Quando erramos na vida ou sofremos um trauma, a principal tendência é ignorar, jogar aquilo para debaixo do tapete e seguir a vida como se nada tivesse acontecido. Mas pela experiência é possível constatar que esses eventos não vão simplesmente embora, que é preciso reconhecê-los, significá-los, encontrar compreensão e perdoar eventuais agentes externos ou a si próprio por aquele luto. Sobre isso que se trata o filme O Culpado, que está entre os lançamentos do Netflix.
Estrelado por Jake Gyllenhaal, o longa conta a história de um agente que é transferido para a operação de chamadas da polícia como penalidade após cometer um erro em campo. O equívoco só será revelado ao final do filme, mas durante uma hora e meia o espectador sente com o personagem o quanto essa culpa corrói, e como ela se manifesta das mais diversas formas se não elaborada. O longa é um remake de Culpa (2018), cultuado filme dinamarquês que apresenta os mesmos conflitos, com ainda menos recursos de flashback para explicitar os traumas do protagonista.
Assim como no original, na nova versão o espectador é trancado, em tempo real, em uma sala de atendimento da polícia com Joe, e aos poucos vamos percebendo como, remoído pela culpa e com seu temperamento explosivo, o personagem de Jake Gyllenhaal transfere suas mazelas emocionais para os dilemas familiares e para seus atendimentos no trabalho. E quando ele recebe a chamada de uma ocorrência em que a vida de uma criança está em risco, o protagonista embarca em uma espiral de dor e redenção onde seus dilemas éticos, morais e psicológicos serão colocados em cheque.
Uma história tão pessoal, que aborda questões tão íntimas do protagonista, só foi possível de ser contada com eficiência graças à dupla dos sonhos que foi convocada para a missão. Muito do êxito do filme se dá pela direção precisa carregada de tensão do mestre Antoine Fuqua, cineasta de thrillers de sucesso como Atraídos pelo Crime (2009) e o já clássico Dia de Treinamento (2001). A adaptação do roteiro ficou a cargo de ninguém menos que Nic Pizzolatto, ninguém menos que o criador de True Detective (2014-2019), uma das séries mais impactantes dos últimos tempos, cuja primeira temporada justamente trata de uma reconciliação com o passado. A dupla Antoine Fuqua e Nic Pizzolatto já havia trabalhado junta em Sete Homens e Um Destino (2016), remake do faroeste clássico homônimo de 1960.