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Papa a bispos: preservar o passado e olhar para o futuro

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Tiziana FABI / AFP

Reportagem local - publicado em 12/09/21

"Se colocarmos no centro o Evangelho e o testemunharmos com o amor fraterno, poderemos olhar para o futuro com esperança"

O Papa Francisco afirmou hoje que, “na vida da Igreja, devemos manter sempre juntas estas duas realidades: preservar o passado e olhar para o futuro”.

Em seu discurso no Encontro com os Bispos, em Budapeste, o Papa expressou primeiramente sua alegria “por me encontrar aqui no vosso meio por ocasião do encerramento do LII Congresso Eucarístico Internacional”.

Francisco quis então “partilhar algumas reflexões partindo precisamente do gesto eucarístico: no Pão e no Vinho, vemos Cristo que oferece o seu Corpo e o seu Sangue por nós”.

A Igreja na Hungria, com a sua longa história, marcada por uma fé inabalável, por perseguições e pelo sangue dos mártires, está particularmente associada ao sacrifício de Cristo. Muitos irmãos e irmãs, muitos bispos e presbíteros viveram o que celebravam no altar: foram moídos como os grãos de trigo, para que todos pudessem ser alimentados pelo amor de Deus; foram espremidos como as uvas, para que o sangue de Cristo se tornasse seiva de vida nova; foram dilacerados, mas a sua amorosa oferta foi uma semente de renascimento evangélico implantada na história deste povo.

Futuro

O Papa afirmou que “podemo-nos encaminhar para o futuro com o mesmo anseio dos mártires: viver a caridade e testemunhar o Evangelho”.

Na vida da Igreja, devemos manter sempre juntas estas duas realidades: preservar o passado e olhar para o futuro. Salvaguardar as nossas raízes religiosas, salvaguardar a história donde provimos, mas sem ficar com o olhar parado no passado: olhar para o futuro, olhar para a frente e encontrar novos caminhos para anunciar o Evangelho.

Como Pastores – disse o Papa aos bispos –, “sois chamados antes de mais nada a recordar isto ao vosso povo: a tradição cristã – como dizia Bento XVI – «não é uma coleção de objetos, de palavras, como uma caixa que contém coisas mortas; a Tradição é o rio da vida nova que vem das origens, de Cristo até nós, e envolve-nos na história de Deus com a humanidade» (Audiência Geral, 03/V/2006). Escolhestes como tema do Congresso o versículo 7 do Salmo 87: «Em Ti estão todas as minhas fontes». Sim! A Igreja provém da fonte que é Cristo, sendo enviada para que o Evangelho, como um rio de água viva, infinitamente mais largo e acolhedor do que o vosso grande Danúbio, alcance a aridez do mundo e do coração do homem, purificando-o e saciando a sua sede. Assim, o ministério episcopal não existe para repetir uma notícia do passado, mas é voz profética da perene atualidade do Evangelho na vida do povo santo de Deus e na história atual.”

Para realizar esta missão, o Para deu algumas indicações.

Anunciadores do Evangelho

A primeira: ser anunciadores do Evangelho. Não esqueçamos que no centro da vida da Igreja está o encontro com Cristo. Às vezes, especialmente quando a sociedade em redor não parece entusiasta da nossa proposta cristã, a tentação é fechar-nos na defesa das instituições e estruturas. Atualmente, o vosso país está passando por grandes mudanças que de modo geral afetam toda a Europa. Com a chegada da liberdade, depois do longo período em que vos foi impedido de professar a fé, há novos desafios a enfrentar num contexto onde cresce o secularismo e definha a sede de Deus. Entretanto recordemo-nos: a fonte de água viva, que constantemente flui e sacia, é Cristo. As estruturas, as instituições, a presença da Igreja na sociedade servem apenas para despertar nas pessoas a sede de Deus e levar-lhes a água viva do Evangelho. Por isso o que se vos pede, a vós Bispos, é acima de tudo isto: não a administração burocrática das estruturas (isto seja feito por outros), nem a busca de privilégios e vantagens. Por favor, sede servos. Servidores, não príncipes. Que vos peço? A ardente paixão pelo Evangelho, tal como o Evangelho é. Fidelidade e paixão pelo Evangelho. Ser testemunhas e anunciadores da Boa Nova, difundindo a alegria, acompanhando os sacerdotes – mostrai-vos próximo dos sacerdotes – e os religiosos com coração paterno, exercitando a arte da escuta. Não tenhais medo de dar espaço à Palavra de Deus, envolvendo nisso os leigos: serão eles os canais por onde o rio da fé irrigará novamente a Hungria.

Testemunhas de fraternidade

A segunda indicação do Papa aos bispos: “ser testemunhas de fraternidade”.

O vosso país é um lugar onde há muito convivem pessoas provenientes doutros povos. As variadas etnias, minorias, confissões religiosas e migrantes transformaram este país num ambiente multicultural. Trata-se duma realidade que pode, pelo menos num primeiro momento, assustar. A diversidade cria sempre um pouco de medo, porque coloca em risco seguranças adquiridas e compromete a estabilidade alcançada. Todavia é uma grande oportunidade para abrir o coração à mensagem do Evangelho: «Que vos ameis uns aos outros, como Eu vos amei» (Jo 15, 12). Face às diferenças culturais, étnicas, políticas e religiosas, podemos ter duas atitudes: fechar-nos numa defesa rígida da nossa dita identidade, ou abrir-nos ao encontro com o outro e cultivar, juntos, o sonho duma sociedade fraterna. Apraz-me recordar aqui que em 2017, precisamente nesta capital europeia, vos encontrastes com os representantes doutras Conferências Episcopais da Europa centro-oriental e reiterastes que a pertença a uma identidade nunca deve ser motivo de hostilidade e desprezo para com os outros, mas antes uma ajuda para dialogar com culturas diversas. Dialogar, sem negociar a própria pertença.

Construtores de esperança

A terceira coisa que o Papa pediu foi que os bispos sejam construtores de esperança.

Se colocarmos no centro o Evangelho e o testemunharmos com o amor fraterno, poderemos olhar para o futuro com esperança, apesar das pequenas ou grandes tempestades que tivermos de atravessar hoje. Isto constitui o que a Igreja é chamada a difundir na vida das pessoas: a apaziguadora certeza de que Deus é misericórdia, ama-nos em todos os momentos da vida e está sempre pronto a perdoar-nos e levantar-nos de novo. Não esqueçais o estilo de Deus, que é um estilo de proximidade, compaixão e ternura. Este é o estilo de Deus. Sigamos por esta estrada, com o mesmo estilo. A tentação de se deixar abater e desanimar nunca vem de Deus. Nunca. Vem do inimigo, alimentando-se em muitas situações: por trás da fachada do bem-estar, por trás duma roupagem de tradições religiosas, podem esconder-se muitos lados sombrios. Recentemente, a Igreja na Hungria teve oportunidade de refletir como a transição da era da ditadura para a da reencontrada liberdade aparece marcada por contradições: a degradação da vida moral, o aumento da criminalidade, a comercialização da droga, o flagelo do tráfico de órgãos e tantos casos de crianças assassinadas para isso. Existem problemas sociais: as dificuldades das famílias, a pobreza, as feridas que afetam o mundo dos jovens, num contexto em que a democracia ainda precisa de se consolidar. A Igreja não pode deixar de ser protagonista de proximidade, dispensadora de solicitude e conforto às pessoas para que nunca se deixem roubar a luz da esperança. O anúncio do Evangelho revigora a esperança, porque nos lembra que, em tudo o que vivemos, Deus está presente, acompanha-nos, dá-nos coragem, dá-nos criatividade para começar sempre uma história nova. É comovente recordar o Venerável Cardeal József Mindszenty, filho e pai desta Igreja e desta terra, quando, no final duma vida repleta de sofrimentos por causa da perseguição, nos deixou estas palavras de esperança: «Deus é jovem. O futuro pertence-Lhe. É Ele que faz surgir o novo, o jovem e o amanhã nos indivíduos e nos povos. Por isso, não podemos abandonar-nos ao desespero» (“Mensagem ao Presidente da Comissão Organizadora e aos Húngaros no exílio”, in J. Közi Horváth, Mindszenty bíboros, 111). Deus é jovem.

O Papa Francisco encerrou seu discurso dizendo que “também a Hungria precisa dum anúncio renovado do Evangelho, uma nova fraternidade social e religiosa, uma esperança construída dia-a-dia, para poder encarar o futuro com alegria. Vós sois os pastores protagonistas deste processo histórico, desta bela aventura”.

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