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Bispo em Moçambique: “será que é muito pedir paz?”

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Aid to the Church in Need

Fundação AIS - publicado em 27/11/20

Os ataques terroristas do auto-proclamado Estado Islâmico têm causado devastação em toda esta província

Dom Luiz Fernando Lisboa, bispo de Pemba, volta a sublinhar a situação catastrófica em que se encontra a região norte de Moçambique, alvo de sistemáticos ataques de grupos terroristas que já causaram mais de dois mil mortos e mais de 500 mil deslocados.

D. Luiz fala mesmo em guerra. Uma “guerra que já dura há três anos” e que começou, recorda, “com um ataque ao posto policial, depois às aldeias distantes, passando pelas aldeias maiores até chegar ao centro das cidades”. Em três anos, “quatro cidades já foram praticamente esvaziadas”.

Estes ataques – os terroristas reclamam pertencer ao Daesh, os temíveis jihadistas do auto-proclamado Estado Islâmico’ – têm causado uma devastação ímpar em toda esta província. “Mais de meio milhão de pessoas deslocadas precisam de tudo! De alimento, roupa, medicamentos, panelas, precisam de atenção, de um lugar para morar, de tudo. É uma guerra que tem trazido muito sofrimento a todos nós”, afirma o Bispo de Pemba.

“O povo está cansado da guerra…”

A Igreja tem procurado auxiliar estas populações que já viviam com grandes dificuldades e que agora, por causa da violência armada, ficaram mesmo de mãos vazias. D. Luiz Lisboa fala mesmo em fome. “Esse terrorismo tem feito sofrer a nossa população, tem adiado os sonhos de muita gente.

Anualmente já sofríamos de fome em certa época do ano. De há três anos pra cá muita gente não está produzindo. Então a fome será ainda maior. A guerra só tem perdedor, mas os que sofrem mais são os mais pobres.”

Com esta entrevista ao secretariado brasileiro da Fundação AIS, D. Luiz Lisboa associou-se à iniciativa internacional da Ajuda à Igreja que Sofre de denúncia da perseguição aos cristãos no mundo e que decorreu ontem, quarta-feira, dia 25 de Novembro.

Para o Bispo, que agradece a solidariedade internacional para com a situação em Moçambique, o povo de Cabo Delgado está cansado da guerra e quer é o regresso aos dias de paz. “O que o povo moçambicano mais quer é paz. Moçambique já enfrentou duas guerras e, aqui em Cabo Delgado, estamos enfrentando a terceira. O povo está cansado, está sofrendo muito com essa guerra. O povo de Cabo Delgado, de Moçambique quer paz, anseia pela paz. Nós agradecemos essa solidariedade mundial com a nossa situação aqui e iluminar o Cristo Redentor para lembrar todos os nossos mortos, não só os cristãos, mas todos os mortos, dessa guerra e de outras guerras, ajuda-nos a combater a indiferença que muitas vezes está em nós. Nós não podemos ser indiferentes ao sofrimento, à dor, à morte de tantos irmãos e irmãs nossos.”

“Não é uma guerra contra os cristãos…”

A entrevista foi gravada depois do ataque à missão de Nangologo, de que a Fundação AIS deu notícia no passado fim-de-semana. D. Luiz Lisboa tinha acabado de receber a informação. E falou sobre a destruição causada pelos terroristas. “A segunda missão mais importante da Diocese foi totalmente destruída, a Igreja, a casa dos padres, a casa das irmãs, a rádio comunitária, o ambulatório. Totalmente destruído. O povo já tinha fugido da missão pelas matas, para outras cidades e aqui para Pemba. Nós ajudamos muita gente, enviamos dinheiro para que pudessem vir para lugares mais seguros.”

Apesar da destruição causada na Missão de Nagololo, o Bispo reafirma que não podemos falar numa guerra contra os cristãos. “Os cristãos não são o principal alvo dos terroristas. Já foram queimadas muitas igrejas cristãs importantes como essa que eu citei, a missão de Nangololo. A igreja histórica de Mocímboa da Praia foi toda queimada e muitas capelas rurais. Mas também foram queimadas mesquitas; assim como foram mortos catequistas, animadores de comunidades; assim como foram presas duas religiosas; também foi morto um chefe muçulmano e outras lideranças. Então, não é uma guerra contra os cristãos. Entre os líderes religiosos aqui em Cabo Delgado, em Moçambique, nós temos um bom relacionamento e nunca houve problema entre nós. Os próprios muçulmanos se distanciam dessa guerra e não aceitam que tentem atribuir uma guerra por motivos religiosos. Eles dizem que estão usando a capa da religião para esconder outros interesses que são sobretudo interesses económicos.”

“Obrigado, AIS!”

A luta pela paz e a defesa das comunidades locais é uma constante no discurso do Bispo de Pemba. Nesta entrevista à AIS voltou a sublinhar que a Igreja trabalha na construção da paz. E que na geurra todos ficam a perder… “Queremos que as pessoas vivam em paz. Isso não é pedir demais. Está nas constituições de todos os países, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, na própria Bíblia e no Alcorão. O que nós, religiosos, pedimos, é que haja paz. Será que é muito pedir paz? É esse o trabalho da igreja. Enquanto rezamos, também trabalhamos, vamos ao encontro das pessoas, somos activistas para que a paz venha. A paz é uma construção e é importante envolver as pessoas, não só o povo de Moçambique, mas a comunidade internacional. Por trás de toda a guerra existem os responsáveis. Em qualquer guerra não há vencedores. Todos perdemos, mas há pessoas que lucram. Pensam que vencem, lucram, mas também são perdedores.”

O Bispo de Pemba agradeceu toda a ajuda que a Fundação AIS tem procurado dar à Igreja de Cabo Delgado, enviando palavras de gratidão para todos os benfeitores. A Fundação AIS está a promover em Portugal e em vários países, campanhas de ajuda de emergência para Moçambique, mas a ajuda da instituição à Diocese de Pemba já existia antes mesmo dos ataques terroristas terem começado. E D. Luiz Lisboa sublinhou também esse facto. “Eu agradeço do fundo do coração a todos os benfeitores e benfeitoras da Fundação AIS. Nós, como Diocese de Pemba, mesmo antes da guerra, antes do ciclone Kenneth, temos sido ajudados pela AIS. Já nos ajudaram no apoio à formação de seminaristas, no apoio à espiritualidade e formação de padres e irmãs, já nos ajudaram com carros para os nossos missionários. Neste momento da emergência, por causa da guerra, já aprovaram projetos de ajuda emergencial. Então, o meu muito obrigado. Que Deus abençoe profundamente cada pessoa que colabora com essa verdadeira obra missionária. Muito obrigado, que Deus lhes abençoe.”


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Macomia, Moçambique

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(AIS)

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