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Papa: “há pessoas que vivem com o coração cinzento”

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Antoine Mekary | ALETEIA

Reportagem local - publicado em 19/05/21

"O coração deve ser aberto e luminoso, para que entre a luz do Senhor"

O Papa Francisco comentou em sua catequese de hoje algumas dificuldades da vida de oração e ensinou como superá-las. “Rezar não é fácil: há muitas dificuldades que surgem na oração. É preciso conhecê-las, identificá-las e superá-las”, disse.

Distração

O primeiro problema que se apresenta para aqueles que rezam, segundo o Papa, é a distração.

Começas a rezar e depois a mente roda, roda pelo mundo inteiro; o teu coração está ali, a mente está acolá… a distração da prece. A oração convive frequentemente com a distração. De facto, a mente humana tem dificuldade de se concentrar por muito tempo num único pensamento. Todos nós experimentamos este turbilhão contínuo de imagens e ilusões em movimento perpétuo, que nos acompanha até durante o sono. E todos sabemos que não é bom dar seguimento a esta inclinação fragmentada. 

O Papa reconheceu que a luta para alcançar e manter a concentração não se limita à oração.

Se não se atinge um grau de concentração suficiente, não se pode estudar com proveito, nem se pode trabalhar bem. Os atletas sabem que as competições são ganhas não só pelo treino físico, mas também pela disciplina mental: acima de tudo, pela capacidade de estarem concentrados e de manter alerta a atenção.

Segundo o Papa, as distrações não são culpadas, mas devem ser combatidas. E isso se faz por meio da virtude da vigilância.

Jesus chama frequentemente os discípulos ao dever de uma vida sóbria, guiada pelo pensamento de que mais cedo ou mais tarde ele voltará, como um noivo volta das bodas ou um senhor da viagem. No entanto, sem saber o dia nem a hora do Seu regresso, todos os minutos da nossa vida são preciosos e não devem ser desperdiçados em distrações. Num momento que não conhecemos, a voz do nosso Senhor ressoará: nesse dia, bem-aventurados os servos que Ele encontrará laboriosos, ainda concentrados no que realmente importa. Não se dispersaram perseguindo todas as atrações que lhes vinham à mente, mas procuraram empreender o caminho certo, praticando o bem e desempenhando a própria tarefa. Esta é a distração: que a imaginação roda, roda, roda… Santa Teresa definia esta imaginação que roda, roda na oração, “a louca de casa”: é como uma louca que te faz rodar, rodar… Devemos impedi-la e aprisioná-la com a atenção.

Aridez

A segunda grande dificuldade da vida de oração é, de acordo com o Papa, o “tempo de aridez”.

A aridez faz-nos pensar na Sexta-Feira Santa, na noite e no Sábado Santo, o dia inteiro: Jesus não está presente, está no sepulcro; Jesus morreu: estamos sozinhos. E este é o pensamento-mãe da aridez. Muitas vezes não sabemos quais são as razões da aridez: pode depender de nós, mas também de Deus, que permite certas situações na vida exterior ou interior. Ou, às vezes, pode ser uma dor de cabeça ou um no fígado que te impede de entrar na oração.

O Papa reconheceu que, com frequência, não sabemos a razão disso acontecer.

Os mestres espirituais descrevem a experiência da fé como uma alternância contínua de tempos de consolação e tempos de desolação; momentos em que tudo é fácil, enquanto outros são marcados por uma grande dificuldade. Muitas vezes, ao encontrarmos um amigo, dizemos: “Como estás?”  – “Hoje sinto-me abatido”. Acontece que às vezes nos sentimo “abatidos”, isto é, não temos sentimentos, não temos consolação, não aguentamos mais. São aqueles dias cinzentos… e existem muitos na vida! Mas o perigo é ter o coração cinzento: quando este “sentir-se abatido” chega ao coração e o faz adoecer… e há pessoas que vivem com o coração cinzento. Isto é terrível: não se pode rezar, não se pode sentir consolação com o coração cinzento! Ou não se pode levar adiante uma aridez espiritual com o coração cinzento. O coração deve ser aberto e luminoso, para que entre a luz do Senhor. E se não entrar, é preciso aguardá-la com esperança. Mas não devemos fechá-la no cinzento.

Acédia

O Papa Francisco comentou então a terceira dificuldade que pode ser enfrentada por aqueles que rezam, a acédia.

A acédia é «uma forma de depressão devida ao relaxamento da ascese, à diminuição da vigilância, à negligência do coração» (CIC, 2733). É um dos sete “pecados capitais” pois, alimentado pela presunção, pode levar à morte da alma.

O que devemos fazer, então, nesta sucessão de entusiasmos e desânimos? – perguntou o Papa.

Deve-se aprender a caminhar sempre. O verdadeiro progresso na vida espiritual não consiste em multiplicar os êxtases, mas em ser capaz de perseverar em tempos difíceis: caminha, caminha, caminha… E se te sentires cansado, pára um pouco e volta a caminhar. Mas com perseverança. Recordemos a parábola de São Francisco sobre a alegria perfeita: não é nas infinitas fortunas que caem do céu que se mede a capacidade de um frade, mas em caminhar com constância, mesmo quando não se é reconhecido, mesmo quando se é maltratado, ou quando tudo perdeu o sabor do princípio. Todos os santos passaram por este “vale escuro”, e não nos escandalizemos se, lendo os seus diários, ouvirmos o relato de noites de oração sem vontade, vivida sem gosto. Temos de aprender a dizer: “Ainda que Tu, meu Deus, pareças fazer tudo para que eu deixe de acreditar em Ti, continuo a rezar a Ti”. Os crentes nunca apagam a oração! Por vezes pode assemelhar-se à oração de Jó, o qual não aceita que Deus o trate injustamente, protesta e chama-o em juízo. Mas, muitas vezes, protestar diante de Deus é também um modo de rezar ou, como dizia aquela velhinha, “zangar-se com Deus também é um modo de rezar”, pois com frequência o filho zanga-se com o pai: é um modo de se relacionar com o pai; pois reconhece-o como “pai”, zanga-se…

Segundo o Papa, no fim dos momentos de desolação, “em que elevámos ao Céu gritos silenciosos e muitos ‘porquês?’, Deus responder-nos-á”.

Não esqueçais a oração do “porquê?”: é a prece que recitam as crianças quando começam a não entender as coisas e os psicólogos definem-na “a idade dos porquês”, pois a criança pergunta ao pai: “Pai, porquê…? Pai, porquê…? Papai, porquê…?”. Mas prestemos atenção: a criança não ouve a resposta do pai. O pai começa a responder e a criança apresenta outro porquê. Só quer chamar para si a atenção do pa; e quando nos zangamos um pouco com Deus e começamos a pronunciar os porquês, estamos a atrair o coração do nosso Pai na direção da nossa miséria, da nossa dificuldade, da nossa vida. Mas sim, tende coragem de dizer a Deus: “Mas porquê…?”. Pois às vezes, zangar-se um pouco faz bem, faz-nos despertar esta relação de filho com o Pai, de filha com o Pai, que devemos manter com Deus. E até as nossas expressões mais duras e amargas, Ele as acolherá com o amor de um pai, e considerá-las-á como um ato de fé, como uma oração.

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OraçãoPapa Francisco
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