de outros maiores. Deus a todo instante vela sobre nós, e tem sempre a postos o anjo da dor, preparado para nos espezinhar a carne se for isto necessário ao nosso bem. Do sofrimento, portanto, pode Deus fazer um instrumento para que, prostrados agora, não nos despenhemos mais tarde.

4.ª Às vezes, permite Deus que haja sofrimentos para emenda de pecados passados. De fato, todos temos a Deus muito ofendido pela nossa desobediência, e nada é mais justo do que reparar, com o nosso sofrimento, a ordem da divina justiça e purificar, com a penitência em que o devemos transformar, a nossa vontade, tão apegada às criaturas, embora chamada a possuir aquele bem infinito que só em Deus se pode encontrar. Do sofrimento, portanto, quer Deus se servir para reparar todas as vezes que deixamos de O servir a Ele, fazendo-nos servos do nosso egoísmo.

5.ª Às vezes, porém, permite Deus que haja sofrimentos em sinal da condenação futura, segundo aquilo de Jeremias: “Esmagai-os com dupla desgraça” (Jer 17, 18). Do mesmo mal com que procura o bem de seus predestinados, pode Deus já neste tempo começar a retribuição eterna dos precitos, como vemos no caso de Herodes Agripa. Permitiu o Senhor que morresse às mãos do tirano o Apóstolo Tiago, e por este e outros crimes começou já nesta vida a anunciar o inferno que esperava o impenitente terarca: “No mesmo ins­tante, o anjo do Senhor o feriu, por ele não haver dado honra a Deus. E, roído de vermes, expirou” (At 12, 23).

Destas cinco razões nem a última nos deve desesperar, porque para muitos ainda é tempo de converter-se, nem a primeira nos deve dar falsas esperanças, porque Deus, se pode com um milagre acabar com a peste, pode com não menor providência preservá-la para bens maiores do que tamanho mal. É por isso que, destas cinco razões, as que mais nos importam são as outras três. Num extremo de amor, quis Deus que se abatesse sobre nós essa pandemia, e a resposta mais cristã, e por isso a mais sensata que lhe podemos dar é:

a) Pôr todo o nosso empenho no exercício das virtudes, especialmente das que são mais necessárias em tais circunstâncias: a paciência; a devoção em todas as formas que admite a prática doméstica da nossa fé (a récita do Rosário, a leitura da Escritura, de vidas de santos, de livros espirituais etc.); os cuidados que recomenda a prudência, para evitarmos o contágio e não expormos nossos idosos e enfermos; a oração pelos contagiados, pelos falecidos, pelos que têm de suportar sem fé nem esperança em Deus o peso dessas moléstias etc.

b) Encarar com seriedade os riscos da doença, vendo-a como uma ocasião oportuna para meditar sobre a morte, que nos pode surpreender a todos; a fragilidade da nossa existência, de duração tão incerta; e a vaidade de tantos projetos e sonhos, que se desfazem como o pó de que somos feitos e ao qual hemos de tornar um dia.

c) E viver com espírito de mortificação estes tempos, aproveitando todos os sofrimentos, pequenos e grandes, que Deus nos enviar, para assim purificarmos nossa alma, pagarmos nossa pena temporal, aumentarmos nossa glória no céu e, unidos ao sacrifício redentor de Cristo, expiarmos os pecados dos que não creem, não adoram, não esperam e não O amam: “Meu Deus, é por vosso amor!”

(Padre Paulo Ricardo)



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