Tem chamado as atenções nas redes sociais uma imagem de Nossa Senhora intacta no meio dos escombros provocados por um dos tornados que devastaram dezenas de cidades norte-americanas entre a última sexta, 10, e o sábado, 11 de dezembro. Estados do Meio-Oeste e do Sul do país foram atingidos com brutalidade. O número de mortes se aproxima de uma centena.
No meio da devastação causada à igreja da Ressurreição, uma paróquia católica em Dawson Springs, no Kentucky, é possível encontrar a imagem intacta de Maria, com o Menino Jesus nos braços, em chamativo contraste com o telhado arrancado e as paredes seriamente comprometidas.
Tina Casey, da secretaria de comunicação da diocese de Owensboro, afirmou à imprensa que "provavelmente será declarada a perda total" do imóvel da igreja.
O bispo de Owensboro, dom William Medley, pediu orações e priorização de donativos para as pessoas vitimadas pelo desastre. Ele também agradeceu pelas "demonstração de apoio que recebemos de todo o país e do mundo" e recordou aos fiéis que "o Papa Francisco tem rezado pelo Kentucky e por todos os afetados pelos tornados".
Quanto à imagem intacta de Nossa Senhora, muitos fiéis descreveram o fato como "milagroso", o que costuma ser comum em casos semelhantes.
Mas será mesmo um milagre?
Não. Não se pode falar tecnicamente em milagre quando existem explicações científicas plausíveis para um acontecimento. Neste caso, uma considerável gama de variáveis é capaz de explicar por que um fenômeno natural, apesar de ter potencial catastrófico, pode ter deixado uma imagem de Maria intacta em meio a grandes estragos.
O uso do termo “milagre” é comum diante de fenômenos que parecem sobrenaturais: na grande maioria dos casos, porém, o uso dessa palavra é bem intencionado, mas, como termo técnico, é precipitado e equivocado.
Milagres são fenômenos cientificamente inexplicáveis que contradizem as regras da natureza conforme as conhecemos. Para que algum fenômeno possa ser oficialmente declarado como de caráter sobrenatural por parte da Igreja, são necessários prudentes e detalhados estudos. A Igreja segue critérios científicos bastante rígidos para afirmar algum milagre. Os milagres de cura, por exemplo, chegam a demorar décadas até serem reconhecidos. Os fatos precisam ser cuidadosamente estudados por médicos, revisados por cientistas (na maioria dos casos, laicos e até mesmo ateus), expostos às críticas públicas e, só depois de feitos todos os estudos científicos, a própria Igreja faz a análise teológica mediante o trabalho das suas comissões de especialistas em teologia.
Aliás, você pode conhecer um pouco mais sobre a delicada avaliação de supostos milagres por parte da Igreja no seguinte artigo sobre os 7 critérios para se declararem milagrosas as curas que acontecem no santuário de Lourdes:
Então é um “sinal”?
A imagem de Nossa Senhora intacta após a devastação de um tornado pode ser considerada então um "sinal", se não um milagre?
Entendendo-se por “sinal” aquilo que carrega um “significado”, certamente não há erro em dizer que sim, é um sinal natural – ou seja, um fato raro e chamativo, mais ainda assim “previsto” na ordem natural das coisas. Esse tipo de fato, por mais que seja inusitado ao nosso olhar, significa primariamente a própria existência de uma ordem natural – e isto já é grandiosamente instigante: existe uma ordem natural em vez de mero acaso.
De fato, não é apenas o sobrenatural que pode nos impactar: a natureza mesma, incluindo a nossa capacidade natural de admirar o belo, também tem muito a nos dizer, dado que o fascínio da natureza, em si mesmo, já nos remete a uma das perguntas-chave da filosofia e da ciência: qual é a origem de tudo isso?
Um acontecimento chamativo, mas explicável pela ordem natural das coisas, pode servir como “gatilho” para reflexões importantes.
O cristão acredita que Deus nos fala através de sinais, sejam naturais, sejam sobrenaturais, e que Ele sempre deixa à liberdade de consciência de cada um a decisão final de como interpretá-los. Os próprios ateus, aliás, costumam enfatizar que as tragédias são uma “prova” de que Deus não existe, apelando para a sua “fé” na inexistência de Deus com base em sinais passíveis de interpretações pessoais (que, aliás, cientificamente falando, não são válidos como provas).
Para quem crê na inexistência de Deus, tudo é e será sempre mero acaso e falta de sentido. Para quem acredita em Deus e no sentido sobrenatural da existência, tudo é e será sempre um grande milagre, testemunhado por uma abundância de sinais repletos de sentido.
“Narram os céus a glória de Deus, e o firmamento anuncia a obra de Suas mãos” (Salmo 18, 2).