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Como suportar os defeitos dos outros com a paciência de Jó

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Dolors Massot - publicado em 22/06/21
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É uma obra espiritual de misericórdia suportar falhas pacientemente, e isso também pode nos ajudar a ser pessoas melhores

No dia-a-dia, todos nós já experimentamos que o perdão é uma grande demonstração de amor. Perdoar os outros pelo que eles nos fizeram requer um ato voluntário que é difícil, chegando às vezes a ser heróico.

Na vida, todos nós, mais cedo ou mais tarde, vivenciamos a dor de ser ofendidos: descobrimos que alguém nos traiu, mentiu para nós, ou foi infiel ou desleal. Quanto mais perto essa pessoa está de nós e quanto mais confiança depositávamos nela, mais a ofensa dói.

É por isso que valorizamos o perdão infinitamente. Sabemos quanto custa lidar com a dor, muitas vezes misturada com a raiva, que sentimos quando sabemos que fomos ofendidos, abandonados ou manipulados.

Quando somos nós que causamos a ofensa e são os outros que devem nos perdoar, apreciamos profundamente ser perdoados. Na verdade, se uma pessoa está ciente do que fez de errado e está arrependida, ela não pode descansar até que obtenha o perdão. Vemos esse comportamento muito claramente em crianças que procuram um amigo que machucaram para pedir perdão e, se necessário, insistir em ser perdoado.

“Perdão” e “ofensas” são palavras que exigem ação corajosa em momentos decisivos de nossas vidas.

No entanto, há também outro “campo de batalha” que talvez não valorizemos o suficiente: nosso tratamento dos defeitos habituais dos outros.

A Igreja Católica é muito clara sobre esta questão: perdoar as ofensas dos outros é uma obra espiritual de misericórdia. Isso significa que faz parte da jornada de uma pessoa em seu caminho de desenvolvimento no bem.

A Igreja também nos diz que outra obra de misericórdia é suportar pacientemente os defeitos do próximo. Isso é realmente superior a perdoar ofensas.

Por que é superior?

Fabio Rosini, autor do livro Solo l’amore crea (Só o Amor Cria), explica que o perdão é ocasional e trata de eventos passados específicos. Pode ser muito difícil e doloroso, mas é, em qualquer caso, limitado. Suportar pacientemente os defeitos do próximo, por outro lado, implica um longo período de tempo, duração e continuidade.

Rosini lembra de uma música de David Bowie que diz: “Podemos ser heróis, apenas por um dia”. Suportar pacientemente todos os dias aquele(a) colega que está ao nosso lado o dia inteiro nos irritando com seu sarcasmo é muito mais difícil do que apenas perdoá-lo(a) uma vez.

A mesma coisa pode acontecer no casamento. Pequenos defeitos que antes pareciam insignificantes, que até pareciam curiosos e engraçados durante o namoro, podem se tornar pesados e insuportáveis ao longo do tempo.

A figura bíblica de Jó é um exemplo de como suportar não apenas infortúnios (doença, pobreza, morte etc.), mas também as palavras duras e cortantes de sua esposa e amigos.

Tudo isso pode ser estendido a toda a família. Comentários inadequados, zombaria, falta de responsabilidade de um parente, e assim por diante, prejudicam a coexistência pacífica. Isso pode nos fazer não querer ver essa pessoa, mas sim evitá-la em eventos familiares, ou até mesmo algum dia chamá-la abertamente e dizer-lhe “basta”.

Suportar os defeitos dos outros um dia após o outro requer muita força e muito amor no coração. Há três coisas difíceis que precisamos fazer:

    Embora em nossa cultura a palavra “tolerância” seja amplamente utilizada como base para a convivência, essa não é a palavra ideal.

    “Tolerância” implica um nível muito baixo de compreensão e empatia: “Eu tolero você, mas apenas porque a lei me obriga.”

    “Suportar”, por outro lado, significa apoiar ou segurar. Suportar pacientemente os defeitos de alguém significa estar disposto a assumir o fardo da outra pessoa, carregá-lo, carregar a outra pessoa com seus fardos.

    Quando “suportamos pacientemente”, acompanhamos a outra pessoa no caminho da vida e a ajudamos, mas também estamos conscientes da fragilidade humana, da nossa própria vulnerabilidade e da dos outros.

    Portanto, suportar os defeitos dos outros nos ajuda a reconhecer nossas próprias limitações, porque vemos que não somos melhores do que os outros. Os defeitos dos outros se tornam o espelho no qual vemos nossa própria condição humana, que é imperfeita, ao mesmo tempo em que somos chamados à grandeza do amor e da eternidade.

    Suportar os defeitos de outras pessoas, um dia após o outro, é uma tarefa que não pode ser enfrentada sozinha. A psicologia pop nos falaria sobre táticas, dicas e pensamentos para aturar os outros. No entanto, esse tipo de atitude é decepcionante se dependermos apenas de nossa própria força. No final, corremos o risco de nos esgotar, jogar a toalha e explodir.

    Em vez disso, tudo assume outra dimensão se abordarmos o “trabalho” de suportar pacientemente os defeitos dos outros a partir de uma perspectiva cristã. Desta forma, contamos com a ajuda de Deus que é Pai, que nos perdoa e nos santifica.

    Quando caminhamos de mãos dadas com Deus, a luta para ser paciente se torna um caminho no qual Ele nos guia e fortalece para percorrê-lo. Deus nos sugere coisas, alerta-nos se ficarmos impacientes e nos dá os dons de que precisamos.

    Nesta perspectiva, as pessoas ao nosso redor que nos irritam com seus defeitos se tornam pessoas a quem devemos ser gratos, porque direcionamos nosso olhar para Deus em vez de contemplar a nós mesmos ou exigir tanto de nós mesmos.