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O amor que nos faz cuidar

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A12 - publicado em 14/04/20
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Mesmo quem nunca amou deseja ser profundamente amado, e a falta do amor é capaz de fazer alguém assumir as atitudes mais desumanasEm uma de suas belas páginas na Primeira Carta aos Coríntios 13,1-13, São Paulo escreve o hino ao amor, cuja mensagem é “sem amor nada somos”. Em Cânticos, encontramos “o amor é tão forte quanto a morte” (Ct 8,6).

Em breves palavras, o autor condensa a força arrebatadora do amor como aquela da morte, a que reduz o ser humano à sua finitude física. Portanto, aí está a intensidade de algo tão humano e imprescindível à vida, cuja ausência é capaz de deixar sequelas profundas no percurso existencial de uma pessoa.

Na absurdidade do mistério humano, mesmo quem nunca amou deseja ser profundamente amado e essa falta é capaz de fazer alguém assumir as atitudes mais desumanas. E quem o rejeita é porque sente-se ameaçado em próprio narcisismo e insegurança.

Quem não ama, não se deixa amar e não compartilha o amor em atitudes de vida em relação aos outros experimenta solidão e infelicidade em seus dias. Quem ama vive e dá vida aos demais! Não o foi assim com Jesus de Nazaré e tantos homens e mulheres ao longo da história, continuando até os dias hodiernos? Enquanto houver amor a humanidade, com suas luzes e sombras, avançará. Se perdê-lo, entrará em colapso

Nos momentos mais obscuros da humanidade sempre surgem pessoas que, por sua capacidade de amar, transformam a realidade. Isso se faz visível nos últimos tempos, quando milhares de pessoas, homens, mulheres, idosos, crianças, ricos, pobres encontram formas criativas de solidariedade para aliviar a dor de quem sofre. Essas nobres atitudes transformam o mundo, geram humanidade e nos fazem acreditar que há uma esperança para o mundo, um futuro no qual o ser humano possa recuperar a sua capacidade de cuidar do seu próximo e do mundo onde vive.

O que dizer de tantos pais e mães que dão a vida para os seus filhos? De pessoas simples que doam o pouco que tem em favor de outras? De indivíduos que, em seus trabalhos, entregam a vida para a transformação do semelhante e do mundo? De quem dá a própria vida pelo outro? De desconhecidos que fazem o bem sem nenhum interesse? A história está cheia desses exemplos, mas que passam anônimos, pois o amor e o bem não figuram nas estatísticas da sociedade de consumo, do bem-estar e do lucro, pois é pura gratuidade e transcende condição social, cultura, sexualidade, religião, etc.

O amor nos coloca na pele do outro e desperta a compaixão, algo presente nas entranhas, nas vísceras, nas profundezas de nossa alma, permeia nosso corpo e nos faz correr riscos. Quem ama deixa as suas seguranças, seus interesses e se coloca a caminho do encontro do outro, mesmo desconhecido. É esse encontro que se materializa em forma de reconhecimento, acolhida, bondade, generosidade, gratuidade cuidado e salvação. Quem ama salva e se salva!

Paulo conclui seu hino afirmando: “agora, portanto, permanecem fé, esperança, amor, essas três coisas; mas a maior delas é o amor” (1Cor 13,13). Em seu sentido profundo, o amor comporta um ato de fé e a paciência esperançosa, e isso faz mover o coração e atitudes humanas em relação ao semelhante. Será que não é isso que nos falta nesta era da História: recuperar a dimensão da fé como horizonte antropológico e transcendental e a paciência esperançosa, enquanto possibilidade de sentido do que realizamos e podemos realizar, enquanto seres criativos e capazes de amar?

Qual o aprendizado das experiências concretas, significativas e cotidianas do amor para nós enquanto pessoa e sociedade? Talvez neste arco da História, estamos experimentando o autoabandono de si e do outro sem nos darmos conta que que estamos fazendo mal a nós mesmos, descuidando-nos. E só o amor é capaz de nos resgatar dessa condição e resgatar o que há de mais belo no humano: doar-se ao outro, cuidar dele. Sem o amor nada somos!

Por Padre Rogério Gomes, via A12