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A greve de caminhoneiros e a doutrina católica

GREVE CAMINHONEIROS

AGIF via AFP

Vanderlei de Lima - publicado em 09/09/21

O Concílio Vaticano II ensina que quando “surgem conflitos econômico-sociais, devem fazer-se esforços para que se chegue a uma solução pacífica dos mesmos"

Na esteira dos atos cívicos do dia 7 de setembro, teve início, em alguns Estados brasileiros, uma greve de caminhoneiros. Importa-nos, pois, tratar do assunto à luz dos ensinamentos católicos.

O Compêndio da Doutrina Social da Igreja (São Paulo: Paulinas, 2011, 7ª ed., n. 304) ensina que a greve “pode ser definida como a recusa coletiva e concertada, por parte dos trabalhadores, de prestar o seu trabalho, com o objetivo de obter, por meio da pressão assim exercida sobre os empregadores, sobre o Estado e sobre a opinião pública, melhores condições de trabalho e da sua situação social”. 

Ainda: “a greve, conquanto se perfile como… uma espécie de ultimato, deve ser sempre um método pacífico de reivindicação e de luta pelos próprios direitos; torna-se moralmente inaceitável quando é acompanhada de violências ou ainda quando se lhe atribuem objetivos não diretamente ligados às condições de trabalho ou contrários ao bem comum”. Contudo, fora do uso da violência, mas dentro da luta firme, porém pacífica, por melhores condições de trabalho e pelo bem comum, “a doutrina social reconhece a legitimidade da greve quando se apresenta como recurso inevitável, e mesmo necessário, em vista de um benefício proporcionado, depois de se terem revelado ineficazes todos os outros recursos para a composição dos conflitos”.

Devemos afirmar também que a greve, como se dá hoje, é um fenômeno do século XIX e foi, a princípio, vista com desconfiança ou mesmo rejeição por documentos oficiais da Igreja devido à sua raiz comunista, portanto apta a despertar luta de classes. Sim, o Papa Leão XIII, após afirmar que a tão sonhada “igualdade” comunista, ao abolir a propriedade privada e a livre iniciativa, traz, na verdade, “a igualdade na nudez, na indigência e na miséria” (Rerum novarum, 1891, n. 9), diz que as greves, nesse contexto, “causam dano não só aos patrões e aos mesmos operários, mas também ao comércio e aos interesses comuns; e em razão das violências e tumultos, a que de ordinário dão ocasião, põem muitas vezes em risco a tranquilidade pública” (idem, n. 22 e 24; cf. Pio XI. Quadragesimo anno, 1931, n. 94).

Todavia, o direito à greve fora da luta de classes comunista é reconhecido pela Igreja como último recurso, quando os efeitos bons forem capazes de “compensar os danos provocados pelo movimento. Em tais circunstâncias, a greve será legítima” (Dom Estêvão Bettencourt, OSB. Curso de Doutrina Social da Igreja. Rio de Janeiro, 1992, p. 189; cf. São Paulo VI. Octogesima adveniens, 1971, n. 14 e São João Paulo II. Laborem exercens, 1981, n. 20).

Sim, o Concílio Vaticano II ensina que quando “surgem conflitos econômico-sociais, devem fazer-se esforços para que se chegue a uma solução pacífica dos mesmos. Mas ainda que, antes de mais, se deva recorrer ao sincero diálogo entre as partes, todavia, a greve pode ainda constituir, mesmo nas atuais circunstâncias, um meio necessário, embora extremo, para defender os próprios direitos e alcançar as justas reivindicações dos trabalhadores. Mas procure-se retomar o mais depressa possível o caminho da negociação e do diálogo da conciliação” (Gaudium et Spes, 1965, n. 68).

Finalizemos citando o Catecismo da Igreja Católica a ensinar que “a greve é moralmente legítima, quando se apresenta como um recurso inevitável, e mesmo necessário, em vista de um benefício proporcionado. Torna-se moralmente inaceitável quando é acompanhada de violências ou ainda quando lhe atribuem objetivos não diretamente ligados às condições de trabalho ou contrários ao bem comum” (n. 2435).

Dentro desses parâmetros, a atual greve dos caminhoneiros parece, portanto, lícita.

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