Sempre tive em minha mente uma ideia definida acerca de quem eu sou. Um voo de fantasia que me surpreende, mas tem pouca relação com quem eu sou na realidade. Na melhor das hipóteses, minha ideia sobre mim mesmo é uma esperança, uma imagem de quem eu quero ser.
Aspiro ser um pai maravilhoso e paciente, que conta as piadas de papai, tem tempo para treinar todos os times esportivos dos filhos e cujos joelhos nunca doem, a ponto de ter de parar de brincar de cavalo com a criança.
Eu adoraria ser o melhor marido do mundo, que sempre sabe as palavras certas a dizer, sempre lava a louça e deixa de assistir ao jogo de futebol para ir colher maçãs sem reclamar.
Eu também adoraria ser fisicamente mais forte e mais veloz. Seria maravilhoso possuir um nariz mais bem feito. Esperanças razoáveis são extremamente úteis, pois nos impulsionam em direção a objetivos positivos.
Na pior das hipóteses, a imagem de quem eu sou fica confusa com a realidade, deixando-me iludido. Acho que sou melhor do que realmente sou. Mais gentil, mais generoso. Eu me olho no espelho e, por meio de qualquer filtro egoísta que tenha adicionado às minhas lentes oculares, estou literalmente convencido de que um rosto mais bonito está olhando para mim. Este homem no reflexo não tem nem um único cabelo grisalho na barba. Ele acha que é 20 anos mais novo.
Nossa incapacidade de combinar nossa ideia sobre o próprio "eu" com a realidade é um fenômeno humano estranho. Por um lado, isso nos causa muita dor de cabeça, mas também gera iniciativa e desejo, além de nos colocar em uma grande aventura para tornar a realidade verdadeira. Somos criaturas que sonham e lutam.
Entre outros objetivos, sempre quis ser pintor. Na verdade, eu me inscrevi na escola de artes fora do colégio e fui aceito, mas acabei seguindo um caminho diferente porque senti Deus me chamando para ser pastor. A vocação que senti naquela época foi o início de uma estrada longa, emocionante e sinuosa para ser ordenado 15 anos depois como padre católico. Nesse ínterim, servi na Igreja Anglicana como pastor por muitos anos, casei-me e tive filhos. Havia pouquíssimo tempo para a arte. Então, esse sonho se desvaneceu. Ocasionalmente, porém, ainda penso em como seria ter tempo e espaço para melhorar como pintor.
Dizem que São Lucas tinha talento para as artes plásticas. Além de ser o autor do Evangelho de São Lucas e dos Atos dos Apóstolos, ele é o artista responsável por um ícone da Bem-Aventurada Virgem Maria. É também um contador de histórias talentoso e, como artista, tem olho para os detalhes.
Lucas não foi um dos apóstolos originais. Em seu Evangelho, ele diz que seus escritos se baseiam no depoimento de testemunhas oculares, então é provável que ele nunca tenha realmente conhecido Jesus. E, ainda assim, seu Evangelho traz a ideia de Cristo à vida, e seus leitores descobriram Jesus como uma pessoa real.
Esse é o poder da arte, da narrativa e da beleza. A arte pega uma ideia que podemos ter e a incorpora, tornando a ideia "real".
No fundo, a história que Lucas conta e a imagem que pinta são sobre uma pessoa real. E ele sabe disso.
Uma perspectiva artística tem implicações em como interagimos com as pessoas ao nosso redor e moldamos nossas ideias sobre nós mesmos. Amamos os outros como pessoas reais, de carne e osso, como obras de arte vivas que respiram. Não são ideias abstratas. As obras de arte, às vezes, são confusas e complicadas. Elas mostram as marcas do pincel do pintor, apresentam perspectivas desafiadoras e, ao encontrar a beleza que a arte encarna, o observador muda.
Uma obra de arte é bela exatamente pelo que é. Não é para ser resumida em uma ideia ou interpretada como uma palestra. Sua glória é sua individualidade, sua singularidade. Uma grande obra de arte costuma nos surpreender. É uma realidade transcendente, visível e tangível, uma porta para o mistério de como tudo neste mundo se esforça por uma existência mais elevada e mais bela.
A grande arte é uma expressão de esperança. É a concretização de uma ideia, fazendo uma conexão entre o mundo como ele é e o mundo como deveria ser.
Enfim, os seres humanos são a obra-prima de Deus. Não podemos esperar que outras pessoas ou nós mesmos existamos no reino das ideias perfeitas. Somos muito mais como pinturas - criações físicas que trazem a marca de nosso Criador. As pessoas são inexplicáveis. Muito mais do que uma ideia, somos filhos de Deus, que têm esperança e sonham, e mesmo que estejamos longe da perfeição, Ele nos tornou belos.