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Autoridades civis não podem fechar igrejas unilateralmente, diz União dos Juristas Católicos do RJ

Igreja durante pandemia

THIERRY ROGE / BELGA MAG / via AFP

Reportagem local - publicado em 23/04/21

Nota publicada questiona incoerências e desproporções em algumas determinações do poder público

Autoridades civis não podem fechar igrejas unilateralmente, afirmou a União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro em nota publicada nesta quarta-feira, 21 de abril. O texto foi preparado pela diretoria da entidade e pelo seu grupo de trabalho “Relações Institucionais Igreja-Estado”.

A nota, que chegou a ser reproduzida pelo Vatican News, enfatiza a impossibilidade da determinação unilateral do fechamento integral de templos católicos por parte de autoridades civis. Cabe recordar que, no último dia 8 de abril, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) brasileiro decidiu que os estados e municípios do país podem restringir a realização de cultos e missas presenciais sob a justificativa do combate à pandemia de covid-19.

Eis a nota, na íntegra, emitida pela União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro:

Em recente julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 811, em 08/04/2021, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a proibição integral da realização de atividades religiosas coletivas presenciais, por parte de Governadores ou Prefeitos, como medida temporária de enfrentamento da pandemia de Covid-19, não fere o núcleo essencial da liberdade religiosa.

A União dos Juristas Católicos do Rio de Janeiro, por sua Diretoria e Grupo de Trabalho “Relações Institucionais Igreja-Estado”, vem nesta Nota manifestar sua preocupação com o impacto de tal decisão sobre as relações de coordenação e cooperação entre a Igreja Católica e a República Federativa do Brasil, tal como pactuadas no Tratado Internacional entre o Brasil e a Santa Sé sobre o Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano em 13/11/2008 (Acordo Brasil-Santa Sé – Decreto nº 7.107/2010).

Nesse sistema, que se funda numa coordenação (e não numa subordinação) entre a Igreja Católica e o Estado brasileiro e seus respectivos ordenamentos jurídicos, conforme recorda Norberto Bobbio – insuspeito no tema ao se declarar publicamente “apartado da Igreja” –, pressupõe-se “o reconhecimento recíproco dos dois poderes como cada um, na própria ordem, independentes e soberanos” (Teoria do ordenamento jurídico. Brasília: UnB, 1995. p. 182). A mesma premissa é preconizada pelo Acordo Brasil-Santa Sé: “[…] as Altas Partes Contratantes são, cada uma na própria ordem, autônomas, independentes e soberanas e cooperam para a construção de uma sociedade mais justa, pacífica e fraterna”.

Dessa forma, a Igreja Católica presente no mundo inteiro ostenta seu próprio ordenamento jurídico autônomo e soberano (o Direito Canônico), emanado da Santa Sé como fonte jurígena histórica e atual internacionalmente reconhecida muito antes da instituição do Estado brasileiro. Não à toa, a Santa Sé mantém relações diplomáticas com mais nações que a própria República Federativa do Brasil.

Portanto, as relações entre a Igreja Católica e o Estado brasileiro devem pautar-se por respeito mútuo, autonomia, independência e cooperação. A Igreja Católica tem dado farto exemplo, durante a pandemia, de aplicação de normas sanitárias para evitar a 2 / 2 propagação do vírus. E não tem se recusado a, em diálogo virtuoso com as autoridades civis e especialistas do meio científico, chegar a acordos e compromissos acerca das medidas a serem implantadas em seus templos espalhados por todo o Brasil.

Autoridades civis não podem fechar igrejas unilateralmente

A nota prossegue:

Contudo, não é possível reconhecer às autoridades civis poder de subordinar a Igreja Católica, fazendo tábula rasa de seu ordenamento jurídico próprio (o Direito Canônico) e do acordo internacional da República com a Santa Sé, o qual, com fundamento no direito de liberdade religiosa, reconhece à Igreja Católica o direito de desempenhar a sua missão apostólica, garantindo o exercício público de suas atividades (Art. 2º do Acordo).

Não se está aqui a dizer que a autoridade civil, no cuidado para com a vida dos cidadãos, não possa legitimamente propor limitações de cunho sanitário às atividades religiosas. Estas, todavia, não podem ser impostas sobre o culto católico de forma unilateral e sem o devido diálogo com a autoridade eclesiástica católica, nem ter o condão de suprimir total e integralmente a faceta pública do culto sem a concordância e cooperação da autoridade eclesiástica católica, sob pena de violação do direito humano de liberdade religiosa em seu conteúdo essencial e também, no caso católico, do Tratado Internacional conhecido como “Acordo Brasil-Santa Sé”.

Repousa na esfera de atribuição da autoridade eclesiástica católica determinar ou não o fechamento integral dos templos católicos, bem como a forma de administração dos seus sacramentos, uma vez que se trata de notas essenciais do exercício público da fé católica, de acordo com os ensinamentos e normas emanados para os católicos pela Santa Sé, parte contratante com a República do referido Tratado Internacional.

Recorde-se também que, curiosamente, para uma série de atividades de cunho econômico, como os transportes por meios viários e aeroviários, o poder público tem permitido seu funcionamento, inclusive sem qualquer obrigatoriedade do distanciamento mínimo que tem sido rigorosamente observado nos templos católicos do País. Ao revés, o segmento religioso católico tem dado exemplo de observância a tais normas sanitárias.

Por fim, a Igreja Católica no Brasil tem dado vivas demonstrações de desejar cooperar com o poder público nas questões envolvendo os cuidados sanitários, mostrando-se aberta ao diálogo e a acordos com as autoridades civis para que se encontrem soluções que atendam a ambas as partes e, sobretudo, aos cidadãos religiosos católicos, cujas vidas são de primordial importância não só para o Estado, mas também para a Mãe Igreja.

Rio de Janeiro, 21 de abril de 2021.

UNIÃO DOS JURISTAS CATÓLICOS DO RIO DE JANEIRO

Tags:
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