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Ex-ministra da Finlândia julgada por versículos da Bíblia é absolvida

Ex-ministra da Finlândia, Païvi Räsänen: liberdade de expressão ameaçada

Courtesy of Alliance Defending Freedom

Francisco Vêneto - publicado em 01/04/22

Entidades internacionais acompanharam o caso com preocupação: condenação colocaria em xeque a liberdade de expressão

Päivi Räsänen, ex-ministra da Finlândia, foi ré num esdrúxulo processo judicial em seu país porque publicou… versículos da Bíblia.

Mãe de cinco filhos, médica e parlamentar, ela foi ministra do Interior entre 2011 e 2015 e corria o risco de ser condenada a inacreditáveis 2 anos de prisão ou pagamento de multa.

A acusação

O promotor-geral da Finlândia a denunciou em abril de 2020 por, segundo ele, ter “ofendido os homossexuais” ao citar versículos da Carta de São Paulo aos Romanos. Päivi Räsänen também foi acusada por outras afirmações que divulgou num panfleto de 2004 e num programa de televisão de 2018. Segundo o promotor-geral, ela teria “incitado à violência” contra as pessoas homossexuais.

A deputada é luterana, mas criticou a sua igreja por ter apoiado, em 2019, um evento do assim chamado orgulho LGBT. Ela indagou via rede social, na ocasião, como esse patrocínio seria compatível com a Bíblia e acrescentou uma foto da Bíblia aberta na passagem de Romanos 1, 24-27, onde se lê:

“Por isso, Deus os entregou aos desejos dos seus corações, à imundície, de modo que desonraram entre si os próprios corpos. Trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram à criatura em vez do Criador, que é bendito pelos séculos. Amém! Por isso, Deus os entregou a paixões vergonhosas: as suas mulheres mudaram as relações naturais em relações contra a natureza. Do mesmo modo também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam em desejos uns para com os outros, cometendo homens com homens a torpeza, e recebendo em seus corpos a paga devida ao seu desvario”.

A polícia começou a investigar a ex-ministra já em 2019.

O julgamento

A respeito do julgamento, Päivi Räsänen declarou em 2021:

“Aguardo com a mente tranquila os procedimentos do tribunal, confiante de que a Finlândia respeitará a liberdade de expressão e de religião, consagradas nos direitos fundamentais e nas convenções internacionais. Não recuarei das minhas convicções baseadas na Bíblia e estou preparada para defender a liberdade de expressão e de religião em todos os tribunais necessários. Não posso aceitar que dar voz a crenças religiosas possa acarretar prisão. Defenderei o meu direito de confessar a minha fé, de modo que ninguém mais seja privado do seu direito à liberdade de religião e de manifestação”.

Em 24 de janeiro de 2022, Päivi Räsänen compareceu ao Tribunal Distrital de Helsinque ao lado de Juhana Pohjola, bispa luterana que também enfrentava acusações criminais. O procurador-geral da Finlândia as acusava de “agitação étnica”, o que poderia vir a ser considerado “crime de guerra” ou “contra a humanidade” segundo a interpretação que fosse dada ao código penal do país. Para a promotoria, as declarações de Räsänen “provavelmente causariam intolerância, desprezo e ódio aos homossexuais”. Atenção para o advérbio “provavelmente”, que reforçava o caráter subjetivo da acusação.

As duas rés foram recebidas por apoiadores em sua chegada ao tribunal.

De acordo com a ADF International, um grupo de defesa jurídica da liberdade religiosa, a promotoria finlandesa reafirmou, no começo do julgamento, que as opiniões de Räsänen e Pohjola eram “discriminatórias”. A defesa pediu que o tribunal não impusesse a sua própria interpretação teológica das Escrituras aos 5,5 milhões de cidadãos da Finlândia, criminalizando assim a doutrina cristã tradicional sobre casamento e sexualidade. A defesa sustentou que uma condenação das duas acusadas equivaleria a criminalizar, de fato, a Bíblia.

O Conselho Luterano Internacional descreveu o processo contra Räsänen e Pohjola como “escandaloso”, acrescentando que “a grande maioria dos cristãos em todas as nações, incluindo católicos e ortodoxos orientais, compartilham essas convicções. O Procurador-Geral finlandês condenaria todos nós? Além disso, o estado finlandês deve arriscar sanções governamentais de outros Estados com base no abuso dos direitos humanos fundamentais?”.

O diretor executivo da ADF International, Paul Coleman, também observou que uma condenação colocaria em xeque a liberdade de expressão.

A absolvição

Finalmente, em 30 de março, após três anos de pressão, preocupação e autocensura, Päivi Räsänen e Juhana Pohjola ouviram o veredito: o Tribunal Distrital de Helsinque as absolveu de todas as acusações por unanimidade, reconheceu que não cabe ao Estado interpretar conceitos bíblicos e condenou a promotoria a pagar os mais de 60 mil euros de custas judiciais.

Päivi Räsänen expressou satisfação com a sentença, que, a seu ver, salvaguarda os princípios fundamentais da liberdade de expressão. Ela comentou:

“Se é possível questionar a liberdade de expressão na reputada Finlândia, que está em terceiro lugar nas classificações internacionais de liberdade de expressão, por que não seria possível em qualquer outro país?”.

A ex-ministra também recordou uma frase preocupante do promotor Raija Toiviainen durante a audiência: ele afirmou que a deputada era livre para pensar como quisesse, mas, caso expressasse certas crenças, isto seria crime. Ela comentou com ironia sobre esse despropósito:

“Lembrei-me de uma situação semelhante quando, como Ministra de Assuntos Religiosos, me disseram que a liberdade religiosa também funciona assim na China: você pode pensar livremente lá também”.

E enfatizou:

“Sob a Lei de Liberdade de Religião, todos são livres para expressar as suas crenças em particular e em público. Eu espero que o Ministério Público esteja satisfeito com esta decisão. É claro que estou preparada para defender a liberdade de expressão e de religião em todos os tribunais, inclusive perante o Tribunal Europeu de Direitos Humanos. Mas espero que isso termine aqui”.

Ameaças à liberdade de consciência, crença e expressão na Europa

De fato, é o que se deve esperar e exigir. Entretanto, a Europa vive uma explícita cavalgada rumo à imposição de supostos “direitos humanos” que não existem, como seria o aborto livre, ao mesmo tempo em que também se multiplicam, para espanto mundial, absurdos processos, como este recém-ocorrido contra Räsänen e Pohjola, por exercerem a sua liberdade religiosa, de pensamento e de opinião sem impô-la a ninguém.

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