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Não devemos “adocicar” o problema da crise de fé, diz Papa

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© Vatican Media

Reportagem local - publicado em 03/04/22

"Às vezes o suporte exterior pode ser religioso, mas por trás desses andaimes a fé vai envelhecendo"

“A crise da fé, a apatia da prática religiosa sobretudo no pós-pandemia e a indiferença de muitos jovens relativamente à presença de Deus não são questões que devemos «adocicar» pensando que, apesar de tudo, ainda subsiste um certo espírito religioso.”

Isso foi o que o Papa Francisco afirmou neste sábado em Malta, durante o Encontro de Oração no Santuário Nacional de “Ta’ Pinu”, em Gozo.

Na realidade, às vezes o suporte exterior pode ser religioso, mas por trás desses andaimes a fé vai envelhecendo. Nem sempre a elegante amostra de vestes religiosas corresponde a uma fé viva animada pelo dinamismo da evangelização. É preciso vigiar para que as práticas religiosas não se reduzam à repetição dum repertório do passado, mas expressem uma fé viva, aberta, que difunda a alegria do Evangelho, porque a alegria da Igreja é evangelizar.

Em seguida, o Papa afirmou que este é “o momento de voltar àquele começo, ao pé da cruz, olhando para a primeira comunidade Cristã”.

Para ser uma Igreja que tem a peito a amizade com Jesus e o anúncio do seu Evangelho, e não a busca de espaço e atenções; uma Igreja que tem, no centro, o testemunho, e não qualquer costume religioso; uma Igreja que deseja ir ao encontro de todos com a lâmpada do Evangelho acesa, e não formar um círculo fechado. Não tenhais medo de empreender – como já fazeis – percursos novos de evangelização e anúncio, talvez até arriscados mas que tocam a vida, porque a alegria da Igreja é evangelizar.

Desenvolver a arte do acolhimento

Segundo o Papa, na Igreja é fundamental o amor entre os irmãos e o acolhimento ao próximo.

Voltemos o olhar mais uma vez para as origens, para Maria e João junto da cruz. Nos primórdios da Igreja, temos o seu gesto de mútua entrega. Com efeito, o Senhor confia cada um deles aos cuidados do outro: João a Maria e Maria a João, de tal modo que, «desde aquela hora, o discípulo acolheu-A como sua» (Jo 19, 27). Voltar ao início significa também desenvolver a arte do acolhimento. Dentre as últimas palavras de Jesus na cruz, as palavras dirigidas à Mãe e a João incitam a fazer do acolhimento o estilo perene do discipulado. Realmente não se tratou dum simples gesto de compaixão – Jesus teria confiado a sua Mãe a João, para que Ela não ficasse sozinha depois da morte d’Ele – mas duma indicação concreta do modo como viver o mandamento supremo: o do amor. O culto a Deus passa pela proximidade ao irmão.

Quão importante é na Igreja o amor entre os irmãos e o acolhimento do próximo! No-lo recorda o Senhor na hora da cruz, na mútua aceitação de Maria e João, exortando a comunidade cristã de todos os tempos a não perder esta prioridade. «Eis o teu filho (…) eis a tua mãe» (Jo 19, 26.27) é como se dissesse: fostes salvos pelo mesmo sangue, sois uma única família; então acolhei-vos mutuamente, amai-vos uns aos outros, curai as feridas uns dos outros. Sem suspeitas, sem divisões, calúnias, murmurações nem desconfianças. Irmãos e irmãs, fazei «sínodo», isto é, «caminhai juntos». Porque Deus está presente onde reina o amor!

Desafio permanente

Nesse sentido, o Papa disse que “o mútuo acolhimento, não como pura formalidade, mas em nome de Cristo, é um desafio permanente”.

É-o antes de mais nada para as nossas relações eclesiais, porque a nossa missão produz fruto se trabalharmos na amizade e na comunhão fraterna. Sois duas lindas comunidades – Malta e Gozo, ou Gozo e Malta? Não sei qual das duas seja a mais importante, seja a primeira! –, tal como dois eram Maria e João! Então que as palavras de Jesus na cruz sejam a vossa estrela polar, para vos acolherdes mutuamente, criardes familiaridade, trabalhardes em comunhão! E continuando sempre na evangelização, porque a alegria da Igreja é evangelizar.

Mas o acolhimento é também o teste decisivo para verificar quão efetivamente esteja permeada a Igreja pelo espírito do Evangelho. Maria e João acolhem-se não no refúgio ameno do Cenáculo, mas junto da cruz, naquele lugar tenebroso onde se era condenado e crucificado como criminoso. Também nós não podemos acolher-nos apenas entre nós à sombra das nossas belas igrejas, enquanto fora muitos irmãos e irmãs sofrem e são crucificados pelo sofrimento, a miséria, a pobreza e a violência. Encontrais-vos numa posição geográfica crucial, que abre para o Mediterrâneo como polo de atração e cais de salvação para muitas pessoas em balia das tempestades da vida, que, por diferentes motivos, chegam às vossas costas. No rosto destes pobres, é o próprio Cristo que Se apresenta a vós. Esta foi a experiência do Apóstolo Paulo que, depois dum terrível naufrágio, foi calorosamente acolhido pelos vossos antepassados. Afirmam os Atos dos Apóstolos: «Os nativos (…) acenderam uma grande fogueira, junto à qual nos recolheram a todos, por causa da chuva que estava a cair e por causa do frio» (28, 2).

Ser peritos em humanidade

De fato, o Papa destacou “o Evangelho que somos chamados a viver”:

Acolher, ser peritos em humanidade, acender fogueiras de ternura quando o frio da vida paira sobre aqueles que sofrem. Então, duma experiência dramática, nasceu algo importante, porque Paulo anunciou e difundiu o Evangelho e, em seguida, muitos arautos, pregadores, sacerdotes e missionários seguiram os seus passos, impelidos pelo Espírito Santo, para evangelizar, para fazer continuar a alegria da Igreja que é evangelizar. Quero dizer um obrigado especial a estes evangelizadores: aos numerosos missionários malteses que espalham a alegria do Evangelho por todo o mundo, aos inúmeros sacerdotes, às religiosas e aos religiosos e a todos vós. Como disse o vosso bispo D. Teuma, sois uma ilha pequena mas de coração grande. Sois um tesouro na Igreja e para a Igreja. Repito: sois um tesouro na Igreja e para a Igreja. Para o guardar, é preciso voltar à essência do cristianismo: ao amor de Deus, motor da nossa alegria, que nos faz sair e percorrer as estradas do mundo; e ao acolhimento do próximo, que é o nosso mais simples e belo testemunho no mundo, e assim continuar a percorrer as estradas do mundo, porque a alegria da Igreja é evangelizar.

(Íntegra do discurso do Papa)

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