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Me programei para ver minha mãe 

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ANN IN THE UK

Octavio Messias - publicado em 27/04/20

Encontro no Dia das Mães me exigiu planejamento 

Um aspecto do distanciamento social que me tem sido particularmente duro tem sido lidar com as restrições necessárias para minimizar os riscos à saúde da minha mãe. Ela está duplamente enquadrada no grupo de risco: tem mais de 60 anos e tem a capacidade pulmonar reduzida a cerca de 60%. Me aterroriza a possibilidade dela se contaminar, ainda mais que eventualmente se contamine comigo, pois na ausência de testes disponíveis, posso muito bem ter sido infectado pelo novo coronavírus e não saber.

Também preciso garantir que ela esteja protegida de agentes externos. Temo que ela vá ao mercado, que receba o entregador da farmácia, que não higienize os produtos e sacolas que precisam entrar em sua casa para garantir sua sobrevivência. Acho improvável que exista um método 100% seguro, no entanto logo que a pandemia chegou ao país e os riscos se tornaram conhecidos, bolei uma estratégia para reduzir ao máximo a probabilidade de que ela entre em contato com o vírus. 

Como mora sozinha em uma casa em Santana do Parnaíba, município a 40 quilômetros de São Paulo, onde nasci e ainda vivo, já temos uma estrutura apropriada para o “isolamento”, como se fosse possível alguém sobreviver, de fato, isolado. Programei uma rotina na qual informo minha mãe diariamente dos cuidados mais recentes recomendados pelos órgãos especializados, como usar luvas, máscara, higienizar os produtos e suas embalagens. Também me encarreguei de lhe levar suprimentos, incluindo todas as compras do supermercado, eventuais medicamentos, e até tabaco, que ela gosta de fumar enrolado no papel vegetal. 

Até o momento, se ela está me informando abertamente todos dos provimentos que lhe abastecem,  por enquanto foi necessário apenas um carregamento, no final de semana passado, quando entrávamos na quinta semana de quarentena. Fiz todas as compras, enchi o porta-malas e fiz a entrega no sábado, dia 18. 

Chegando lá, ela me pediu que pegasse água em uma bica perto de sua casa, o que prontamente fiz, tomando todos os cuidados para que nem minhas mãos nem os galões tocassem as torneiras ou qualquer outra superfície que pudesse estar contaminada. 

Deixei todos os itens na entrada da garagem e supliquei que ela os esterilizasse, usando luvas, antes de guardar na despensa ou na geladeira. E que depois passasse álcool sobre a superfície onde manuseasse os produtos. O mais difícil, no entanto, foi ter de vê-la a uma distância segura, sem poder beijar nem abraçar. Percebi que ela também ficou abalada com isso. 

É nítido para mim como isso tem sido talvez até mais difícil para ela.  Nas vezes em que falamos por vídeo-chamada, sempre me pareceu abatida, sofrendo com a carência, esse sentimento do qual nenhum de nós consegue escapar na falta de contato com outras pessoas. 

Tanto que decidi passar o Dia das Mães com ela. Me programei para não precisar sair da minha casa para absolutamente nada. Ontem, sábado, dia 25, fui ao mercado, passei na farmácia, e estoquei todos os alimentos, itens de limpeza e higiene pessoal de que precisarei pelos próximos 15 dias. 

Assim, mesmo na hipótese de eu ser um portador assintomático do vírus, será tempo suficiente para eu me imunizar e, no domingo de Dia das Mães, chegar na casa dela a tempo para o almoço. Antes só pretendo passar na banca de flores. Usando máscara e luvas, claro.   

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