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A sociedade fragmentada do Iraque pronta para a visita do Papa

IRAQ

Sabah ARAR | AFP

John Burger - publicado em 02/03/21

Em seu papel de pontífice ("construtor de pontes"), Francisco poderá impactar positivamente o país destruído por anos de guerra

O Papa Francisco viaja no próximo fim de semana para o Iraque. Em um país tão dividido por décadas de guerra e contínuos males sociais, um título tradicionalmente dado ao Papa terá muito significado. Esse título é “pontífice”, que significa “construtor de pontes”.

“O Iraque está tentando virar uma página após a terrível experiência com o ISIS”, disse Davide Bernocchi, representante da Catholic Relief Services no Iraque, em uma entrevista na semana passada. O Estado Islâmico, que tentou estabelecer um califado islâmico em territórios conquistados tanto no Iraque quanto na Síria, disse ele, “perturbou profundamente o equilíbrio entre as diferentes comunidades étnicas e religiosas que fazem parte do mosaico que é este país”.

Portanto, a visita de Francisco, programada para o período entre 5 e 8 de março, “vem com esta mensagem poderosa de fraternidade humana, que é realmente o caminho a seguir neste país”, disse Bernocchi. “Vemos que as pessoas, comunidades, etc. têm essa tendência de se isolar para sobreviver em tempos de estresse e crise. A mensagem do Papa é basicamente que as paredes não estão nos levando a lugar nenhum. Precisamos de pontes para construir a sociedade juntos, para construir um futuro compartilhado juntos.”

A visita do Papa ao Iraque

Na sexta-feira, 5 de março, Francisco parte de Roma para a Bagdá. Ao chegar à capital está prevista a cerimônia de acolhida oficial no Aeroporto da cidade e o encontro com o primeiro-ministro. Em seguida o Papa tem dois encontros oficiais no Palácio Presidencial de Bagdá: um com o Presidente da República e outro com autoridades civis. No mesmo dia, Francisco encontra os bispos, sacerdotes, religiosos e religiosas, seminaristas e catequistas na Catedral Sírio-Católica de “Nossa Senhora da Salvação”.

No sábado, 6 de março, o Papa vai para Najaf, onde encontra o Grão-Aiatolá Sayyd Ali Al-Husaymi Al-Sistani. Logo após, segue sua viagem de avião para Nassiriya onde participa, na Planície de Ur, de um encontro Inter-religioso. Logo depois retorna de avião para Bagdá.

Na tarde de sábado o Papa celebra a Santa Missa na Catedral caldeia de São José em Bagdá.

A programação para domingo, dia 7 de março, começa com uma viagem a Erbil. Na região autônoma do Curdistão Iraquiano, o Papa encontra autoridades civis e religiosas no aeroporto local. Depois, de helicóptero, vai a Mosul.  Na Praça da igreja de Mosul o Papa faz uma Oração de Sufrágio pelas vítimas da Guerra. A próxima etapa da manhã de domingo é Qaraqosh, onde Francisco encontra a comunidade na igreja da “Imaculada Conceição” reza o Angelus.

Na parte da tarde, de helicóptero, dirige-se a Erbil. No Estádio Franso Hariri celebra a Santa Missa. Depois da celebração o Papa retorna a Bagdá.

No último dia da sua visita, na manhã de segunda-feira dia 8 de março, Francisco participa da cerimônia de despedida no Aeroporto de Bagdá e em seguida volta a Roma.

Construindo a coesão social

Em alguns dos lugares que Francisco visitará, ele poderá  ver os frutos do trabalho que Bernocchi e a Catholic Relief Services vêm realizando. Muito do trabalho tem a ver com a construção a coesão social que foi prejudicada.

“De um lado você tem as necessidades materiais, do outro, as pessoas precisam de ajuda para reconstruir a confiança, consertar o tecido social que foi destruído pelo ISIS”, disse Bernocchi. “Estamos ajudando neste processo, reunindo, com o apoio de líderes religiosos, grupos de jovens de diferentes comunidades, comunidades de fé. Eles são capazes de discutir seus problemas, encontrar uma solução compartilhada – algo que contribui para o bem comum. Também os estamos ajudando com os meios de que precisam para relançar pequenos negócios e atividades empresariais.”

De fato, a Catholic Relief Services é uma agência que há cinco anos trabalha junto a comunidades diferentes em cidades na Planície de Nínive, enquanto alguns residentes tentam fazer suas vidas voltarem ao normal. Além de se reconstruírem materialmente, eles precisam encontrar maneiras de conviver ao lado de vizinhos que permaneceram nos locais durante a invasão do ISIS e agora podem estar sob suspeita de colaboração com o Estado Islâmico. O projeto é financiado pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID).

Unidade da igreja no Iraque

Para os cristãos, apesar das diferenças denominacionais entre as várias Igrejas Católicas e Ortodoxas, existem pontes naturais. É o que diz Arquimandrita Emanuel Youkhana, membro da Igreja Assíria do Leste e diretor executivo do Programa de Ajuda Cristã do Norte do Iraque. “No Iraque, não temos uma estrutura ou plataforma ecumênica que reúna todas as Igrejas”, explicou o Pe. Youkhana, acrescentando: “Mas na vida diária, na prática, somos uma Igreja, uma comunidade.”

Sem dúvida, a luta comum contra as forças opressoras, como o ISIS, uniu os cristãos. Sermed Ashkouri, um candidato a diácono católico caldeu que hoje vive em Boston, percebeu isso em várias viagens de volta à sua terra natal. Ele viu as manchas de sangue na parede provenientes do ataque terrorista na Igreja Nossa Senhora da Salvação, onde foi batizado cerca de 44 anos atrás. Mas ele também viu sua comunidade saindo da tragédia.

“Cada igreja que foi danificada, derrubada, queimada, havia uma atividade naquela mesma semana – batismo, casamento, missa. A fé nunca morreu”, disse Ashkouri, que é engenheiro.

De fato, existem paredes, disse Ashkouri – paredes literais. “Você vai a qualquer igreja no Iraque, eles são cercados por arame farpado e 3,6 metros de parede de concreto”, disse ele. “Antes da guerra, não havia nada assim. Você não precisava passar por um posto de controle para ir à igreja.

Mas, apesar disso, as pessoas ainda vão todos os domingos e celebram as primeiras comunhões e casamentos e coisas assim. “A Igreja ainda é uma grande parte da vida de nosso povo”, acrescentou Dom Abris Youkhana, da Igreja Assíria do Leste e bispo da Eparquia de Erbil e Kirkuk. “Com as dificuldades econômicas, tem muita gente pensando só na própria vida, em como ganhar dinheiro, em como continuar vivendo. Mas eles ainda estão participando plenamente da vida da Igreja”.

O que esperar da visita de Francisco

A visita do Papa Francisco ao Iraque é “importante para nós como cristãos”, disse o bispo Youkhana, cuja Igreja assinou uma “Declaração Cristológica Comum” com o Vaticano em 1994. “É uma mensagem muito forte, eu acho, não apenas uma mensagem de paz , mas uma mensagem para nós, cristãos, que nossos irmãos pensam em nós, e em uma pessoa como o Papa Francisco, que insiste em vir aqui, ainda que haja muitas dúvidas sobre a viagem”, afirmou.

Nascido em 1978, dois anos antes da guerra do Iraque com o Irã, o bispo Youkhana ainda comentou: “Desde que me lembro, estamos em guerra. Ainda hoje existem guerras que vivemos todos os dias aqui: contra a corrupção, contra os terroristas. É difícil para as pessoas permanecerem fortes e darem testemunho de sua fé … Portanto, esta visita nos encorajará a continuar nossa luta aqui contra os inimigos de nossa fé e de nossa nação.”


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