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Racismo é uma doença social e espiritual que mata pessoas

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EVA MARIE UZCATEGUI | AFP

Reportagem local - publicado em 10/06/20

Cardeal de Boston aponta o antídoto para o veneno do racismo: a comunidade e a solidariedade

O cardeal Sean O’Malley, OFM, arcebispo de Boston, divulgou nessa semana um artigo sobre o racismo e os protestos decorrentes do assassinato de George Floyd nos EUA. Eis a íntegra do texto do cardeal O’Malley:

* * *

Queridos amados em Cristo,

Por quatrocentos e um anos, esta terra, que se tornaria os Estados Unidos da América, teve que lidar com um câncer moral e maligno que é o racismo.

Quando a palavra racismo é invocada, ela é frequentemente identificada em termos pessoais: Alguém cujas atitudes, convicções e ações têm como alvo um grupo de outros indivíduos devido a cor.

Este é um significado válido, mas apenas parcial do termo. Desde pessoas como Fredrick Douglas e Harriet Tubman até líderes contemporâneos, pensadores e ativistas, os afro-americanos tentaram consistentemente expandir o entendimento geral do racismo.

Em palavras e ações, eles apontaram para a realidade do racismo sistêmico e estrutural. O racismo e a escravidão encontram um elo comum neste país, a negação da humanidade e a dignidade de outras pessoas.

Como nação, abolimos a escravidão legalmente, mas não lidamos com seu legado duradouro. Se rejeitarmos a escravidão, devemos rejeitar e denunciar as atitudes desumanas que promovem a discriminação, a desigualdade e a violência.

O racismo pode ser explícito, mas também pode ser ignorado e não reconhecido. No entanto, todas as suas manifestações são mortais e corrosivas para a sociedade civil.

Assim como o COVID-19, o racismo pode infectar qualquer pessoa, independentemente da região, religião, raça ou etnia; ele é altamente contagioso, facilmente transmitível à outras pessoas, e muitas vezes invisível e disfarçado naquelas outras aparentemente saudáveis.

O racismo é uma doença social e espiritual que mata pessoas. O assassinato de George Floyd, um cidadão afro-americano, nas mãos de quatro policiais desonestos foi tragicamente bastante familiar para a comunidade afroamericana.

Durante toda nossa vida, convivemos com a realidade do Livro Verde dos Viajantes Negros (the Negro Travelers Green Book), identificando locais onde os afro-americanos se firmam e permanecem em nosso país com menor probabilidade de serem atacados.

Vimos o linchamento brutal da Klu Klux Klan de pessoas negras inocentes. Agora testemunhamos novamente uma violência hedionda perpetrada por alguns, aqueles no quais foram confiados o dever de proteger.

A morte de George Floyd deixa claro que premissas e atitudes racistas, muitas vezes implícitas, são tecidas através de estruturas básicas – políticas, jurídicas, econômicas, culturais e religiosas – nos Estados Unidos.

Os primeiros dias do meu sacerdócio foram vividos em Washington, DC, na 16th St., no coração da cidade. Eu estava lá na noite em que o Dr. Martin Luther King Jr. foi assassinado.

A cidade foi incendiada com 700 fogos, tanques foram alinhados nas ruas ao redor da Casa Branca e soldados com baionetas estavam em cada esquina. O assassinato do Dr. King provocou desespero e raiva em toda a comunidade afro-americana nos Estados Unidos.

Desde então, houve avanços importantes e significativos dos direitos civis e a eleição de um presidente afroamericano.

Contudo, saber que cinquenta anos depois quatro policiais teriam o direito de assassinar um homem negro com tal impunidade, deixa claro até onde ainda devemos chegar para alcançar a igualdade racial.

Nas semanas seguintes ao assassinato de Dr. King em 1968, durante a Marcha dos Povos Pobres (Poor People’s March) em Washington, uni-me às pessoas e às famílias da Cidade da Ressurreição (Resurrection City) no Lincoln Memorial; policiais que estavam fora do serviço, em seus dias de folga, atiraram gás lacrimogêneo em nosso acampamento e gritaram para nós palavrões desprezíveis.

Eu não o fiz, e agora não julgamos todos os policiais com base nos atos criminosos e repreensíveis daqueles poucos que traem seus irmãos e irmãs de uniforme.

A grande maioria dos policiais, principalmente em Boston, sob a liderança da Comissão Gross, atuam como socorristas heróicos e altruístas que levam a sério sua missão e enfrentam perigo para proteger os outros.

O antídoto para o veneno do racismo é a comunidade e a solidariedade. Os protestos em resposta ao assassinato de George Floyd, na minha opinião, foram predominantemente pacíficos e focados na necessidade urgente de abordar o racismo como uma realidade sistêmica, cultural e jurídica.

Alguns manifestantes violentos e infiltrados fora da cidade, poucos em número, mas por intenção desproporcionalmente visível, não tinham interesse em justiça, nem muito menos em conquistas.

Como o governador Baker afirmou, eles devem ser punidos legalmente e não devem manchar o significado maior das marchas e manifestações pacíficas que testemunhamos.

Reconhecemos que a Igreja Católica nos Estados Unidos deve enfrentar nossa cumplicidade histórica na escravidão e nossa necessidade de cura racial. No entanto, uma parte importante do legado da fé católica é o nosso ensino social.

A Igreja Católica é uma comunidade de pessoas de todas as cores, nacionalidades e etnias. O ensino moral católico baseia-se no fato de que todas as pessoas – sem considerar raça, religião, etnia ou nacionalidade – são criadas à imagem de Deus.

Este ensino rejeita qualquer forma de racismo, pessoal ou sistêmico. Nossa fé nos chama à liderança para quebrar barreiras e enfrentar a injustiça. Violar a dignidade humana é desonrar a presença de Cristo em cada pessoa.

Daqui para frente, a realidade do racismo em nossa sociedade e o imperativo moral da igualdade e justiça racial devem ser incorporados em nossas escolas, em nossos ensinamentos e em nossas pregações.

Devemos manter os compromissos de igual dignidade e direitos humanos em todas as instituições da nossa sociedade, na política, no direito, na economia, e na educação.

O ensino católico sobre justiça social mede a maneira na qual uma sociedade age de maneira justa ou não. Nosso trabalho não será realizado até que homens, mulheres e crianças afro-americanos sejam tratados igualmente em todos os aspectos da vida nos Estados Unidos.

O assassinato de George Floyd é uma prova dolorosa do que é e tem estado em jogo para os afro-americanos – o fracasso da sociedade em proteger de muitas maneiras suas vidas e as de seus filhos.

Como católicos, somos ensinados a nutrimos e a protegermos a vida desde o seu início até o seu fim natural e cada um dos momentos entre elas.

As manifestações e protestos dos dias de hoje foram pedidos de justiça e expressões dolorosas de profunda dor emocional, das quais não podemos nos afastar.

Eles nos chamam para afirmar o valor inestimável da vida de cada pessoa. Eles nos chamam a redobrar nosso compromisso de promover o respeito e a justiça para todas as pessoas.

Eles nos chamam para apoiar e defender a verdade que as vidas negras são importantes.

Com a certeza de minhas orações contínuas,

Devotamente vosso em Cristo,

Cardeal Sean O’Malley, OFM, Cap.

Arcebispo de Boston




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